domingo, 25 de abril de 2010

Passeio Pelos Impérios IV - DESCER À CISTERNA PORTUGUESA


De manhã, estava fresco e o vento mantinha-se forte. Na dúvida, que se veio a revelar certeza, optámos por seguir de moto até à antiga fortaleza portuguesa de Mazagão. O caminho pedestre era capaz de ter sido agradável, mas levaríamos seguramente mais de uma hora a ir e vir. Entre idas e vindas aos ATM's conseguimo-nos dispersar o suficiente para criarmos alguma dinâmica na manhã que nos iria colocar em contacto com alguns vestígios do Portugal quinhentista além-fronteiras.
A uma noite de estória, seguiu-se uma manhã histórica, quando entrámos na medina fortificada de El Jadida, a antiga Mazagão dos tempos da ocupação portuguesa. Após franquearmos a “porta”, deparámos com a igreja da Assunção que rasga a arquitectura dominante do exterior, assim como outros edifícios, caso do hospital espanhol e de muito do casario. Mas estão mal cuidados, quase desprezados. Vêem-se obras, no entanto
Mais à frente, encontra-se a entrada para a cisterna portuguesa. Na antecâmara, o espaço parece estar em fase de reordenamento, vedado que estava a maior parte do salão. Em um dos blocos de pedra epigrafados em português medieval, identifica-se um “capitão” e um “governador”. Está no chão, iluminado por holofotes, mas a leitura tem de ser feita de cócoras. Faz pena.
Em baixo, porém, a arquitectura surpreende. É uma grande sala corcovada com diversos arcos que ligam dezenas de colunas, distribuídas em redor de uma abertura circular central, por onde entra luz natural. Tentei chegar ao telhado pelo exterior, mas estava inacessível. Os efeitos de luz e sombra são fantásticos. Talvez por isso, o espaço tenha perdurado e esteja em relativo bom estado.
No chão, parece manter-se uma quantidade de água suficiente para permitir apenas circundar a cisterna junto das paredes. A água está parada, facto que possibilita um admirável efeito visual de espelho, aproveitado pelo cineasta Orson Welles, em parte do filme Othello. Admirável.
Voltámos a ouvir muitas expressões portuguesas, não muito diferentes das que reconhecemos há 3 anos em outros lugares: “Cascais”, batata frita”, “casa portuguesa”, "barato", “portugueses”, e os nomes dos jogadores de futebol mais famosos. Confirmamos também estar mais correcto o português falado do que o escrito, sobretudo na placa recente indicativa de uma colectividade de cariz cultural da "cité portugaise" ...
Percebemos que os vestígios estão lá, mas nota-se uma imensa falta de informação / apoio acerca deles. Ao contrário do que é fácil assegurar quando se trata de guardar as motos ou visitar uma medina mais recôndita ou labiríntica, ocasião em que aparecem milhentos guias, não há um único disponível para este contexto da herança portuguesa. Aqui, ou em qualquer dos locais onde existem vestígios da nossa presença medieval. Domage!
Saímos de Jadida, a “nova” (cidade), pelo caminho costeiro, rumo a Oualidia, onde almoçaríamos. Estavam previstas ostras e paella. Com o reforço da dose das primeiras, a refeição arrasou. A refeição decorreu próximo de uma espécie de lago onde se misturavam as águas de um rio e as do mar, local de férias de infância dos nossos companheiros de viagem e co-organizadores, José Menau e Nênê. Gostoso.
A digestão, fizemo-la ao longo de um Atlântico bravio que, naquela zona, não convida a banhos. Mas a estrada melhorou, acompanhada agora de uma paisagem estimulante, com campinas viçosas para o interior e um mar de azul esverdeado à beira das falésias. A temperatura favorável parecia cúmplice do cenário. Admirável.
Música: 7BZH, 74

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