segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

O Livro de Cale


A História desperta curiosidade e estimula a vontade de conhecer o passado. Edifício de acontecimentos antigos confia-nos, grosso modo, o pretérito do factual notório. Porém, vela-se em detalhes e dissimula atributos. Elide aspirações, acções enérgicas de resultados ténues, pretensões de destino obscuro. Confessa alguns segredos, mas apodera-se de mistérios que nunca revela. A História subsiste.
As estórias, por seu lado, encantam-nos o interesse. Confidenciam afectos, sussurram paixões e revelam fraternidades. Abrem trilhos para enigmas, confessam segredos e descobrem mistérios. Exploram ódios, descobrem ganâncias, denunciam ignomínias. Nutrem fantasias e embalam sonhos. As estórias criam-se.

SINOPSE

O Livro de Cale encerra uma História e uma estória. Uma História de Portugal, dos protagonistas, dos ambientes, dos lugares, de episódios marcantes. Uma estória que inventa o percurso de Bernardo Mendes, filho de Nuno Mendes, o último conde portucalense.
“As primeiras referências históricas conhecidas da existência de um Condado Portucalense aparecem ainda em finais do século IX. Todavia, as menções sobre o lugar cuja denominação daria origem ao condado, datam de há cerca de dois mil anos. Com efeito, ainda durante o primeiro século antes da era cristã, o historiador romano Salústio menciona a existência de uma "civitas" identificada como Cale.”
Engendrar Bernardo Mendes não é criar uma personagem. É (muito) mais do que isso. É forjar um ambiente onde vão coexistir soberbas, traições, vilanias, pressões e cobiças, mas também solidariedades, amizades, alianças, amores, abnegações. Marcante é a ambição desmedida de um galego, Mendes Pais, abade de Santo Alberico.
“A estória abre com o prenúncio de um arreganho vicinal aos propósitos portucalenses, procedente de um clérigo beneditino galego, cuja prática política antagoniza a doutrina da Ordem e fere de morte qualquer obstáculo que assome no trajecto da sua ganância de poder.”
O Livro da Cale é, também, um livro. Um livro que contém um repositório da genealogia de insignes portucalenses: Bragançãos, Ribadouros, Sousãos, Maias, Baiãos, aqui também protagonistas da gesta de Bernardo Mendes. São eles que decidem, que provocam, que reagem, que se aliam.
“Contrastante, porém, o aspecto andrajoso do povo - de túnicas grosseiras atadas na cintura com cordões, chapéus de palha e sandálias de correias - com a opulência de certos mercadores e, sobretudo, com a vistosa aparência dos infanções portucalenses - das suas camisas e coletes bordados, pelotes enfeitados com galões e tabardos debruados - à frente dos quais se abriam alas de pedintes e enjeitados”

O Livro de Cale conta a vida de Bernardo Mendes, um rapaz volúvel mas arrojado, um jovem imprudente mas determinado, porém capaz de se transformar num adulto sapiente, empenhado e aguerrido.
“Ágil, virou-se e contra-atacou. Já com outro adversário a seu lado, Bernardo rodopiou e acertou-lhe com o punho da espada. Tentou insistir, mas foi impelido com violência contra uma porta estreita que levava à sala de armas.”
O Livro de Cale está na posse de um infame abade. Bernardo seguir-lhe o rasto até ao mosteiro rival e recuperá-lo-á. No entanto, terá de contar com o apoio de cavaleiros francos, monges-guerreiros, infanções portucalenses, e até de Afonso VI.
“ O segundo, um grupo de vigorosos monges francos, vestidos com rudes hábitos negros sob cotas de malha enegrecidas, desejava fervorosamente punir os réus do morticínio. As hostes do imperador de Espanha e a cavalaria de Cluny juntavam esforços denodados para eliminar os biltres agressores e recuperar o mosteiro.”

O Livro de Cale é também uma colecção de lugares que vão desde as falésias do Douro até ao planalto bragançano, dos terrenos leoneses aos penhascos galegos. Vai de Vallado a Santo Alberico, da raia portucalense ao coração da Galiza. Mas é sobretudo o Douro que testemunha as atrocidades do galego e a resistência dos portucalenses, os atentados mouros e as réplicas dos infanções, as perfídias do abade e o amor entre Bernardo e Mafalda.
“ Do alto, o Douro parecia uma cobra negra, a serpentear entre penhascos. O olhar ondulou-se-lhe pelas silhuetas calvas das serranias, à procura de um de um sinal. Ao longe, apenas frágeis pontos de luz faziam adivinhar vivalma, confundindo os cenários terrenos com o universo celeste.”
No Livro de Cale assomam árabes, galegos, leoneses, francos, portucalenses, berberes. Cruzam-se nobres, validos, monges, infanções, abades, copistas, alferes, governadores, homens de armas, um imperador. Bernardo, de origem nobre, será copista, mestre de armas, emissário.
“Bernardo aprimorava o seu desempenho na função de copista, sendo requisitado frequentemente para trabalhos de cariz mais exigente. No entanto, foi o domínio da interpretação de textos que lhe granjeou notoriedade. Em pouco tempo, passou a fazer parte dos eleitos do grupo de leitura e de reflexão doutrinária.”
É o Livro de Cale que induz, que atrai, que nomeia. É fio condutor de um trajecto que a todos envolve, a quem ninguém é indiferente, do qual ninguém sai ileso. É uma folha gasta que o revela, uma traição que o envolve, uma cilada que o mostra. E é sobre Bernardo que recai a mais perigosa das ameaças.
“— Ficareis a saber tudo aquilo de que necessitais para dar cabo dos energúmenos — assegurou, azedo, o soldado. — Confiai em mim e nos que levo. Desta vez, não falharemos!
— Tenho como alvo importante um dos moços — alertou o primeiro. — É forçoso estar alerta! Consta que tem a língua afiada e a espada pronta. Não o descureis…
— Irei vigiá-lo. A seu tempo, tratarei de o livrar de preocupações — ironizou o outro.”
Com base na genealogia condal e dos infanções portucalenses, o Livro de Cale mostra também a importância das relações de parentesco entre as classes dominantes, de um lado e do outro do rio Minho, mas sobretudo no espaço portucalense.
“— Soeiro — exclamou o de Baião —, tendes o vosso nome neste manuscrito! O de Gonçalo também aqui consta — volveu, surpreso, para o irmão.
Atento, o Maia rapou do escrito que Bernardo lhe tinha dado antes de partir e leu-o sub-repticiamente, acrescentando depois:
— Confirmai também os de Mumadona Dias e de Elvira Mendes — disse, esboçando um sorriso matreiro.”

APRESENTAÇÃO

O convite convocava para uma quinta-feira, às 18 horas. Aconteceu em Lisboa, na loja FNAC, do centro comercial Colombo.
Eu não gosto de falar em público, embora escreva sobre o que faço publicamente. Falar sobre causa própria não é mesmo do meu agrado. Felizmente, o editor d' O Livro de Cale, Francisco Lyon de Castro adiantou pistas sobre o conteúdo do livro e eu limitei-me a tecer alguns comentários particularmente sobre a sua génese.
Estiveram presentes amigos, colegas de trabalho, família, staff da Europa-América. Alguns ainda couberam nas imagens seguintes.



O QUE SE DIZ SOBRE O LIVRO DE CALE


No "Segredo dos Livros"...
O Livro de Cale situa-se no século XI, uma época de crucial importância para a formação da futura nacionalidade portuguesa. A reconquista da península está em curso e os muçulmanos foram rechaçados para sul do rio Tejo. Mas as investidas dos infiéis são frequentes e, infelizmente, têm o apoio de quem os devia combater. Mendes Pais, abade de Santo Alberico, procura, por todos os meios, tornar-se senhor de todo o território da Galiza e Portucale, não hesitando em utilizar todos os estratagemas. Para tal, faz desaparecer Nuno Mendes, legítimo conde de Portucale e prepara-se para fazer o mesmo a todos os seus herdeiros. Mas, para fazer vingar os seus direitos perante o rei de Leão e Castela, Afonso VI, necessita de dar um “jeitinho” à história da família Mendes, através da deturpação do manuscrito que contém as linhagens das famílias nobres de Cale.
É um livro bem escrito, com uma trama bem enquadrada nos acontecimentos históricos da época e versa uma fase da nossa história ainda pouco explorada. Nota-se que é o primeiro romance do autor, porque não tem o traquejo de um Dan Brown, de um Ken Follett ou de um Umberto Eco. Mas é uma obra bem construída, com princípio, meio e fim. Só o final podia ser um pouco mais emotivo; pareceu-me um pouco arrastado e previsível.

Dou os parabéns ao autor e incentivo-o para que continue a escrever romances que nos ajudem a conhecer melhor o nosso passado.
In, http://www.segredodoslivros.com/sugestoes-de-leitura/o-livro-de-cale.html

Nas 'Leituras do Corvo'...
“Um documento que contém os nomes e linhagens de todos os notáveis do condado portucalense. Um plano para alcançar o poder, independentemente das vidas que tenham de ser sacrificadas. E, no centro de toda esta intriga, Bernardo Mendes, que, obrigado a retirar-se para um mosteiro de modo a ser afastado dos interesses de Mendes Pais, acabará por se tornar na figura mais importante de todo o conflito.
É a componente descritiva o elemento dominante neste livro. Não só na caracterização do cenário e da vida quotidiana no mosteiro, mas também no detalhe com que as batalhas são apresentadas e até nas teias que ligam os diferentes elos da conspiração, o autor apresenta, com bastante atenção ao pormenor os elementos que caracterizam cada situação. Isto resulta numa visão bastante completa quer do cenário global quer dos pequenos detalhes.”

Mais detalhes da crítica em

Em 'NLivros'
"Carlos Cordeiro tenta reconstruir os primórdios de Portugal e os acontecimentos que, em certa altura, estiveram por detrás da fundação da nação. A família Mendes é uma das famílias notáveis de Portucale, condado pertencente a Castela e motivo de preocupação por parte do soberano castelhano, Afonso VI, devido às constante incursões mouras.
Nuno Mendes havia sido o último conde de Portucale. Morto em 1071 na batalha de Pedroso, acaba com Nuno Mendes a tentativa de conseguir mais autonomia junto a Castela e começa ai também toda uma movimentação de várias famílias notáveis de Portucale e Galiza onde interesses opostos davam a estes dois condados uma situação de instabilidade.
Bernardo Mendes, filho de Nuno Mendes, envolve-se com a filha do poderoso Mendes Pais, abade de Santo Alberico, que aproveita o facto para acusar Bernardo de violação e obrigar a família Mendes a encerrá-lo no Mosteiro de Vallado. É aí nesse mosteiro que Bernardo, enquanto copista, toma conhecimento de um documento que coloca em causa o futuro do condado, mediante uma intriga tendo em vista a tomada do mesmo.
Embora tenha apreciado o trabalho de reconstrução histórica, este romance não me preencheu as medidas. O autor pega numa premissa válida: um documento secreto. E desenvolve todo um trama que, bem esprimido, não dá em quase nada ou, se quisermos, podia ter sido melhor aproveitado."
Mais detalhes da crítica em

O LIVRO DE CALE NA ANTENA 1

Entrevista na Antena 1, 2ª feira, 13, 11:30 no Estúdio 16. O programa é o À Volta dos Livros, de Ana Aranha, que costuma ir para o ar três vezes por dia. Foi uma conversa rápida, de 5 minutos à volta de O Livro de Cale, reproduzida aqui
http://ww1.rtp.pt/multimedia/area.php?page=podcasts
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Depois, escolher o programa e ir para
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2010-12-15 Uma viagem à Idade Média:foi este o desafio que Carlos Cordeiro fez a si próprio ao escrever o seu primeiro romance histórico...o autor está hoje com Ana Aranha no «À Volta dos Livros». Uma viagem à Idade Média:foi este o desafio que Carlos Cordeiro fez a si próprio ao escrever o seu primeiro romance histórico...o autor está hoje com Ana Aranha no «À Volta dos Livros».1123047_79154-1012152327.mp3

INSPIRAÇÕES...

Na adolescência as obras de Waltert Scott, com "Ivanhoe", e Washington Irwing, com "Contos do Alhambra", já haviam deixado semente.
No culminar dos estudos liceais, a História tomou o lugar da Matemática e reforçou o viveiro dos romances históricos. Depois foi a descoberta de lugares portugueses e estrangeiros na Europa, muitos deles históricos. De moto, sobretudo em Portugal, Espanha, França, Itália e Suíça, percorri alguns circuitos culturais, pré-históricoas e medievais, por necrópoles, igrejas, mosteiros, castelos. Viagens e sítios levam ao Viajar de Moto, Destino Europa, escrito em co-autoria.
Uma revisão de provas no exame de acesso à faculdade foi mãe de um maior apego às crónicas históricas. Depois, sobreveio uma paixão antiga das estórias da História. Empolgaram-me os épicos clássicos portugueses, alguns relidos. Alexandre Herculano passa a ser um autor estimulante e, Eurico, O Presbítero, o livro inspirador. Os Arco de Santana, O Bispo Negro, A Morte do Lidador, juntam-se às “História de Portugal” de Oliveira Marques, Oliveira Martins, José Mattoso.
Associo-lhes leituras de clássicos da Antropologia sobre parentesco, política, religião e etnografia. Leio sobre sobre grupos sociais, transmissão dos direitos de linhagem e a sua influência na dinâmica das relações sociais, nomeadamente na época medieval.
Invento personagens, adapto locais, imagino cenários. Muitos identificam-se facilmente atendendo às fontes históricas, outros percebem-se acudindo à ficção histórica, outros ainda nem vislumbro como surgem. Vou escrevendo ao sabor da inspiração em lugares suspeitos, sobretudo em suportes papel. Eis alguns... de onde emerge O Livro de Cale.



... E APOIOS 


Fantasias, ajustes, referências, ou qualquer elemento de invenção não fariam sentido sem uma leitura atenta, crítica, dedicada, relacional, científica. Ter socorro nesses aspectos é um luxo. Ter a Maria Afonso como assistente editorial a fazê-lo é um privilégio.

http://www.aminhalindalavandaria.blogspot.com/



1 comentário:

Maria Afonso disse...

Votos de muito êxito na carreira e espero pela sequela.