quarta-feira, 27 de setembro de 2023

Parque da Paz




Natureza e lazer em 50 hectares. Caminhos e espaços amplos por entre vegetação abundante, fauna e flora variadas, e, ainda uma área didáctica sobre biodiversidade. Charcas e lagos completam o espaço do maior parque urbano de Almada. Estamos no Parque da Paz, implantado “em frente da porta” de Almada.

Tranquilidade e bom ar. O parque, considerado o “pulmão” da cidade - à imagem de Monsanto face a Lisboa - respira natureza e expira serenidade, mesmo contando com algumas lagartixas, coelhos ou melros e ainda outros não identificáveis que, de vez em quando, aparecem de repente, sem contar porém, a extensa comunidade de patos-reais.

Árvores, arbustos e plantas herbáceas são centenas de espécies diferentes, contando com árvores habituais em Portugal, abetos, pinheiros, azinheiras, sobreiros ou oliveiras. Fungos e líquenes crescem em alguns recantos na relva ou nos troncos. E, ainda há espaço, muito espaço, quer nos caminhos, quer nas clareiras.

Cheira bem, a campo, está sol mas o ambiente fresco. Talvez da moldura arbórea, das alamedas de árvores, talvez do deslizar da água que vai para o lago. A contrastar, a textura e a cor das pedras, ora granitos, ora xistos, ora ambos em configurações geométricas. Alguns locais, bem situados, estão dedicados, à contemplação, ao descanso, à observação, ao lazer.

Projetado pelo arquiteto paisagista Sidónio Pardal, o parque é amplo, extenso, tranquilo, limpo,  um espaço verde muito agradável, especialmente dedicado ao lazer e ao contacto com a natureza. Só querendo, se descobrem prédios ou estruturas viárias que, mesmo assim, estão afastadas, constituindo-se como um refúgio tranquilo perto da agitação urbana.

Está por ali há quase duas décadas e mal se dá por ele. O plano inicial é de 1975, quandp a autarquia reservou o espaço. O enquadramento paisagístico é de 1979 e o início das obras de 1995. Hoje, são cerca de 7 kms de caminhos, entre flora exuberante e uma fauna de bichinhos simpáticos.





quinta-feira, 21 de setembro de 2023

Passadiço das Escarpas, De Maceira a Porto Novo

 

Estamos na zona Oeste, no fim de Maceira. Deixamos o carro no estacionamento e confirmamos que estamos no Passadiço das Escarpas, que leva de Maceira a Porto Novo. É um troço novo que liga a localidade à praia de Porto Novo ao longo de uma pequena zona florestal e da planície aluvial.

Vamos acompanhar o percurso do rio Alcabrichel, até à respectiva foz, junto ao Hotel Golf Mar, na praia de Porto Novo. Um primeiro troço com subida ligeira e várias entradas, sempre entre arvoredo, depois uma descida também ligeira, para terminarmos a restante metade em terreno plano.

Viramos para a praia, praticamente à vista de Santa Rita. Não é mais do que um quilómetro, entre verdes, ao longo do vale do Alcabrichel. Num instante, através de um percurso tranquilo, estamos na baía da praia de Porto Novo.

Já lá vão dois séculos, desde que a praia foi palco do desembarque do exército britâncio, quando da primeira invasão napoleónica em 1807. Vimeiro, não fica longe, local onde as tropas enfrentaram o exército francês.

Ali perto, na praia da Vigiada, sem nada que a ligue (?) à Virgem dos Rochedos, um enorme rochedo alberga uma imagem da Virgem Maria. Mais abaixo, outra escultura de alguém com um manto, tem à sua frente o que parece um altar.

O mar está calmo, a areia dourada, o céu limpo. Há pouca gente nas imediações e ainda menos a vadiar na praia. É a pandemia ainda a pairar. Um barco de pesca está preste a entrar na água. Não há cafés abertos, É hora  de regressar.

Voltamos acompanhar a margem direita do Alcabrichel. Já não estamos sozinhos. Pouco mais de 500 metros e temos de trepar. Subimos uma escarpa, primeiro abrupta, depois suave. Paramos para ganhar fôlego, e damos com umas imagens arbóreas fantasmagóricas.

È o único troço “fora de estrada”, em terreno íngreme e irregular. No topo, estamos com mais de 3 quilómetros nas pernas. Porém, só este, o último a trepar, é valente. Passear, mexer pernas, excitar olhares, inspirar o espírito, surpreender novos cenários. No lusco-fusco do Convid. Done!


sexta-feira, 15 de setembro de 2023

Forte Velho do Outão



Toda a gente conhece o Forte Velho do Outão. Ou já lhe vislumbrou a silhueta degradada. Mas, ainda assim, é um conjunto edificado que se salienta e articula na paisagem da serra da Arrábida com algum sucesso. É o panorama que de lá se vê que lhe gaba o sítio.

Está ali desde os últimos anos da década de 40, constituindo-se como parte das baterias fixas dedicadas à defesa costeira, colocadas ao longo das margens do Sado e da península de Setúbal. Esta foi designada como 7ª Bateria do Outão.

Além dos edifícios destinados ao posto de comando, a bateria dispunha de 36 peças, abrigos subterrâneos, vários corredores e túneis de ligação e armazéns de projectéis. Hoje só 2 peças de grande calibre e as respectivas armaduras estão visíveis.

Com as peças obsoletas há várias décadas, a actividade militar cessou ao findar o século XX. As instalações foram-se degradando e hoje todo o conjunto não passa de uma ruína, que o tempo e a mão humana vai inexoravelmente agravando.

No edificio do comando, do qual restam apenas as paredes, estas têm sido alvo de tags, desenhos e pinturas, que emprestam algum colorido ao interior. Em redor do edifício, uma espécie de longo balcão acompanha a área voltada ao mar.   

Todavia, mesmo considerando o elevado estado de degradação das instalações, é sobretudo a posição estratégica e a situação paisagística que surpreendem, colocando-se ao nível do Convento da Arrábida, chegando a ser deslumbrantes alguns dos panoramas dali observados.

Dali é possível vislumbrar a costa alentejana quase até Sines em dias claros, dominar a foz do Sado, ver Tróia como numa maqueta, quaase tocar no Forte de Santiago do Outão, reconhecer os meandros da zona costeira próxima com Setúbal ali à mão, Em baixo, junto ao mar é facilmente reconhecível o forte de Santiago.

A paisagem é admirável. Em dias, como foi o caso, em que o assoreamento do Sado mais se nota, é possível ver pequenas ilhas de areia que se formam perto da foz. Apesar da temperatura da água por ali, ser habitualmente fresca, as ilhas convidam muita gente para aquela areia alva e fina. 

Se já o passeio pela Arrábida possibilita excelentes panoramas, quer sobre o mar quer sobre a serra aqui, deste local, a vista deslumbra-se especialmente com a dimensão da abrangência. É um sítio simpático para mostrar a amigos.  




domingo, 10 de setembro de 2023

NPR Barracuda



Ao longe, de lado, parece forte, grande e comprido. Mais perto, parece encolher-se. A blindagem lembra chapa com rebites e, estando no convés, parece mais curto. Mas, quando lhe trepamos para cima, percorrido de proa a popa, rodeada a torre, pisando-lhe a blindagem, não deixa de impressionar. O Barracuda, que já foi o mais antigo submarino das marinhas da NATO em operação, é um veterano dos mares.

Foram 42 anos ao serviço da Marinha Portuguesa, de 1968 a 2013, nos quais deu cerca de 36 voltas ao mundo, qualquer coisa como 800 mil milhas náuticas, ao longo de mais de 300 missões, levando habitualmente uma guarnição de cerca de 56 militares, submarinistas mais propriamente, possuindo todavia apenas 45 camas, sendo fixas apenas a do comandante e a do enfermeiro. 

Mais números impressionantes: 4 motores, 2 de combustão e 2 eléctricos; falta-lhe uma centena para os 3 mil cavalos de potência; 12 mil litros de água potável, mas banho só no dia anterior à chegada ao porto e apenas para o comandante e escalados de serviço; autonomia de cerca de um mês até 300m de profundidade. Saiu de serviço em 2010.

Olhando para a escotilha da ré, parece a do condutor de um carro de combate M47. Mas afunda mais, muito mais, pelo que o corrimão é bem-vindo. Com um pé no deque interior e olhando à volta, junta-se uma ligeira sensação de "aperto". As “paredes” laterais são arredondadas, parecendo o espaço ainda mais reduzido.



Aos poucos, vamos percebendo algumas das soluções para minimizar essa falta de espaço, que passam por mesas e bancos amovíveis e arrumáveis aos cantos, e por equipamentos e objectos com dimensões minúsculas. São os mínimos para garantir algumas condições de habitabilidade, poucas todavia, experienciando o espaço destinado à passagem dos militares.

Nesta matéria, para além do respeito e admiração pelas pessoas que alí prestaram serviço militar, é clara e directa a percepção das condições escassas e arriscadas de operação neste ambiente, sendo de valorizar o empenho e dedicação dos submarinistas às suas missões. Se, no interior de um carro de combate, já se pode experimentar a pequenez do espaço, dentro do Barracuda ninguém quer ser alto. 

A área técnica ocupa as partes laterais do submarino, sendo o meio o centro nevrálgico, que engloba o posto de comando, local onde as decisões são tomadas. À frente, na proa, a área destinada ao disparo de tropedos é portentosa, fascinante sobretudo na capacidade - múltiplos tubos de disparo - e,  no visual, a lembrar as tubagens gigantescas do Museu de Electricidade…  

O Barracuda ficará, por enquanto, no pólo museológico da Marinha Portuguesa, na Doca de Cacilhas, muito perto do terminal de ferries. Como vizinha, tem a Fragata D. Fernando II e Glória - ver https://cordeirus.blogspot.com/2012/12/d-fernando-e-gloria.html - outro navio muito interessante, igualmente visitável e em muito boas condições de manutenção.




segunda-feira, 4 de setembro de 2023

Pueblos de Burgos e Segóvia, de moto

 


Toda a gente conhece ou já ouviu falar em Castilla e em Leon, até mesmo em Castilla-Leon, ou ainda em Castela e Leão. Trata-se da maior provínia espanhola, cuja capital é Valladolid. Vamos andar por aqui. Depois da passagem por Zamora, o périplo contemplará sobretudo os pueblos de Burgos e Segóvia.

De um lado, povoados, paisagens, estradas, curvas, subidas e descidas, planícies, montes, desfiladeiros. Do outro, encontros, conversas, sensações, brincadeiras, memórias. De outro, ainda, novidades, semelhanças, deslumbres, descobertas, incidentes e soluções. Tudo junto, viagem!

Já foi em Novembro de 21, quando por cá parecia Setembro e, por lá, roçava o Janeiro. Ainda embrulhados pelos condicionamentos da pandemia de Covid. Porém, com ganas de voltar à estrada. Saímos já com tempo fresco mas seco. Regressámos com muita chuva. Lá, andámos com muito frio e nem um pingo dela. Afinal, por lá, aquilo é muito “Pinguinero”.

A proposta era clara: percorrer dois circuitos, através dos pueblos de Burgos e Segóvia. E sedutora: ir às aldeias, percorrer nacionais e concelhias, estendermo-nos na meseta, treparmos escarpas, esgueirar-nos em desfiladeiros, visitarmos grutas, castelos, abadias e ermidas, sítios medievais. Divertirmo-nos!


Até ZAMORA


Saímos da toca e parámos em Aveiras para o primeiro encontro, Além das duas rodas da moto, vamos subir com mais quatro rodas até Valladolid. Ali, as quatro passarão a duas. Por enquanto, somos três alminhas e vamos ficar a meio caminho, na "casa da terra". No dia seguinte, saimos para Espanha. Entramos no estrangeiro, hi, hi.

Até lá, porém, ainda faríamos o IP2 e o IC5 em Portugal. Se o primeiro não está mau, é agradável e tem pouco trânsito, o segundo ganha-lhe vantagem, em piso, desenho e paisagem. Quando aparece Miranda do Douro, já estamos com saudades de repetir aquele trajecto. Percorram-no, que não se arrependem.

Em Espanha, tudo muda: o ambiente (deixa de haver Douro), o relevo (o planalto fica plano...), o piso (surgem vários pisos, de bera a bom), a estrada (vários tipos, com rectas imensas e curvas sucessivas), a cor do ambiente (o verde dá lugar ao amarelo), reforçam as saudades dos cenários transmontanos. Continuamos, é uma ligação, chamemos-lhe assim, para Zamora. Estamos em Castela e Leão.

Andámos por aqui em 87. Nessa altura, havia feira, um céu manhoso, raros lugares de estacionamento, nem ângulo para fotografar a fachada da catedral. Estava muita gente na rua e não possuíamos mapa , nem GPS evidentemente. Desta vez, porém, havia lugares para estacionar, sol q.b., um restaurante catita e um centro histórico bem recuperado.

Antes, almoçamos na Meson de la Vega, barato e bom. Entramos na zona muralhada pelo Portillo de la Lealtad e trepámos ao “casco antiguo”. Desta vez, seria apenas este espaço que visitaríamos. Zamora é uma cidade rica também na diversidade de sítios atractivos: Plaza Mayor, catedral, palácios, ruas medievais, edifícios em pedra clara, miradouros sobre o Douro, etc, onde não falta sequer uma estátua de Viriato numa praça homónima.

Privilegiámos o castelo, com muralha inexpugnável, muito bem recuperada, e um fosso profundo que lhe garantia segurança. Construído no século XII, serviu ainda de fortaleza contra as investidas árabes. Do adarve da segunda linha de muralhas avista-se o largo leito do Douro e, no jardim fronteiro, é possível observar um conjunto de esculturas de Baltazar Lobo, cujo museu também se situa no parque.

VALLADOLID pela noite


Entretanto, chegou mais gente. Não nos víamos desde a viagem à Turquia. Já saímos de Zamora em grupo. Tínhamos agora a companhia de mais uma Pan e dois carros de apoio. Até Valladolid era mais uma hora, cem quilómetros por via rápida. Estacionámos na “20 de Febrero” e ficámos na “Alcalleres”. A noite iria ser de reconhecimento e descoberta.

Não sem antes, registarmos mais uma baixa. A moto que faltava, a caminho de Valladolid, havia furado. Aliás, era mais do que um furo tradicional. Este, estava localizado lateralmente. Era preciso um pneu novo. Numa sexta-feira, ao fim do dia, já as oficinas estão fechadas. Esperando pelo pneu e pela respectiva montagem perderíamos grande parte da manhã de sábado..

E, no dia seguinte, tínhamos de sair cedo. Para cumprirmos o trajecto previsto, era preciso partirmos cerca das 8 da manhã. Por tal, além das três motos, o carro levaria mais dois viajantes. Já não havia vaga no quatro rodas. Aliás, ainda havia de dar boleia a mais uma pendura, num troço de terra batida, just in case…









Nesta noite, daríamos um passeio pedestre ao longo de cerca de 2,5 kms. Com o António como cicerone, começamos pela formidável Plaza Mayor, passámos pela Fonte Dourada, pela iluminação exuberante da Catedral, pela casa onde nasceu Filipe II, I de Portugal, e entrámos na Igreja de San Pablo, um edifício construído em finais do século XIII,  e cuja fachada é uma obra-prima do gótico seiscentista.


Acabámos a jantar num dos admiráveis restaurantes desta cidade - a região também possui um conjunto de restaurantes e pratos típicos, muito apreciados pelos portugueses que participam nos "Pinguinos" - e que servem os não menos incomparáveis pratos de grelhados de carne, acompanhados pelos bons tintos espanhois. 

O primeiro dia estava cumprido

ORBANEJA DEL CASTILLO, uma cascata com 25m de altura

De manhã cedo, bem cedo, estava fresco, muito fresco. Esperávamos andar entre os 3 e os 12 graus positivos: quase conseguimos! Quando saímos, estava de “bater o dente” e chegámos a registar 1 grau na estrada, embora o céu continuasse azul. Acho que parámos uma vez para verificar e acreditar no termómetro...








Ainda parámos depois para acertar itinerários, pouco antes do primeiro objectivo do dia. O frio mantinha-se mas, apesar de estarmos já numa zona florestal, a temperatura do ar subiu um pouco. Estavamos perto de ORBANEJA DEL CASTILLO e da sua admirável cascata.

Entre uma bruma que ia descendo à medida que entravamos no vale e o verde seco e forte da floresta, um jorro de água surge abrupto da colina, escorregando em socalcos parecendo vir por dentro da montanha. Parece um sítio saído das histórias de fadas.

Depois, a água passa sob a estrada e espraia-se por diversos cursos, colina abaixo, formando alguns pequenos lagos. Ali perto, um pequena ermida dá conta da devoção que o sítio implica. A água é límpida e estranhamente azulada.

Do outro lado da estrada, as casas típicas de pedra trepam as colinas. Para lá, subimos uma escadaria estreita e íngreme. A meio, uma pequena loja com produtos típicos é a única prova de vida de que há mais alguém na aldeia que não seja turista.

Mais um esforço e estamos no centro da aldeia onde corre o ribeiro que alimenta a cascata e provém da Gruta da Água. À volta, é a pedra que domina, nas casas e nas elevações que circundam a aldeia. O nevoeiro mantém-se mas deixa ver a urbe onde, estranhamente, ainda circulam automovéis.


Paramos, bebemos um cacau quente e conseguimos aquecer um bocado. Com os cafés a abrir - parecia apenas existir um - mas ainda não a servir, vamos até ao miradouro perto da entrada da “cueva” (gruta).

Não entramos. Temos todo o tempo do mundo, mas está controlado por uma agenda bem organizada. Por isso, descemos e voltamos ao cenário da cascata. Mais uma foto, mais uma pose, mas há que partir de novo. Hoje, ainda nos vamos meter em buracos.


SAN BERNABÉ, uma ermida dentro da montanha


Descemos, apanhamos as motos e continuamos no desfiladeiro até que a floresta deixa á vista os contrafortes pétreos dos montes. Voltamos ao planalto , menos arborizado, e chegamos à ERMIDA DE SAN BERNABÉ, implantada numa gruta de formação cársica.

Deixámos as motos no parque de estacionamento que deve ficar por cima da gruta. Descemos uma rampa jeitosa, inscrevemo-nos e pagamos a visita guiada. Esperamos à entrada da gruta, preparados para tudo.

Entramos já munidos de capacetes, não vá alguma cabeçada nos dar cabo do miolo ou estragarmos séculos de sedimentações. Descemos inicialmente de forma ligeira e numa plataforma alargada para, logo após, o caminho estreitar e a luz se desvanecer. Depois, trepamos lentamente através do que parece um túnel.












Desenbocamos na ermida - há dúvidas sobre a respectiva data de fundação, entre os séculos VIII e XIII - dedicada a San Tirso e San Bernabé. É tosca, de planta irregular, sendo os tectos abobodados profusamente pintados, representando os martírios e millagres dos dois santos. 

O lugar combina três espaços muito interessantes: a gruta de Ojo Guareña, formada pela passagem de águas pluviais, com quantidades apreciáveis de dióxido de carbono, que dissolvem os calcários ao longo das muitas fendas interiores; uma ermida interna e, ainda, uma ermida exterior, que faz lembrar sítios de “O Senhor dos Anéis".


Na Ponte de Deus


Voltamos à estrada, agora num estreito ramal de uma secundária, porém com piso aceitável. Daí a pouco mais de uma dezena de quilómetros, pararmos em PUENTEDEY. Deixámos a igreja românica e o Palácio dos Fernández de Brizuela na zona urbana, estacionamos as motos perto de uma pequena ponte e percorremos nem 50 metros a caminho de uma enorme cavidade que fende o rochedo.


Essa fenda, que o rio Nela foi escavando ao passar, construiu uma ponte natural com ar de caverna. O “buraco” é enorme, dando ideia da quantidade de água que foi necessária para perfurar a montanha. Passamos inclusivamente para o outro lado daquele enorme túnel, fazendo votos para que não desabasse em breve.

A localidade não se chama Puentedey por acaso. Dizem que aquela cavidade imensa foi feita pelo “dedo físico de Deus”.  Mesmo visto ao longe, o túnel surpreende pela dimensão. O que deve ter começado por um buraquito na rocha... mais espanta se descobrirmos, por cima, um conjunto de edifícios que constitui a povoação.

Trepar para a Cascata em TARTALÉS


Com o tempo da tarde a ficar mais ameno, começamos a subir para Tartalés. O perfil da estrada passa a ser estreito para duas motos e as curvas são bem fechadas, de virar pescoços, de não parar para não cair. É lindo, parece que lambemos o asfalto com os olhos no declive. Cada vez mais acima, cada vez mais bonito de fazer.

Trepamos desde Hoz, até que se abre um túnel na rocha, para dar lugar à estrada que vai para TARTALÉS DE LOS MONTES. Passamos por baixo, é ali. Mais acima, porém, não é fácil estacionar 1 carro e 3 motos. Lá ficam, cada um para seu lado. Descemos a pé. Subimos antes do túnel e não vale a pena. Passamos o túnel e tudo muda: a paisagem, o ar, o rio. O ambiente é unanimemente interessante. Ficamos a olhar a cascata, a esticar o olhar para o vale, a descobrir de onde viemos, a reconhecer os "ganchitos" que dobrámos.

FRIAS, gelada

Já estamos suficientemente contentes para enfrentar o fim da tarde, o céu de um azul mais forte, o ar mais gélido, a estrada estreita, o próximo destino. A entardecer a olhos vistos, vislumbrámos FRIAS, talvez a cidade mais pequena de Espanha (?), que dizem ter apenas 384 habitantes. Surge ao longe, na encosta de um monte, logo após um vale largo e plano. O castelo domina a paisagem. Outro cenário que parece de ficção.

Antes, porém, passamos uma ponte medieval sobre o Ebro, com torre defensiva, do século XIV, e a também medieval ermida de Santa Maria de la Hoz. Deixamos as motos em baixo e trepamos ao castelo, uma construção do século XII misturada com elementos do século XVI. Havia fechado há minutos. Por tal, embrenhámo-nos nas ruelas estreitas, pedregosas e íngremes do povoado, ainda com meandros medievais e ambiente rústico.

A noite já havia caído quando chegámos ao hotel El Vallés, em Briviesca, onde ficámos alojados, tendo inclusivamente jantado longamente, passando em revista um belo dia para andar de moto e conhecer novos ambientes. Após a manhã gelada, mesmo no limite do conforto, a noite de conversa foi aquecendo o ânimo para regressarmos à estrada no dia seguinte. Cedinho.

E por aqui andámos durante o dia 2


Casa medievais de COVARRUBIAS




Não são mais de 80 kms até Covarrubias. Não está tão fresco como no dia anterior, mas os forros dos fatos são para ficar. Entramos pela ponte e deixamos as motos no primeiro parque de estacionamento. Apesar de o sol já brilhar os barretes também ficam.
De lá, já se destaca a antiga muralha, além do Torreão de Doña Urraca, uma edificação moçárabe do século X, a única fortaleza castelhana anterior ao século XI que se conserva. Um passeio acompanha o rio que quase se cola à muralha. Promete. Mas não vamos já por aí.

Agora é entrar no centro urbano, ruas em lajes, com casas de dois pisos em pedra, varandas, arcadas, bastantes arcadas, janelas floridas, e muitas casas com uma trama em madeira nos pórticos, a cruzarem e/ou nas extremidades das fachadas. 


Ainda está frio e as ruas estreitas, quase desertas, ainda não se deixam banhar pelo sol. Vamos deambulando, rua após rua, a caminho da zona central da aldeia, mas é nas praças que o sol surje a aquecer-nos. É para lá que vamos.

As praças são pequenas mas acolhedoras. Não há muitas lojas abertas, mas já há uma esplanada que nos acolhe. Dentro do café, no solo, uma placa de vidro mostra um testemunho medieval existente na cave. Cá fora, o café e o sol aquecem-nos e a conversa faz o resto. 

Saímos pelas ruas e espreitamos uma loja de artesanato que abria ao ritmo da manhã. Mais à frente, surge uma estátua da princesa Cristina, de origem viquingue. Casada com o irmão de Afonso X, tem o seu túmulo próximo da igreja da aldeia, onde tocar o sino da princesa garante casamento certo.

Daí a pouco, passamos a muralha, deixamos a enorme balista (uma espécie de besta gigantesca) sobre as ameias, damos mais dois dedos de conversa, marginamos o rio e voltamos à ponte.

SANTO DOMINGO DE SILOS, com canto gregoriano

São mais vinte minutos pela municipal, num troço onde, de vez em quando, neva. Não hoje que, apesar de prometer, não cumpre. Aliás, o sol já vai alto e a temperatura subiu. Agora, está agradável para andar de moto.

Santo Domingo de Silos é um povoado relativamente pequeno, o que não implica ter um mosteiro beneditino, que remonta à época visigótica, altura em que os árabes já andavam na Península.

Dizem que o claustro é uma obra-prima do românico espanhol, mas não tivemos oportunidade de o visitar. Porém, conseguimos assistir a alguns pedaços da missa acompanhada por cânticos gregorianos, executados por um coral de mais de uma dezena de clérigos. 

É tão raro ter esta oportunidade que valeu a nossa curta estada no local. O mosteiro conta ainda com uma biblioteca e uma loja que junta uma coleção de frascos de Talavera e um laboratório com instrumentos antigos.

Mais acima, próximo de onde deixámos as motos, estava o passado num regresso ao futuro: nada mais do que um DeLorean e um Morgan, "espécies" com as quais é raro contactar. 




Caso sério esta terra, onde ainda se ouve canto gregoriano, estacionam DeLoreans e as flores crescem em sapatos ou nos tampos das cadeiras.


DESFILADEIRO DE LA YECLA: sob o domínio dos abutres

pouco mais de meia centena de quilómetros a sul de Burgos, este desfiladeiro, situado no sopé da Montanha de Cervera, tem pouco mais de meia centena de metros de comprimento. Percorre-se sobre um passadiço, onde dificilmente se cruzam duas pessoas. 

Faz-se entre escarpas que distam por vezes 2 metros de largura, sobre o tal passadiço de metal, que permite passear sobre a ribeira de Cauce que vai formatando a garganta. Aqui e ali, várias bicas ainda gotejavam com água límpida e gelada.

O caminho é curioso permitindo, de vez em quando, lavar a cara ou as mãos em algumas dessas bicas de água que ladeiam o caminho. Tão estreito é na maioria do percurso, que o sol não chega a penetrar em alguns espaços, assim como não permite vislumbrar as inúmeras aves de rapina que ocupam o cimo da montanha, a mais de 100 metros de altura.

Do estacionamento, mesmo antes de um túnel que fura toscamente a montanha, aí sim, é possível observar o vaivém lento dos abutres e das águias que dominam o cume. Atravessámos o passadiço e regressámos pelo túnel viário para o estacionamento para pegar de novo nas motos. Já deu para aquecer.

Dali a CALERUEGA é um instante. Pára, não pára, ainda estacionamos para ver se se almoça, não almoça, e acabámos por atravessar a povoação, passando apenas pelo Real Monasterio de Santo Domingo e pelo Torreon de los Guzmanes, sobre um piso tramado de lajes irregulares.

Sem decisão para ali ficarmos, saímos, reabstecemos ali próximo - felizmente, antes de chegarem grupo enorme e heterógeneo de motociclistas espanhois e seguimos para

MADERUELO, da ponte à máquina de guerra

Quem chega à ponte sobre o rio Riaza, vê ao que vai. Do outro lado, a povoação trepa a encosta situada sobre um extenso esporão muralhado. Percebe-se que o burgo já teve uma função defensiva importante. 


Não é fácil estacionar mas, felizmente, estávamos de moto. Entra-se pelo Arco da Vila, uma das quatro portas emblemáticas, sendo esta que dá acesso principal à zona de lojas, a que mantém ainda fechaduras e reforços blindados do século XV. 

Ainda lá está, pelo menos, uma catapulta virada a leste sobre um dos troços de muralha. Avança-se pelos ruas medievais para chegar à praça do pelourinho e da igreja de Santa Maria, única da província em estilo califal.

A poente, o rio não está acessível, pelo menos não o vimos. Embora o tenhamos percebido à entrada, é no miradouro virado a leste que se deixa ver a grande extensão do leito do rio que lhe serve de defesa natural. 

Daí, sobretudo quando o rio leva pouca água, ainda é visível a Ponte Velha e descobrir-lhe a configuração destinada à cobrança de passagem, e ainda verificar que ainda se conservam os escudos com as armas da família Pacheco.

AYLLON, mais medieval


Daí a um quarto de hora, estávamos em Ayllon. Fomos trepando lentamente à procura de um lugar para estacionar. Chegámos à Plaza Mayor que, apesar de não ser grande, é um dos sítios mais emblemáticos da povoação. E, nem sequer aqui, nos poucos recantos disponíveis, era permitido estacionar uma moto.


É que foi em Ayllon que se assinou o tratado de paz entre Portugal e Castela, em Outubro de 1411, decorrente ainda da batalha de Aljubarrota, em 1385! Realmente há pouco espaço disponível para motos, pior ainda para quatro rodas. Mas também não ficámos longe do sítio onde almoçámos, um repasto de cabrito digno de menção.


ERMIDA DE SAN FRUTOS, onde nos vamos meter!


Deixámos o almoço chegar quase ao lanche. Anulámos a visita a Sepúlveda e a Pedraza. Mas teríamos a compensação na ida à Ermida de San Frutos (São Frutuoso, julgo, em português), em Carrascal del Río.

Trata-se de ruínas de um antigo complexo monástico, perdido numa colina, ao mesmo tempo istmo, marginado pelas águas tranquilas do rio Duratón. É um lugar ímpar, de beleza mas também de isolamento.

Há alguma controvérsia no que respeita a parte da igreja estar ainda em uso. O conjunto encontra-se à beira de uma falésia com uma vista excelente sobre os meandros do rio. Para lá chegar é que a coisa não é fácil.


Além de a estrada ser em terra batida, com muitos roços, alguns deles bem profundos, há que fazer quase 5 kms para lá e outros tantos para regressar ao asfalto. Com motos de estrada, é obrigatório rolar com muita atenção. E esperar que não haja pedras pontiagudas que provoquem furos.

Apesar disso, valeu a pena. Não é todos os dias que chegamos a um sítio que tem tanto de inóspito como de fascinante, um lugar com mais de 1000 anos, envolto por uma paisagem podrosa e contemplativa. 

Embora muitas das dependências estejam em clara ruína, ainda são visíveis algumas sepulturas antropomórficas. O pôr do sol na fachada da igreja faz o resto, enquanto as voltas do rio tranquilo copiam as margens. 

Do percurso do 3º dia


DE VOLTA A CASA, entre o dilúvio e a bonança




O Eduardo tinha outro trajecto e não saiu connosco. Não chovia quando deixamos Valladolid. Daí a pouco, começou a chuviscar e, depois, uma valente bátega de água abateu-se sobre a A62. 

Passámos Tordesilhas e o dilúvio manteve-se. Só quando parámos antes da fronteira de Vilar Formoso, o sol apareceu como se tivessemos passado uma fronteira climatérica.

A temperatura aumentou, os fatos secaram e continuámos para a Covilhã. Demos um passeio local pelas ruas estreitas da cidade beirã e, à hora de almoço, estávamos no Laranjinha. A escolha foi excelente o que proporcionou um almoço delicioso. 

Deixamos um agradecimento aos companheiros viagem e especialmente ao organizador do passeio, António, que ficou em Valladolid. 

Deixámos os nosso companheiros da moto, Teresa e David, a caminho de Leiria, despedimo-nos do Rogério e da Ana e separámo-nos da Delfina numa área de serviço da auto-estrada. É óptimo viajar em boa companhia.