segunda-feira, 22 de maio de 2017

RUTA DE LA PLATA- De Alcala de Guadaira a Mérida



Sevilha, Carmona, Italica, Santa Olalla, Mérida,
são sítios de referência da denominada Ruta de La Plata,
que liga Sevilha a Gijon, através da estrada nacional 630. 
Na vizinhança desta, até Zafra, Feria ou Alange
(que não fazem parte da N630), também são localidades 
históricas e patrimonialmente interessantes.
Desta vez, o períplo cumpre a N630. 
Vai a Sevilha, Italica e Mérida, com paragem em Zafra para almoço. 
Sevilha mantém um centro histórico imponente e sedutores bairros envolventes. 
Italica mostra a grandiosidade romana na Península, 
quase a par de Mérida, onde dominam o Teatro, o Circo e o Museu.
Palácio de Lebrija, Sevilha
Outros pontos logísticos, como sejam Alcalá de Guadaira,
onde ficamos alojados na noite anterior, 
ou Zafra, onde almoçamos no primeiro dia, 
também possuem locais interessantes. 
Na primeira, destaca-se uma ponte romana e 
um castelo medieval, além da Ponte do Dragão, e na segunda, 
o Parador e a Plaza Mayor são dois ícones cativantes. 

A RUTA DE LA PLATA



Embora só tenha percorrido a primeira etapa da Ruta 
que leva de Sevilha a Mérida, não testemunhei, 
nem sequer sei se ainda existem, algum dos troços 
do antigo caminho romano que empresta o nome ao percurso.
Embora por vezes apareçam cartazes enormes com indicação da Ruta, 
não vi informações detalhadas que identificassem este ou aquele ponto de interesse.
Casa de Pilatos, Sevilha
A Ruta de la Plata representa um itinerário antigo, 
anterior à invasão romana da Península.
Mas que foi largamente beneficiada com calçada romana 
na época dos imperadores Trajano e Adriano.
Um percurso que unia a Cantábria ao sul da Hispânia.
Tratava-se de uma via que, além da comunicação que estabelecia 
entre o norte e o sul da Península, possibilitava trocas de produtos 
de todos os tipos, para além de facilitar o controlo do império. 
A nossa Rota tem início em Alcala de Guadaira, 
atravessa a antiga Hispalis (Sevilha), 
passa pelas ruínas romanas de Itálica 
e vai através de Zafra e Almendralejo até Mérida.
Entrada em Mérida
Depois, segue para Cáceres e Plasencia, passa por Béjar,
Salamanca e Zamora. Benavente, Astorga e Leon, 
levam a Campomanes e Pola de Lena, 
antes de subirem para Oviedo e Gijon, onde termina o caminho. 
Actualmente o percurso viário faz-se através da N630. 
Nós só percorremos a primeira etapa, da antiga Hispalis a Emerita Augusta. 
É desse trajecto que damos nota.

PIC-NIC EM ALMENDRALEJO

O dia previa-se fresco de manhã e mais ameno á tarde. 
De Lisboa a Sevilha, não chega a meio milhar de quilómetros, 
via Badajoz, Almendralejo e, depois, Autovia de la Plata. 
Para Alcalá de Guadaira, é tomar a A92, a caminho de Málaga 
e, um quarto de hora depois, estamos lá. 
Descartadas paragens para visita, o percurso faz-se calmamente 
em cerca de cindo horas desde Lisboa.
Com as rodas na estrada pouco depois das 8 da manhã, 
não é difícil chegar antes da uma da tarde espanhola 
perto de Talavera la Real. 
Foi aqui que pensámos ser razoável trincar qualquer coisa. 
Todavia, quando abastecemos no posto Saras, 
era realmente cedo para almoçar. 
Por tal, só parámos em Almendralejo. 
Poucos quilómetros antes da localidade, decorria uma festa religiosa 
que levava milhares de pessoas a uma igreja das proximidades. 
Tratava-se de uma espécie de romaria, em que muitos iam de carro, 
outros pé e ainda outros em carroças engalanadas puxadas por machos.
Parámos numa quase deserta Plaza de Estremadura, 
devorámos duas sandes que levávamos 
e bebemos um café bera num bar “às moscas”. 
Foi pouco depois que pisámos pela primeira vez a N630.
Mas durante pouco tempo. 
A seguir, seria a Autovia de la Plata a levar-nos para sul. 
Dali a Sevilha eram pouco mais de centena e meia de quilómetros 
através da Autovia de la Plata. 
Não havia trânsito, o céu não estava totalmente azul 
e o vento soprava forte de oeste, 
ora a contrariar o punho do acelerador, 
ora a empurrar o cotovelo e o ombro direitos com violência.
Ainda parámos num desvio da autovia para solucionar uma cãibra 
que surgiu entre o polegar e o indicador da mão direita. 
Como nunca me aconteceu coisa semelhante, 
inculpei o vento que me obrigava a controlar o punho de outra maneira. 
Passou rápido.

A SIMPATIA DE SEVILHA



Está excelente, esta Sevilha. 
Pouco trânsito para entrar por volta das três da tarde. 
Acesso fácil, mas sinalização ausente para onde queríamos ir, Casa de Pilatos. 
Se não tivesse feito o trabalho de casa habitual 
– Google Maps com mapas e imagens de acesso, e mais informações de, “como chegar” -, 
não encontraria qualquer placa, nem o desvio respectivo…
Felizmente, era fácil lá chegar. 
Desde a Isla Magica bastava seguir pela Recoleto
até um pequeno parque e virar aí à direita. 
Para motos, era possível estacionar praticamente 
em frente da recepção, num pequeno jardim, fronteiro ao palácio 
mais conhecido por Casa de Pilatos. 
De carro, não sendo morador, só é possível passar.
Por ali, as ruas são curtas e estreitas. 
O traçado tradicional em estilo árabe
– que mantém as ruas protegidas do sol – 
é também labiríntico. 
Para retomar à Recoletos, não é fácil. 
Todas as ruas parecem iguais, 
com sentidos proibidos e sentidos obrigatórios. 
Faz lembrar uma medina…
A ligação entre muitas das ruas faz-se através de praças,
pequenas ou grandes, onde há sempre um esplanada. 
Surpreendem-se algumas fachadas emblemáticas, históricas ou em recuperação. 
O comércio continua a ser diversificado e a ocupar os pisos térreos.
Há cada vez mais artérias destinadas exclusivamente aos peões, 
especialmente as ruelas mais estreitas. 
Por tal, o estacionamento é complicado ou impossível, sobretudo para carros. 
Mesmo parar, obriga que todos os veículos a circular naquela rua,
 sejam obrigados a parar também.
As motos vão ficando em cima dos passeios das praças. Por enquanto. 
Ainda tentámos espreitar o Palácio de Lebrija, 
mas já estava em cima da hora para a visita à Casa de Pilatos. 
Apressámos o passo, mas já não conseguimos chegar a tempo da visita guiada.

CASA DE PILATOS


Construída entre os séculos XV e XVI, 
em plena ascensão económica espanhola, 
mercê sobretudo da “importação” de riquezas das Américas, 
o palácio é também um testemunho de luxo, 
desta Ruta de la Plata que, em boa hora,
foi planeada para ser percorrida pelo Clube.
Plaza de Pilatos, Sevilha
São salas, pátios e jardins, que Fradique Enriquez de Ribera,
um magnata sevilhano, um dos mais ricos da época,
mandou decorar em estilo árabe, romano, gótico, mudéjar e renascentista,
após um périplo pela Palestina e por Itália,
que emprestou ao palácio um ambiente pitoresco.
Após a morte do irmão, Fradique ficou como único herdeiro
da casa e da fortuna dos pais. 
Após a viagem inspiradora que fez, 
expandiu o edifício original, abrindo galerias, 
substituindo pilares por colunas, 
colocando ainda a fonte central no pátio.
O périplo por Itália motivou-lhe a colocação de um friso de altos-relevo
 com personagens históricas da antiguidade romana,
bem como de um conjunto escultórico
que guarda o pátio como sentinelas pétreas que, na altura,
fortaleciam a ideia de continuidade do império.
A antiguidade clássica romana e a arquitectura árabe e mudéjar
dominam o ambiente estético e arquitectónico. 
A primeira destaca-se com a estatuária e alguns altos-relevos
(realce para o friso de notáveis romanos), alguns frescos e os jardins. 
A segunda, com a arquitectura, os arcos e as colunas, 
os azulejos , as portas, a fonte, os ferros.
Uma das salas mais estranhas é a da capela 
– que, segundo consta, é uma das dependências mais antigas do palácio – 
onde se mistura o portal de entrada árabe com abóbadas adornadas 
com as armas de um militar, um altar e meia parede preenchidos com azulejo, 
e ainda uma coluna que parece deslocada no conjunto.
Embora a entrada principal do palácio 
– hoje transferida para uma fachada lateral-,
seja de mármore em estilo renascentista, 
dá acesso a um jardim e daí a um pátio andaluz, 
dominado por uma fonte central, 
que se constitui como um dos sítios mais atractivos do palácio.

Da colecção de arte exposta, saliento um quadro do século XVII, 
de Jose de Ribera cujo detalhe não percebi imediatamente. 
Trata-se de um retrato de Magdalena Ventura,
 intitulado "La Barbuda", uma mulher mãe de cinco filhos, 
" la quale hala faccia totalmente virile, 
con più di un palmo di barba nera bellissima, 
ed il petto tutto peloso"
Apesar de termos subido ao primeiro piso, 
não chegámos a visitar nenhuma das três salas disponíveis. 
Todavia, pelo que percebemos, 
o piso térreo já é suficientemente rico para satisfazer curiosidades e criar bem-estar. 
Vale a pena estar sentado no pátio e passar lentamente os olhos pelas galerias.

Tal como é esteticamente interessante ir até aos jardins que, 

apesar de não serem muito sofisticados, 
juntam harmonia, cor e frescura aos espaços exteriores. 
É notório o divórcio entre entre o interior, praticamente nu, 
e os jardins, plenos de vegetação.

O ambiente tem muito de pátio andaluz, 
porém mais rico do ponto de vista decorativo e arqutectónico. 
Talvez por isso, tenha sido escolhido como cenário de alguns filmes
mais conhecidos como, “O Reino dos Céus” e “1492, Conquista do Paraíso”.
Apesar de o conjunto arquitectónico juntar diversos estilos e elementos decorativos,
que em alguns espaços contrastam sem sentido ou estética, 
percebe-se a ideia de juntar um conjunto de temas, cores, 
texturas e ambientes ornamentais procurava, também, 
mostrar “tudo” aquilo a que o(s) proprietário)s) atribuíam valor,
quer pelo prestígio, quer pela estética.

SEVILHA MONUMENTAL



Alguns anos depois das obras que deixaram a zona monumental 
praticamente exclusiva a peões, trens puxados por cavalos 
e transportes públicos (uma espécie de Metro de Superfície), 
notam-se os benefícios. 
Menos poluição, mais espaço para as pessoas (incluindo turistas), 
mais comércio, mais animação.
 
Neste último capítulo, estava o concurso de três personagens insuspeitas,
enfiadas dentro de uma espécie de caixa, mais não faziam do que, 
ao gritar e esticar a cabeça para fora do caixote, 
pregar um valente susto aos passeantes distraídos. 
Democraticamente, a surpresa contemplava novos, velhos, 
homens e mulheres, algumas mais sobressaltadas do que outras…
Trata-se de uma zona que alberga um importante conjunto de edifícios históricos 
– a Catedral, a Arquidiocese, o Real Alcazar, 
o Arquivo Geral das Índias, o Ayuntamiento, só para citar alguns -, 
locais amplos onde é habitual haver uma grande circulação de turistas.
O contraste entre os edifícios mais antigos e os do século XX ainda é notório, 
apesar da mediação de alguns do século XIX, 
que vão fazendo a charneira entre os da Alta Idade Média, 
do Renascimentos e os da Revolução Industrial. 
Semelhante confronto se passa entre os trens puxados a cavalo, 
os segway e as pequenas scooters de design futurista 
que evoluem em redor dos edifícios históricos.
Av. de la Constitución
Para o interior da cidade desenvolve-se a zona mais antiga, 
composta pela miríade de ruas estreitas com traçado sinuoso. 
Mais perto da catedral, que representa mais ou menos
 o centro desta zona histórica, multiplicam-se os cafés-bares, 
muitos deles com esplanada, sobretudo na Mateus Gallo.
Há mais edifícios recuperados segundo a traça original, 
o que torna as ruas mais agradáveis, inclusivamente na zona central,
onde ainda há muito por descobrir. 
Túneis que levam a pátios, pequenas lojas com produtos artesanais, 
uma ou outra praceta com estátuas.
Nesta zona, até existem dois
grandes parques de estacionamento para motos. 
As motos em Sevilha encontram-se quase
na razão directa das bicicletas em Tóquio. 
Estão em todo o lado, há parques por toda a cidade. 
Entende-se que os sevilhanos não queiram encher
as ruas estreitas do centro com carros.

Os edifícios mais emblemáticos estão limpos
ou foram pintados recentemente. 
Também nos bairros limítrofes do centro, mas sobretudo aqui,
local de excelência no que respeita ao turismo, 
mas também referência histórica de uma cidade
plena de história num pais histórico.  
Plaza del Cabido, Sevilha
E a limpeza das ruas, que não é habitual primor, recomenda-se. 
Pelo menos aqui, na zona monumental. 
Por volta das cinco da tarde, há muita gente às compras e a andar de bicicleta. 
Muitos são turistas, que se distribuem entre a Catedral e o Alcazar, 
mas também deambulam pelas ruas que os envolvem.
Banco de Espanha, Sevilha
A Giralda, antigo minarete convertido em campanário de igreja cristã, 
continua a marca uma presença indelével no centro histórico. 
Maioritariamente árabe do século XII,
a torre da catedral de Sevilha,
– semelhante à Cutubia de Marraquexe -
culmina numa construção cristã que suporta os respectivos sinos.
A catedral está ali, paredes-meias com os traços góticos, 
mudejares, góticos, renascentistas, barrocos,
 neogóticos, em contraste com os feitios fusiformes exteriores, 
com os vitrais dos séculos XV e XVI, 
com a filigrana pétrea das fachadas, com as rosáceas, 
de uma das maiores Catedrais do mundo.

ALCALA DE GUADAIRA


Fica a pouco mais de quinze minutos de Sevilha. 
O acesso é fácil mesmo ao final do dia. 
É só ter atenção à saída da A92 que continua para Málaga. 
Depois é seguir as indicações até uma rotunda,
onde a Ponte do Dragão convida a passar para lá e para cá. 
Foi o que fizemos.
É da rotunda que também se vê o castelo, 
erguido numa colina perto do rio Guadaira 
que circunda todo o poente da urbe. 
Estiveram aqui gregos
– possíveis fundadores do lugar original, Hienipo – 
depois romanos, visigodos, muçulmanos e cristãos. 
É assim por toda a Península Ibérica...

Os cristãos conquistaram a cidade definitivamente
ainda em meados do século XIII,
tendo sido nessa altura que as muralhas do castelo foram reforçadas. 
Pena, que mal se vejam devido à vegetação,
a partir da esplanada do hotel Oromana. 
Mesmo assim, estávamos bem servidos de paisagem. 
Além do rio, meia Guadaira ficava à nossa frente.  
O hotel tem quase 90 anos. 
Foi recuperado há relativamente pouco tempo. 
É interessante, com zonas simpáticas, uma sala de refeições
com muitas portas envidraçadas e um serviço aceitável. 
Por tal, a reunião preliminar à Ruta começou ao fim do dia,
na esplanada, entre os Gins que acompanham o convívio habitual destes eventos.
Hotel Oromana, Alcala de Guadaira
De tal maneira que apetecia estar, olhar a paisagem,
beber um aperitivo, trocar conversa com quem estava na varanda do quarto,
com quem chegava, contar as últimas da viagem. 
E o tempo ajudava. 
Não havia vento e a temperatura,
apesar de não estar adicta à piscina, mantinha-se amena. 
Ao princípio da noite parecia mesmo que aquecia…
Ao jantar, dividimo-nos por duas mesas para partilhar uma refeição bem servida
e bem regada no costumeiro ambiente familiar, 
na sala de jantar com várias portas envidraçadas
 que ainda deixavam antever Guadaira. 
Já aqui se alertava para a liberalidade do dia seguinte, 
uma espécie de Ruta de la Plata à medida do CPEP.
Foi também aqui que soubemos do percalço de uma BMW,
que já não chegou a Espanha - electrónica oblige – 
e que teve de ser substituída por uma Pan. 
Não consta que tenha havido mais contrariedades, 
nem deste tipo nem de outros, com as motos envolvidas no Passeio.
Com uma noite a convidar à caminhada, 
metemo-nos ao caminho para Alcalá. 
Saímos do hotel, que fica fora da cidade e na outra margem do rio, 
descemos para a ponte romana, posámos junto dela
e trepamos para um bairro de casas baixas.
Sem grandes alternativas para beber qualquer coisa,
num quarteirão que parecia ”às moscas”,
optámos por ocupar uma esplanada e trocar umas cañas,
bem como algumas estórias, aliás uma estória,
que ainda contemplava o almoço de Natal do ano passado.
Regressámos a tempo de descansar o suficiente para, no dia seguinte, 
já com todos os que fariam parte da primeira etapa, 
atravessar Sevilha numa manhã de dia de trabalho. 
O horário de partida já estava traçado.
Permitiria a primeira das liberalidades propostas para o dia seguinte.

N630 - DE GUADAIRA A ITÁLICA


Desta vez, o organizador do périplo não participava. 
Por tal, foi aventada uma configuração 'sui generis' 
que nomeava dois guias diários, um que liderava a caravana 
e outro que a fechava. 
Estes seriam responsáveis pela gestão do percurso 
de todos os participantes.
Com o casal Marques a liderar e o Zamith a fechar o pelotão, 
deixámos Alcalá de Guadaira rumo a uma Sevilha tranquila 
e relativamente fresca para esta altura do ano. 
Em cerca de meia hora, após passarmos o teatro romano, 
estávamos a parar à porta do anfiteatro de Itálica.
Itálica, Santiponce
Consta que foi aqui que nasceram os imperadores Trajano e (tavez) Adriano. 
Os gregos, que parecem ter estado em todo o lado, 
também aqui estiveram muito antes do tempo de Cristo. 
A cidade romana data início do século III, 
fundada no intuito de acolher os soldados romanos
que lutaram contra os cartaginenses na batalha de Ilipa, 
ocorrida durante a II Guerra Púnica.
Tivemos oportunidade de entrar no grandioso anfiteatro, 
com capacidade para 25 mil espectadores 
– neste dia, sem disponibilidade de visita guiada e com algumas áreas interditas -, 
e perceber a dimensão daquele que foi um dos maiores anfiteatros 
do império romano no mundo.
Não será, hoje, o mais alto anfiteatro romano em solo europeu. 
Todavia, é imponente, sendo possível percorrer os corredores
de acesso às três plataformas e, do alto, ver a dimensão do fosso central
dedicado aos diversos espectáculos de feras e de gladiadores.
Um dos ícones que, apesar de pequeno e não identificado,
chama a atenção e desafia a imaginação mais poética,
é o desenho de seis pés, marcados em mármore que, afinal, 
não tem aqueles atributos sexuais imaginados, 
uma vez que se trata de uma lápida votiva 
dedicada à patrona dos gladiadores.
Mas Itálica não é a apenas o anfiteatro, e o teatro,
que fica a algumas centenas de metros. 
Naquele espaço, convivem também as muralhas, as termas, as vilas e o aqueduto. 
A área é extensa e rica. 
Há ainda uma grande quantidade de excelentes “tapetes” de mosaicos 
pertencentes a casas de famílias de notáveis.
Antes de partirmos, bebemos um café numa esplanada fronteira à entrada das ruínas. 
Quando voltámos à estrada mantinha-se ainda a frescura da manhã. 
As temperaturas anunciadas para estes dias não haviam coincidido com a realidade.

N630, DE ITÁLICA A FUENTE DE CANTOS

Foi praticamente aqui que iniciámos o périplo pela Ruta de la Plata. 
Logo após Santiponce a estrada tem um perfil rectilíneo, 
com raras curvas largas, pouco trânsito e bom piso. 
Talvez a parte mais lenta tenha aquela em que fomos obrigados 
a rodar atrás de duas camionetas de turismo numa zona de traços contínuos.
Fuente de Cantos, Estremadura
A estrada enrola por altura da sierra Morena 
– e ainda bem, uma vez que quebra a monotonia - 
com o piso a manter-se excelente e as curvas com traçado aberto. 
O trânsito, que só surge perto e dentro das (poucas) localidades do percurso, é diminuto.
Chegados a Fuente de Cantos, uma das localidades inscritas no plano da Ruta, 
dividimo-nos em dois grupos, os da descoberta pedestre e o da descoberta gastronómica. 
Os primeiros optaram por fazer um passeio pelas ruas quase alentejanas da urbe,
 a caminho da Plaza de la Constitucion.
Calle Real, Fuente de Cantos
Enquanto percorríamos as alvas ruas de Fuente de Cantos na direcção do centro, 
o segundo grupo descobriu um “pata negra” muito elogiado
 e que, infelizmente, foi relegado apenas para aperitivo, 
quando podia ter sido referência de um almoço volante.

N630, DE FUENTE DE CANTOS A ZAFRA

Havendo dúvidas no que respeitava ao local de paragem para almoço, 
lembrei-me de sugerir a cidade de Zafra para o efeito. 
Era uma hipótese de aliar o local de almoço a uma visita ao Parador 
– local ideal para beber um copo ao fim do dia - 
e à Plaza Mayor da localidade.
Aqui, o sol decidiu aparecer logo após a refeição. 
Pena foi que o restaurante não estivesse preparado 
para receber tanta gente ao mesmo tempo.
Por tal, o almoço estendeu-se por mais tempo do que seria razoável,
dando tempo aos primeiros a despacharem-se
para uma visita à Plaza Mayor.
Restaurante Azafran (Huerta Honda), Zafra
Se bem que só alguns pratos de bacalhau estivessem perfeitamente confeccionados, 
valeu talvez, além do preço muito acessível, o ambiente ensolarado da esplanada 
que escoltava o parque de estacionamento onde estavam as Pans.

N630 - DE ZAFRA A MÉRIDA

Regressámos à N630, que havíamos deixado há seis quilómetros. 
Continuam as rectas extensas e o trânsito diminuto. 
Além de Villafranca de los Barros, a única localidade 
com alguma dimensão é Almendralejo, onde havíamos parado na ida, 
e onde o grupo reabasteceu.
A chegada a Mérida deu-se a meio da tarde, com trânsito lento na parte antiga.
Por tal, demorámos mais do que o previsto para aceder ao hotel
através das ruas estreitas e de sentido único. 
Para complicar a circulação, a Plaza de España estava em obras, 
circundada de redes e com menos lugares de paragem.
Mesmo em frente do hotel, o espaço disponível destinava-se 
apenas ao tempo necessário para tirar a bagagem.
Átrio do Hotel Ilunion, Mérida
Dava ideia que chegámos à hora de ponta.
Próximo do hotel Ilunion Mérida Palace, onde ficámos, 
é impossível estacionar inclusivamente motos.
É proibido estacionar em toda a Plaza de España.
Como o hotel também não dispõe de garagem, 
recorremos a um estacionamento público 
ali a duas ou três ruas de distância.

MÉRIDA MONUMENTAL

A cidade é uma referência da antiguidade romana na Península.
O local foi fundado por e para os veteranos das legiões romanas.
Vivia-se nesta altura a época de Augusto, 
um período de esplendor de Roma.
A cidade, na altura, era disso exemplo, uma aura que, 
ao longo dos séculos, soube preservar esse património.
 
Foi à procura de alguns desses testemunhos seculares que fomos, 
já a tarde se estendia pelas ruas estreitas de Mérida.
Começámos pelas arcadas da Plaza de España 
e metemos pela calle de Santa Eulalia, fotografamos a Casa Carlos 
e virámos logo após numa viela a caminho do chamado Templo de Diana.
À saída do Palace Mérida
É uma edificação com cerca de 20 séculos, 
o único templo que Mérida manteve em razoável estado de conservação.
Apesar da configuração ser semelhante à do seu homónimo de Évora, 
o templo destinava-se ao culto imperial, 
já que o imperador também era reconhecido como deus…
O templo está enquadrado no antigo fórum e, como outros 
que já tivemos oportunidade de visitar – Coimbra, p. e. -, 
dispunha de um criptopórtico.
No entanto, no século XVI o espaço central do templo
 foi aproveitado para fazer parte do palácio do Condes de Los Cobos.
Daí, ainda hoje ser visível aquele anacrónico conjunto de estilos 
que mistura a obra romana com uma fachada renascentista 
e ainda uma janela de influência mudéjar.
Mas o cosmopolitismo do conjunto conta ainda, 
cerca de 10 séculos passados, com materiais de origem visigótica.
Na altura em que por lá passámos, o templo tinha animação, 
num palco montado em frente da fachada, 
protagonizada por um grupo de crianças.
Assistimos à evolução do grupo e avançamos a caminho da zona monumental.
Na mesma rua, logo a seguir ao Templo, encontramos o Fórum Municipal romano, 
em cujo pórtico - restaurado há pouco tempo - 
é possível ver um conjunto de estátuas alojadas em nichos. 

Partes do pórtico original estão expostas
no Museu Nacional de Arte Romana de Mérida, 
a cinco minutos dali.
Era para lá que íamos, no entanto, sem esperança de que ainda estivesse aberto.
Porém, antes, parámos num bar/restaurante
 cuja fachada estava decorada por um conjunto de cerâmicas interessantes.
Entrámos, tomámos um aperitivo, 
descobrimos uma sala de refeições acolhedora 
também decorada com cerâmicas artísticas.
Percebemos depois que o estabelecimento pertenceu
a um artista plástico de nomeada, 
sendo que muitas das suas obras estão disseminadas
no interior e no exterior da casa.
Ainda houve tempo para desfrutar da esplanada
antes de seguirmos para a área do museu, do teatro e do anfiteatro romano.
Apesar de estes estarem já fechados,
ainda era possível ver no átrio que domina os três espaços
uma exposição do fotógrafo brasileiro Sebastião Salgado.
Com a proximidade da noite regressámos ao hotel,
onde o jantar estava marcado para as nove da noite,
como é habitual em Espanha.
A sala de jantar também estava exclusivamente destinada ao jantar do Clube, 
pelo que fomos ocupando parcimoniosamente 
as três mesas da sala à medida que íamos chegando.
Apesar da oferta gastronómica não ter desagradado, 
sobretudo a confecção e a qualidade, 
o serviço foi, no mínimo, sui generis.
Foi-o, especialmente em matéria de rapidez, 
já que, ainda alguns não tinham terminado o espadarte
e já outros estavam a receber a sobremesa…
Valeu a passagem pela sala contígua, decorada em estilo árabe, 
já que, apesar de ampla, a sala de jantar tinha pouca luz 
e não dispunha de janelas.
Pena que não tenhamos jantado na sala do pequeno-almoço, 
esta sim, com janelas viradas para o simpático pátio do hotel.
A noite levou-nos, após uma pequena caminhada, 
até perto da ponte romana sobre o rio Guadiana.
Trata-se da mais extensa ponte romana da Península
 com quase 800 metros de comprimento, 
suportada por quase 60 pilares visíveis da margem.
A ponte desemboca praticamente 
nas muralhas da alcazaba (alcáçova) de Mérida.
A alcabaza é um recinto quadrangular com 130 metros de largura, 
de origem romana, depois reconstruída pelos árabes, 
localizada na margem direita do rio.
Trata-se de uma das mais antigas construções defensivas muçulmanas na Península, 
que data do século nono.
Apesar de hoje apenas se identificarem algumas, o complexo dispôs de 25 torres, 
além de grandes portas ainda perceptíveis.
Mais próximo da ponte, ainda se descobre o "Alcazarejo", 
uma estrutura que controlava a travessia do rio para a cidade. 
Deixámos a noite e regressámos os nossos excelsos aposentos imperiais que, 
no entanto, já mostravam num cantito, estranhamente virado a sul, 
um papel de parede enrugado pela humidade 
que deve estar a esgueirar-se pela pedra da ombreira da janela.

PARAGEM EM BADAJOZ



De manhã, recolhidas as motos do parque de estacionamento, 
parámos em frente do hotel e fomos paulatinamente 
arrumando a bagagem nas malas.
Saímos juntos até ao acesso à N630, onde nos separámos, 
nós na direcção de Badajoz, e a restante caravana na direcçao de Plasencia.
Tomámos inicialmente a Autovia da Estremadura e, antes de Talavera La Real, 
voltámos para a “velha” N-V, itinerário obrigatório 
para quem ia assistir ao Grande Prémio de Jarama, perto de Madrid, nos anos 80. Atravessámos a localidade e continuámos pela N-V, 
embora já não tenhamos achado tanta graça como naquela altura…
Ultimamente, sempre que possível, fazemos uma paragem durante o último troço
no regresso de uma viagem, de  modo a facilitar o último troço 
e podermos conhecer mais algum sítio interessante 
antes de regressar definitivamente a casa. 

Desta vez, e na medida em que andávamos há bastante tempo a prometer, 
escolhemos Badajoz.
Realmente, já tinham passado muitos anos desde a última vez
em que havíamos entrado na cidade. 
Numa das primeiras, até tínhamos estado perto das muralhas do castelo. 
Mas suspeitamos que não entrámos.

Por isso, desta vez, a manhã era uma excelente oportunidade para o fazermos. 
Iríamos na direcção do castelo que Geraldo, o “Sem Pavor”, assediou 
e depois veio a precisar do auxílio de Afonso Henriques, 
já que não conseguiu culminar o assalto ao último reduto do sultão árabe 
aliado do genro castelhano do primeiro rei de Portugal.
Passamos o Guadiana sobre a Ponte Autonomia, 
entrámos na rotunda e saímos rumo à subida 
que dá acesso ao interior do castelo. 
Já entre-muros, existe um vasto parque de estacionamento 
– praticamente lotado devido à existência de uma Faculdade de Ciências da Documentação e da Comunicação - 
onde deixámos a moto.
Daí, o acesso ao adarve das muralhas é quase imediato. 
A situação do castelo, que encima uma das raras colinas da zona, 
é excelente no que respeita à paisagem que se descobre desde as ameias, 
quer no sentido do interior da cidade, quer para o rio e respectivas margens.
No interior das muralhas é possível identificar a Alcabaza,
o Museu Arqueológico e as ruinas da Igreja de Santa Maria de Calatrava
e do Baluarte de San Antonio 

Também vale a pena percorrer o adarve e ir identificando as diversas torres 
e baluartes que medeiam as muralhas. 
Uma das mais singulares, quer pelo nome, quer pela configuração,
 é a Torre de Espantaperros, ou Torre de Atalaia, 
de planta octogonal, a mais alta do conjunto de torres disseminadas pela muralha 
e de onde o panorama sobre a cidade é mais abrangente.
Próximo desta torre, ainda está visível a Plaza Alta. 
Após a saída dos árabes da Alcazaba, esta praça tornou-se no centro da cidade. 
Foi área de mercado durante séculos, ‘zoco’ na época árabe e,
 depois mercado medieval, além de espaço de festejos e reuniões. 
Foi para lá que seguidos, assim que descemos as ameias. 
Saímos pela Puerta del Capitel, construção almoada do no século XII, 
- que até faz lembrar a da Albazaba de Málaga – com uma saída/entrada assimétrica 
de/para a Plaza de San José. 
Trata-se da porta mais próxima a dar acesso à Plaza Alta, 
que se alcança logo após passarmos o Arco del Peso. 
Ali, o ambiente é realmente diferente do que estamos habituados 
em praças espanholas do mesmo género. 
É sobretudo a decoração tricolor dos arcos e das fachadas que marca a diversidade.
Nota-se a diferença arquitectónica e histórica 
entre a parte mais próxima da Porta del Peso, mais antiga, 
e a zona do Arco del Toril, mais moderna. 
Em redor da praça identifica-se a Casa Consistorial, 
antiga Câmara (Ayuntamiento), de traça mudéjar,
 e as Casas Coloridas, pertencentes a muçulmanos e judeus até ao século XV.
Regressámos à moto e deixámos o interior do castelo 
para acompanhar o rio até à Puente de la Universidad. 
Reabastecemos à saída de Badajoz e entrámos em Portugal pela A6. 
Depois, parámos em Estremoz para beber um “café português” 
que, só nós, portugueses, sabemos o que é.
Tal como na ida – quando parámos, em Estremoz, para beber o último “café português” – 
também agora estávamos acompanhados por uma excursão de asiáticos 
(provavelmente chineses) e outra de eslavos. 
Nesta ocasião, até havia outro casal numa Harley, 
que parou quando arrancámos.
O tempo manteve-se fresco mas pareceu aquecer 
assim que entrámos em Portugal. 
Simpatia geo-afectiva, talvez, 
um estilhaço da compulsividade sentimental do retorno, 
o tal mistério da saudade 
que nos deixa ir mas obriga a regressar.

o vídeo em https://vimeo.com/218288236