quarta-feira, 30 de dezembro de 2020

Pela Região Saloia. Almoço nos Frutos do Mar

 


Toda a gente conhece a região saloia, habitada pelos saloios, antiga denominação dada aos residentes naturais dos concelhos que circundam Lisboa a norte e oeste. Há diversas etimologias do termo saloio – com grafias diferentes, "çalaio" ou "çaloio" – cujo significado vai desde “cala” ou “salah”, oração, até à seita dos mouros “çala” ou até aos “descendentes dos provençais colonos oriundos de Salles d'Ande”.

Num livro reeditado em 2005, pela Câmara Municipal de Sintra, da autoria de A. Da Cunha Sotto Mayor que, em 1858, escreveu “A Physiologia do Saloio”, pode ler-se uma descrição de época, meados do século XIX, do modo de vida das comunidades saloias, revelando aspectos culturais curiosos, divertidos e sobretudo típicos, que acabam por promover a distinção daqueles face a outras comunidades rurais e face ao urbanos de Lisboa.

Hoje, o passeio será por aqui. Íamos, também, para comprovar outros aspectos da região: a gastronomia e a paisagem. Deixaríamos a auto-estrada em Torres e optaríamos pelas nacionais até à Atalaia. O objectivo era almoçar no Restaurante Frutos do Mar, situado na falésia junto da praia de Porto das Barcas. No regresso, a opção seria pela passagem por Porto Novo / Santa Rita, Santa Cruz, Silveira, etc.

Com um ambiente estival que motivava o passeio, a opção da moto foi derradeira. A primeira paragem a meio da manhã para um café, foi na esplanada do Parque Verde da Várzea, em Torres Vedras, muito próximo do Museu Joaquim Agostinho e à vista do castelo. A frescura do ambiente compensou o calor que já se fazia sentir e, daí a pouco, estávamos de novo na estrada.

A paisagem da região saloia anda entre a variedade orográfica, com a sucessão de colinas e vales, e a a diversidade das culturas sobretudo hortícolas e frutícolas. Os pequenos núcleos residenciais contrastam com os campos cultivados e os moinhos nos cabeços são hoje referências paisagísticas da região.

Tal como as hortas e as noras. Assim como a paisagem vinícola e de criação de animais. Típica é também a arquitectura das casas, muito ligada ao trabalho, como afirma Victor Serrão, in Sintra (os aglomerados saloios), “(...) com as suas típicas coberturas de quatro águas, um peculiar sistema de aberturas, etc., reflecte sobretudo a actividade agrícola do homem saloio, (...)”.

As estradas da região saloia são manhosas. Estreitas, escorregadias, praticamente sem bermas. Embora o trânsito não fosse muito e não houvesse tractores ou carrinhas de trabalho nas estradas, a verdade é que ninguém gostou particularmente do caminho até à Atalaia.

Aqui, já à vista do mar, o ambiente muda. A maresia desafia-nos o olfato e o Atlântico estende-nos o olhar até ao infinito. As falésias atlânticas deixam apenas pequenos vales de acesso às praias, como é o caso da de Porto das Barcas. Agora, é o oceano que domina a paisagem, outro motivo para nos sentarmos em redor dos pratos de peixe e de uma boa conversa.

E a conversa fluiu, quer ao longo da refeição numa sala exclusiva para o grupo, a olharmos as falésias abruptas, quer depois, já na esplanada, qual miradouro, de onde se vêem ao longe as  vagas a estenderem-se vagarosamente no areal da praia. Tudo, sob um sol de manga curta e uma luz que só nós temos.

E, há que regressar. Continuamos nas nacionais até ao Porto Novo. Passamos Santa Rita soalheira, onde andamos ao nível do mar. Avançamos sobre a Praia de Santa Cruz, acompanhando a falésia. Não tarda em chegarmos, de novo, a Torres Vedras.

Depois, a estória deixa de se ser contada. É fazer quilómetros até casa. Mas não só. É também pararmos na última área de serviço da A8, área  de serviço de Loures, para um pequeno balanço da jornada, despedidas e perspectivar novo evento.


Música: America, Ventura Highway



domingo, 27 de dezembro de 2020

Festival Corpo. Dança

 


Manifestação estético-artística, forma de divertimento ou ritual, a dança, relacionada com a religião, a estética e o espectáculo de grandes massas, a dança,  a par do teatro e da música, é uma das artes cénicas que herdámos dos primórdios da cultura. Dança, cultura, arte.

 


A dança utiliza o corpo em movimentos harmoniosos, ritmados, detalhados, estruturados e/ou improvisados, acompanhados ou não de música, a solo, em duo ou em grupo, com origens étnico-folclóricas, cerimoniais, histórico-clássicas e marciais, entre outras. Dança, corpo, movimento.

 


Após oito anos de realização em Sintra, o Festival Corpo, desloca-se para Lisboa. Além da dança, oferece workshops, terapias, exposições de artes plásticas e música ao vivo. Mas é a dança que move este festival que tem o habitual contributo do grupo sintrense Ai!aDança. Desta vez, em Lisboa.

 


9 horas de dança, entre as 10 da manhã e as 7 da tarde. Dança, muita dança. A 9º Edição do Festival Corpo, um Encontro Internacional de Dança. Desta vez em Lisboa, no espaço de jardins junto ao Palácio da Ajuda, com participantes portugueses, da Irlanda, Índia, Havai, Haiti, México, Indonésia. Dança, muita dança.


Trata-se de uma co-produção do Ai!aDança, da Junta de Freguesia da Ajuda, da Câmara Municipal de Lisboa e do próprio Palácio Nacional da Ajuda, que tem como objectivo divulgar e democratizar as artes em geral e a dança em particular. Todas as danças.

 

Em volta do recinto principal, o Festival contou com a presença de mais de três dezenas de artistas plásticos, com obras de escultura, artesanato, fotógrafos de dança, workshops dedicados e relacionados com o corpo, o movimento e a dança. Mais artes.

 

Participaram mais de 2600 bailarinos/as em representação de 111 grupos de dança, entre amadores e profissionais, das áreas do Ballet Clássico, Dança Espanhola, Dança Contemporânea, Jazz, Hip Hop, Dança Oriental, Ritmos Latinos, Dança Popular e Bollywood.


Condensar tantas horas, tantos estilos, tanta variedade de dança em escassos minutos de vídeo, é uma tarefa árdua e pouco retributiva. Fica um exercício que dá conta dessa diversidade em detrimento da qualidade. 


 

domingo, 20 de dezembro de 2020

Agradáveis Momentos de Aikido

 


HOMBU DOJO

Todos os que praticam Aikido, conhecem o Hombu Dojo.

Tal como conhecem outros lugares referenciais de criação, aprendizagem e prática de Aikido.

Em Sakai, Tanabe, Shiratake, Ayabe, Osaka, Ywama, etc.

Sede da Aikikai, em Tóquio, é o órgão centralizador do desenvolvimento e divulgação do Aikido no mundo.


O QUÊ

Na impossibilidade de lá ir numa altura em que alguém lá estava, pedi-lhe que assistisse a uma aula e ma reportasse.

Bem como me informasse sobre o espaço, a logística, etc, para uma eventual visita e prática. 

O que aconteceu foi que, além de toda essa informação escrita, também recebi informação audiovisual.

ÉTICA

Guardei esta informação durante alguns anos, não a divulgando.

Tenho dúvidas e pergunto-me, como toda a gente. 

Antes de produzir este vídeo, perguntei-me sobre a respectiva publicação. 

Achei que não o devia fazer, uma vez que não tinha autorização para tal.

CULTURA

Numa cultura em que a etiqueta é mandatória, não seria polido fazê-lo. 

Seria mesmo uma vergonha que, naquele contexto, se tenta ao máximo evitar. 

Não estando lá, não pertencendo à cultura, apetece aproveitar/divulgar.

Mesmo sabendo que a comunicação actual nos coloca de imediato perante o mundo.

HUMANISMO

Por isso, mas sobretudo porque pensei em todos nós, na comunidade aikidoca: será isto útil para nós/para muitos...?! 

Decidi que seria mais interessante divulgar do que, retendo, a informação/conhecimento ficar na “Caverna de Platão”. 

Mesmo comprometendo a minha ética.

QUEM...?

Um dia, pouco antes de ter viajado para o Japão, perguntei ao nosso director Técnico Internacional, Antoine Vermulen Sensei, que aula de que Sensei me aconselhava a participar na Aikikai de Tóquio. 

A resposta foi elucidativa: “qualquer um, todos são excelentes!”

QUALQUER UM...!

No ano anterior, não tive oportunidade de fazer esta pergunta. 

Quem foi, filmou quem lá estava a dar a aula na altura. 

Disseram-lhe que era o instrutor mais idoso (66 anos) ou o mais antigo instrutor (desde 1973), do Hombu Dojo de Tóquio.

Independentemente disto, a resposta de Antoine Vermulen Sensei estava obviamente correcta.

SEKI SHOJI SHIHAN

E, naquele dia, era Seki Shoji Shihan, 8º Dan, hoje com 70 anos, que lá estava. 

Tendo iniciado a prática de Aikido em 1969, chegou a ser uke do Doshu Kisshomaru Ueshiba. 

Foi admitido como instrutor no Hombu Dojo de Tóquio em 1973, com a graduação de 2º Dan.

Segundo o Aikido Journal, “embora Seki Sensei não seja prolixo em sua explicação, ele repete a técnica que está demonstrando muitas vezes, e é possível captar os pontos delicados de seus movimentos por meio de uma observação cuidadosa”.

 

TÉCNICAS

É verdade. 

Uma parte inicial com “ushiro ryotedori kokuynage” e, depois, a incidência sobre “ushiro ryotedori ikkio”. 

É possível notar alguns dos princípios do Aikido: a utilização da energia (ki), o timing/oportunidade (deai/kikai).

Bem como, o desequilíbrio (kuzushi), o tai sabaki (movimento do corpo) e a criação do vazio (ma).

No final, surge um “ushiro ryotedori kotegaeshi”, também com demonstração repetida por diversas vezes e com movimentos lentos de modo a favorecer a aprendizagem. 

E, quando repete, Seki Shoji Shihan fá-lo também com os respectivos alunos.

Mas, vejam por vós,

Música: Kanpai, Adrian Von Ziegler

https://adrianvonziegler.bandcamp.com/album/the-complete-discography

quinta-feira, 17 de dezembro de 2020

Gravuras de PAULA REGO: Olhar para Dentro

 


“Fazer desenhos desta maneira não é como desenhar o que se vê, pelo prazer de observar o modelo ou de fazer o desenho; (...)” Paula Rego, 1999.

Toda a gente conhece Paula Rego, a pintora das simbólicas figuras femininas, mas não só: dos mundos fantásticos, das imagens agressivas, terríveis e disformes, da inspiração na arte bruta, do espaço cenográfico, das histórias que conta.

“(...) desenhar algo como isto é mais como criar uma história em termos visuais.” PR99

E ainda, das figuras infantis, adultas, animais, ou irreais, dos sinais/traços grotescos e/ou deformados, das situações de sedução e/ou perversidade, das histórias que a pintura e a gravura contam. Desenho, gravura, pintura. Encenação, representação e reinterpretação.

Estamos habituados a gostar do sedutor, do belo, do sedutor, identificando-os como bons. O degradado, aberrante, bizarro, mesmo sendo provocatório, representativo ou simplesmente figurativo, não é agradável nem à vista nem pensamento.

Salvo erro – já foi no ano passado e não fiquei com o título – mas parece-me que a exposição se chamava, Paula Rego: Olhar para Dentro, onde apareciam já as técnicas de gravura e o incremento das narrativas, complementadas pelo desenho e pela pintura.

Aqui, estavam “Dois Macacos”, em tinta da china e “Penteado de Galinha”, em água-forte e água-tinta. Também pegava no tema dos animais. “Três Ratos Cegos”, continuando a série dos contos infantis.

Nesta exposição, Paula Rego aborda um conjunto de temas, ou séries temáticas, que vão desde o aborto, passam pela mutilação genital, pela literatura infantil, pelo romance vitoriano (influência inglesa), filtrados pelas suas vivências pessoais e pelas múltiplas influências artísticas.

Também lá estava, “Quem Matou o Cock Robin?”, outra obra baseada num conto do século XVIII com animais como personagens e não só. Também patente, “A Espada de Cortiça”, retrata uma manifestação crítica relativamente à ditadura de Salazar.

Ao longo do espaço de exposição, mas sobretudo do território figurativo pessoal e tão distinto, é possível entrar em contacto com o olhar da artista sobre figuras históricas, da literatura universal, do teatro e do cinema, criando um universo simbólico que propõe uma reflexão acerca de modelos iconográficos e estéticos contemporâneos.



Outra presença, “Peter Pan”, uma série onde as figuras iconográficas são redesenhadas e a história é reconfigurada levando a um outro universo em que o infantil é subterrâneo, medonho, mágico, e que põe em causa a “ambiguidade de ser criança, entre a inocência e extrema crueldade”.

E, mais. Um conjunto de estampas da série Jane Eyre, um famoso romance de meados do século XIX, “Preparando-se Para o Baile”, “Dançando com o Sr. Rochester” ou “Dentada”, litografias do início do século XXI.

Outro conjunto de figuras, em “Duas Mulheres a Eviserar um Cão” ou “Mulher Cão”, evidencia a mulher e o cão, ou apenas a figura feminina no “Estudo para um Tríptico”.

“E também é um mundo em que vais penetrar: se tens uma pequena chapa de gravura e está sa desenhar nela, o mundo que estás a criar vai da tua cabeça para a chapa; não é olhar para fora, é olhar para dentro, talvez seja de facto como escrever”. PR 99