sexta-feira, 30 de outubro de 2015

Descobrindo o Centro Para o Desconhecido


O evento Open House Lisboa, de Outubro deste ano, contemplou a possibilidade de visita a setenta locais em Lisboa, desta feita subordinado ao tema “arquitectura de portas abertas”. Um dos sítios que podia ser visitado foi o Centro de Investigação para o Desconhecido, em Belém, vulgo Centro Champalimaud.
O exterior assemelha-se a um navio, com as suas múltiplas amuradas, chaminés, vigias, que “navega” à beira do Tejo. Por fora, o conjunto articula-se com o rio e com a margem, mas de lá destacam-se sobretudo as descomunais “vigias” elípticas e aquela espécie de diapasão em pedra virado a poente que parece esperar pelo ocaso para o amarrar ao dia. Porém, segundo o arquitecto que concebeu o projecto, aquelas duas colunas pretendem indicar o "caminho para o desconhecido".
A abordagem face ao espaço exterior - ainda com o projecto em fase de conclusão - está aqui, em http://cordeirus.blogspot.pt/2011/07/centro-para-o-desconhecido.html
O Open House tem a particularidade de possibilitar, para além de mostrar lugares habitualmente vedados ao público na maior parte dos casos, uma visita guiada por quem, de alguma maneira, está familiarizado com os espaços onde regularmente se move.
Nesse sentido, do ponto de vista informativo, o começo da visita elucidou-nos em detalhe sobre os antecedentes e sobretudo acerca dos objectivos da Fundação Champalimaud, que passam pela investigação em neurociências, oncologia e biomedicina, para além de apoios financeiros a projectos na área da oftalmologia um pouco por todo o mundo.
O breafing efectuado no átrio junto de uma maqueta do complexo feita em Lego foi sobre essa matéria, completado com o historial da Fundação e a perspectiva do que iríamos ver. Se por acaso ainda não tivesse sido notado, perante a maqueta é fácil identificar um corpo principal do complexo, mais operacional  dedicado ao estudo, investigação, intervenção e tratamento, e um outro , estilo satélite, com funções de apoio.
Se do lado exterior se adivinham grandes e espaçosos e se antecipa que os jardins são frondosos, melhor se acham quando os vemos de uma plataforma superior no átrio de entrada. Lá, o espaço ajardinado é uma espécie de floresta tropical. Verifica-se, porém, que é fechado ao exterior.
A explicação decorre do objectivo do espaço, destinando-se sobretudo aos doentes em recuperação sujeitos a tratamentos invasivos e habitualmente dolorosos (quimioterapia), para os quais o recato e/ou a tranquilidade é requerida.
E se o piso térreo está dedicado a recuperações ou estudos, o piso imediatamente superior está dedicado à intervenção, quer prática, quer de investigação. Aqui, a organização dos espaços também contemplou o horizonte exterior.
A compartimentação está por todo o edifício. A comunicação entre a zona de investigação e os gabinetes de coordenação, por exemplo, é garantida por corredores curtos, mas que asseguram a separação pretendida entre as duas áreas.
A zona de intervenção operacional ocupa outras dependências, contudo situadas perto da investigação, de modo que o contacto e a interacção possam ser praticamente imediatos, além de permitir também o contacto visual com o exterior.
Assim que voltamos ao piso inferior e entramos na zona de tratamento, as cores, as dimensões e a organização do espaço muda. As cores são mais ténues, as dimensões reduzem-se e individualizam-se, os espaços comuns diminuem, a luz circunscreve-se e o campo de visão para o exterior fica mais limitado.
No outro corpo do edifício encontramos os espaços de apoio: a restauração, o auditório, salas de reunião e um espaço de exposições. Visitamos o auditório. Notória, é a ampla janela elíptica que domina o anfiteatro cujo declive é assinalável, o que permite assegurar que de praticamente todos os lugares se tenha uma visão completa do resto do espaço mas sobretudo do palco.
Notável é também ao panorama que se vislumbra através da janela, quer para a entrada do Tejo, quer para a Torre de Belém. O vidro, também ele imenso, foi trazido em partes e “colado” numa operação protegida.
No exterior, o espaço foi deixado para as pessoas poderem ter diversas perspectivas, quer do complexo, quer do rio, quer das margens. Com simples elementos arquitectónicos e/ou decorativos, é fácil olharmos para a foz do Tejo balizados por duas colunas esguias ou contemplar o leito rio a partir de um pequeno lago.
Ou espreitar o passar dos barcos entre os pinheiros, mesmo estando circundados por muros de mármore roseados a circunscrever áreas que se pretendem distintas e/ou relativamente privadas, como seja o caso do anfiteatro exterior e da área de restauração.
Mas também é possível vigiar a Trafaria através de uma janela aberta num muro (do auditório exterior), observar o bebedouro sistemático das gaivotas, varrer o Tejo com um olhar lento e detalhado ou descansar na relva fronteira à fachada do edifício principal.
Ou ainda vaguear entre espaços abertos e luminosos, ajardinados ou não que circundam o complexo, errando entre o miradouro e o anfiteatro, ou entre o jardim fronteiro e o lago, quer perscrutando o rio, quer divisando a zona urbanizada. 
Interior e exterior articulam-se de forma serena e harmoniosa. Lá dentro, é mais notória a tranquilidade nas cores, nas dimensões, nas texturas, na luz, na orientação espacial. Propósitos e ambientes parecem estar especialmente bem relacionados.

Música: Craig Chaquico e Russ Freeman, Sweetwater
 

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