É velhito: já lá vão 268 anos desde a inauguração, em finais do século
XVIII! O destaque vai a Pedra de Roseta e para os frisos do Partenon de Atenas.
É verdade, são exemplares únicos. Porém, o Museu Britânico encerra um conjunto
de documentos e objectos que guardam muitas épocas marcantes de história e de cultura
humana. É como olhar o mundo todo, não o de hoje, mas o de várias Idades anteriores, algumas sobrepostas, outras tão longínquas quanto cativantes,
relevantes ou intrigantes.
Apesar de clássico, o Museu Britânico foi o primeiro grande museu público com
acesso gratuito, secular e nacional em todo o mundo. Apesar de ter sido
inicialmente “pouco mais do que um enorme amontoado de objetos sem nenhuma
classificação ordenada”, já encerrava um importante acervo de “antiguidades
clássicas e medievais, moedas, manuscritos, livros, quadros e gravuras”.
POR ALI FORA
Em frente da fachada, dir-se-ia estarmos perante um edifício da antiguidade
grega. No átrio interior, o espaço abre acesso à biblioteca (não acessível,
nesta altura) e às galerias de exposição. É aqui que começa o mundo, da
estatuária grega, das ilhas do Pacífico, das louças chinesas, das divindades indianas,
das casas tradicionais japonesas, dos budas coreanos, das múmias egípcias, da
escrita babilónica, dos azulejos árabes, das peças saxónicas. Um mundo!
Tal como muitos do museus que detêm um acervo de grande quantidade – e,
este, possui cerca de 7 milhões de objectos – a maioria destes está confinada
ao arquivo. Apesar da mostra estar compartimentada, aquilo a que já chamei
organizado por “caixinhas”, não deixa de ser uma configuração pedagógica, já
que organiza a exibição por áreas geográficas, por relevância histórica e estética.
Mesmo num périplo ao sabor da escolha ou da proximidade de nova galeria,
não é difícil fixar os olhos num ou noutro objecto, varrer com o olhar toda uma
galeria, ler uma inscrição ou uma legenda, rodear demoradamente uma peça,
sentarmo-nos para deleitar o pensamento com (mais) um objecto histórico,
etnográfico ou estético. Foi o que fizemos naquela manhã, no Museu Britânico,
DAS ILHAS
Os ingleses também por lá passaram. Em algumas, nas
maiores, até muitos ficaram definitivamente. A etnologia das comunidades das
ilhas, sobretudo das do Pacífico, por onde os navegadores ingleses andaram,
nunca deixam de surpreender os forasteiros. Foi por ali que começamos o périplo
mundial, pelas comunidades das longínquas Ilhas do Pacífico, nos antípodas de
Portugal.
A ênfase vai para os padrões estéticos ligados à
natureza, quer no vestuário, quer na arquitectura, quer nos simples
objectos decorativos. Aqui, os objectos artísticos de materiais naturais têm
uma alma própria, contemplando ainda o poder e o prestígio do respectivo
criador. A obra personifica-se com a extensão do artista.
Na área central da galeria, um Moai representa o
povo Rapanui, que construiu quase 900 destas estátuas gigantescas, erguidas
como homenagem aos seus líderes já falecidos. Estão espalhadas pela ilha,
cada uma pesa mais de uma tonelada, sendo que algumas pesam 20 e a maior tem
quase 20 metros de altura.
DA ÁSIA
Os jades, as fianças e a estatuária, com os deuses sempre presentes, incluindo muitos Budas. O touro Nandi, por exemplo, presente à entrada de todos os templos dedicados ao deus Shiva, é considerado como seu sentinela, “simboliza a força, a virilidade e a fertilidade, bem como os deveres morais e religiosos”.
Na maior galeria dedicada à Ásia, há muitos elementos
budistas. Budas, muitos Budas, alguns Bodisatva – aspirantes para alcançar
o mesmo estatuto de Buda – alguns Lokapala – protectores das quatro direcções
do universo. Realce também para o vestuário de soldados e a para as incontornáveis porcelanas chinesas.
O edifício hindu está representado pelos deuses. Hanuman,
o deus-macaco é uma personagem proeminente na saga Ramayana – que conta a
epopeia do príncipe Rama. No documento épico,
Hanuman é uma encarnação do deus Shiva que irá auxiliar o príncipe a derrotar o
rei-demónio Laka.
Mais à frente, é uma representação de Harihara, uma combinação de Vishnu, conhecido como "Preservador", e de Shiva, chamado "Destruidor", ambos fazendo parte da trindade de divindades do hinduísmo, aqui representados como “diferentes aspectos da mesma Realidade Suprema chamada Brahman”..
ROMA E ANTIGO EGIPTO
Por mais clássica que seja a Antiguidade e que as peças em exposição sejam semelhantes a uma ou outra que já tenhamos visto em outros museus, há sempre algo de novo – o que não deixa de ser paradoxal face à Antiguidade – há sempre algo que surpreende pela raridade, pela dimensão, pela história associada.
Porém, o mais espantoso não estava ali. A tal dimensão, a tal monumentalidade, não está nas galerias. É preciso entrar nos salões de exposição. Aí, a imaginação torna-se realidade. As peças transportam-nos para aquele tempo, para aquela dimensão, um tempo em que, naquele momento, pensamos lá estar.
É esse o caso da galeria Egípcia. Há dezenas de sarcófagos, miniaturas de barcos do Nilo, arcas funerárias, animais mumificados, estelas decorativas, múmias, escrita hieroglífica, ofertas aos mortos, painéis ilustrativos com episódios históricos, estátuas de deuses, As cores sobressaem, espanta a qualidade e o estado de conservação.
Os painéis decorativos e representativos de cenas
históricas ou do quotidiano repetem-se. Um deles, encontrado numa extensa
parede de um túmulo, revela uma espécie de banquete em honra do casamento de
Nebamun, com criadas nuas, pares de convidados sentados em cadeiras de
luxo, num cenário erótico e de relaxe, que devia acompanhar este privilegiado "escriba
e contador de grãos oficial" na sua eternidade.
Um dos tesouros aqui guardados é a Biblioteca de Assurbanípal, originário da século VII a.C., também conhecida por Biblioteca de Nínive, composta por milhares de placas de argila, com textos em escrita cuneiforme, que inclui a Epopeia de Gilgamés, um conjunto de lendas e poemas sobre o mitológico deus.
Entramos no mundo mesopotâmico com a Rainha da Noite,
1800-1750 a.C, uma antiga deusa ligada aos cultos de fertilidade e fecundidade
(possivelmente Istar), passamos pelo vestuário nobre feminino encontrado sob
escombros, por um guerreiro assírio, e voltamos à divindade “saindo” pelo Portão
de Istar guardado pelo Leão da deusa.
Roma também está bem representada, com o túmulo
monumental de Gaius Julius Alpinus Classicianus, membro da aristocracia e
procurador financeiro da Roma Britânica, nomeado em 61 d.C., personagem
importante na política local. O túmulo, tal como outros, incluem a menção “dis
manibus”, ou seja, “dedicado aos deuses manes”.
Avançamos pela Baixa Idade Média ao longo de uma galeria
de elmos, entre os quais se destaca uma réplica do anglo-saxão Sutton Ho,
encontrado num cemitério século VII, que junta elementos estáticos germânicos,
escandinavos e ainda romanos. Tem sido considerado como um dos mais importantes
artefactos anglo-saxão conhecido.
A visita começa a parecer enciclopédica. Terminámos o périplo pelas galerias e, o que fica, é muito menos do que o que gravámos e do que o que vimos. É impossível levar tudo o que queremos, pegar em tudo o que vimos, um cansaço mostrar tudo isso. Por tal, deixámos o acervo monumental para outra abordagem.
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