Trepámos a rampa do estacionamento do hotel em Sevilha e deixámos o Dom Paco às primeiras horas da manhã.
É daquelas garagens cujo acesso é feito através de uma rampa
íngreme que obriga, à saída, alguém lá
fora a avisar se há pessoas a passar.
A saída de Sevilha não foi complicada.
Resume-se a encontrar a avenida de Kansas City.
A partir daí é sempre a direito.
O sol já despontava, quentinho, como é seu apanágio quando se estende pela Andaluzia.
Destino: Córdoba!
UM CAFÉ EM CARMONA
Até Córdoba não é mais de hora e meia.
Porém, temos uma paragem programada a cerca de trinta quilómetros, onde fica Carmona.
São cerca de vinte minutos até ao Parador, no Alcazar del Rey Dom Pedro.
É lá que vamos beber um café no bar.
Está calor, como é habitual.
O acesso através da entrada norte não é muito fácil e obriga a trepar por ruas estreitas.
Estacionamos na praça de armas, sobre um piso de paralelepípedos cujo peso dos anos já tornou tão irregular como uma picada.
Mas até há lugares exclusivamente dedicados às motos.
Entrámos através de um pátio amplo cercado por salões.
O bar fica numa das extremidades do edifício, antiga fortaleza árabe do século XIV, que ocupa a parte mais alta da cidade.
Oferece um horizonte espectacular desde a longa
varanda virada para a paisagem campestre.
PELO CENTRO DE CÓRDOBA
Depois de uma hora de caminho pela A4 espanhola, uma via rápida gratuita que liga Sevilha a Córdoba, foi difícil dar com o NH Cordoba Califa.
Embora fique perto dos Jardines de la Victoria, a entrada faz-se por
uma rua secundária que os GPS não identificam facilmente.
Dali ao centro é pertinho, não chega a uma dezena de minutos, a pé, até à famosa Mesquita.
Aliás, é a pé que se descobre o centro histórico de Córdoba.
Lá iríamos, passados trinta e seis anos desde a última visita, também de moto, num Verão com temperaturas elevadas.
Um quilómetro quadrado.
Aqui tudo fica perto.
Dentro de um quilómetro
quadrado é possível visitar a Sinagoga, o Museu Taurino e a Mesquita, entrar no
Patio de los Naranjos (jardim da mesquita), no Alcazar, passar pelo Arco do
Triunfo e atravessar a ponte romana.
A cor dos objectos contrasta com a brancura das fachadas.
As milhentas lojas do centro histórico dão um cunho alegre e luminoso ao ambiente, sejam elas quais forem e vendam o que venderem.
Chás, recordações, decoração, restauração, a maioria das lojas evidencia cor e diversidade.
MESQUITA
E chegamos à Mesquita.
Desta vez, havíamos comprado os bilhetes de manhã, uma vez que há uma década quisemos visitá-la e era necessário comprar as entradas com três dias de antecedência.
Desta vez, nem
sequer havia fila para comprar nem para
entrar.
Almoçámos tranquilamente e entrámos na mesquita à hora da digestão.
Já esteve ali uma igreja visigoda, antes do emir omíada de Córdoba ter mandado construir a mesquita.
Para além de espaço de culto visigodo, o edifício
mostra ainda hoje sobretudo a presença de cristãos e muçulmanos.
A dominar o Pátio das Laranjeiras – diz-se que foram
plantadas só a partir do século XVIII – além das três fontes destinadas às
abluções, (lavagem ritual antes da oração muçulmana), está o antigo minarete,
hoje Torre do Campanário, coberta de elementos barrocos.
Entrando, o contraste arquitectónico está em linha com a diferença religiosa.
As 1300 colunas de mármore de várias épocas e os 365 arcos de ferradura são um ex-libris arquitectónico da mesquita.
Além dessas
notoriedades, trata-se da única mesquita do mundo que possui uma catedral no
interior.
O salão de oração, ornamentada por todas aquelas colunas e arcos, mas sobretudo a decoração bicolor dos arcos, é a parte mais atractiva do espaço interior.
A luz que entra neste espaço é também especial, conseguindo
iluminar, sem ofuscar, o esplendor da colunata.
A catedral cristã é do segundo quartel do século XIII.
Posteriormente, foi sendo modificada com a construção de pequenas capelas e abóbadas, sendo uma dedicada a Santo António que, aqui, também é referido como de Pádua.
Mais tarde, construiu-se a Capela Real para acolher os restos mortais
dos reis cristãos.
A dimensão da catedral é notória, mas há que destacar o altar de mármore vermelho, o órgão de parede, e o coro barroco cujo conjunto de cadeiras em madeira quase negra contrasta com os restantes elementos decorativos vizinhos.
Talvez seja mesmo a mistura de estilos, omíada, gótico,
plateresco (renascentista espanhol) e barroco, que tornam este espaço além de
único, suficientemente atractivo para ser um dos locais mais visitados de
Espanha e o mais famoso de Córdoba.
Apesar do exterior parecer estar sempre em obras –
estarão sempre em processo de recuperação - no interior a profusão de lápides
fundacionais e funerárias, altares, pedras tumulares, túmulos, aras, painéis,
quadros, frisos, pequenas esculturas, compensa a aridez do espaço de colunata.
Tal como na maioria dos templos, a tranquilidade, a
dimensão, os elementos decorativos e, até, a temperatura amena que se faz
sentir no interior, tornam a Mesquita de Córdoba num lugar de imprescindível
visita. Mesmo que seja no espaço-tempo de uma geração.
OUTROS LUGARES
Com a tarde a trepar, avançámos também para um pequeno périplo pela periferia do centro histórico.
Por isso, deambulámos pelas ruelas exclusivas
para pedestres, pejadas de todo o tipo de lojas, mas sobretudo daquelas
destinadas a turistas.
Numa delas, quase se diria que os espanhóis não precisam de Fátima... a sacralização da família pode fazer-se simplesmente através do futebol e da regionalidade.
Talvez seja a tal diversidade religiosa patente na mesquita um
suporte interessante para este tipo de representação...
PLAZA MAYOR
Nunca tinha ido à Plaza Mayor de Córdoba. Não tão propagandeada como a sua
congénere madrilena, mais recente e funcional, não foge dos traços de repetição
por superfície típicos das fachadas da maioria destas praças. É a única praça
quadrangular da Andaluz.
A Plaza de la Corredora, nome que lhe vem da actividade taurina, com corridas de touros que terminaram em meados do século XIX.
Hoje, os únicos
edifícios históricos da Plaza de la Corredora são a antiga Câmara Municipal e
prisão, bem como as chamadas “Casas de Doña María Jacinto”, construídas no século
XVI .
Em redor da praça, ao longo das galerias, estão sediadas empresas, lojas,
cafés e restaurantes. Próximo destes últimos, há esplanadas extensas, mas que
parecem não atrair muitos turistas, pelo menos em dias quentes de Verão como o
de hoje. Deixamos a praça pelo Arco Alto e vamos a caminho do
MUSEU ARQUEOLÓGICO
Metemo-nos pela Judiaria e acabamos a tarde, por acaso, no Palácio dos Paez Castillejo, um edifício do século XVI em restauro.
No
pátio, descobrimos algumas peças arqueológicas que pertencem ao Museu
Arqueológico de Córdoba.
Com o interior já fechado, ficámos pelo pátio onde, porém, o acervo já mostra muitos vestígios romanos, visigodos, mudejares e islâmicos.
Também fechado, já estava o edifício contíguo, onde é possível
observar as ruínas das arquibancadas e cenário parcial do teatro romano de
Córdoba.
Por tal, ficámos pelo pátio e fomos andando ao saber do alinhamento dos diversos estilos de capitéis.
Mais à frente, conjuntos de
mosaicos romanos, um arco mudejar em gesso e um grupo de colunas que circundam
um pequeno lago.
FLAMENCO
Não era a primeira vez que assistíamos ao vivo a um espectáculo de flamenco.
Há 36 anos, aconteceu o mesmo ao jantar, de surpresa, numa espécie de flamenco vadio com dançarinos e cantores que andam de sítio em sítio.
Desta vez, reservamos mesa para tal.
Reunimos duas tipicidades e aliámos uma refeição cordobesa ao espectáculo de flamenco. Tal como o nosso fandango, os dançarinos não precisam de muito espaço.
Um palco pequeno, uma localização visível para o piso
térreo e para o primeiro andar do restaurante, é suficiente para que todos passemos
uma noite divertida.
Como habitual, deixámos um conjunto de sítios para
visitar da próxima vez: uma quantidade de casas-museu, os banhos árabes, o
templo romano, o Alcazar, a torre de Guadalcabrillas, o Molino de la Alegria,
bem como a visita a Medina Azahara.
ZAFRA
Até Elvas, é uma manhã de viagem. Quase 300 kms em estradas nacionais.
Por isso, uma paragem a meio caminho seria ideal.
O tal café de meio da manhã. Ficou para Zafra, 200 kms a seguir a Córdoba.
Há pouco trânsito e o calor mantém-se.
O Palácio dos Duques de Feria, uma fortaleza do segundo quartel do século XV, alberga hoje o Parador de Zafra.
Motos estacionadas no parque fronteiro, passo lesto para nos abrigarmos do sol que já aquecia o final da manhã, eis-nos no pátio renascentista.
Neste dia, o pátio era cenário de uma demonstração da arte de pelejar com armas, muitas delas de origem medieval, mas também assistimos a uma demonstração de esgrima com floretes, que incluía os dispositivos electrónicos de toque utilizados nas provas desportivas.
Bebemos café no bar mas foi no pátio que mais se destacaram as ferragens, arcos, artesanatos e outros elementos decorativos pertencentes ao antigo palácio.
Saimos, julgávamos, para chegar atempo do almoço em Elvas.
Porém, o
dia feriado havia limitado as vagas...
ELVAS
Almoçamos no Grémio, um dos poucos restaurantes que tinham vaga antes das 3 da tarde... situado em plena Praça da República, mesmo ao lado da Casa da Cultura.
As motos ficaram no largo, junto de um grupo de carros clássicos que também
haviam aproveitado os feriados de Junho.
Foram pouco mais de mil quilómetros – com passagem por Aracena, Sevilha e Carmona, percorridos durante quatro dias, feitos devagar, com etapas curtas e suaves.
A mais longa foi a última, a única que ultrapassou os duzentos
quilómetros, a ligar Elvas à capital.
Música: Paco de Lucia, Entre Dos Aguas
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