sábado, 9 de agosto de 2014

A "Escola"




Podíamos ser mais. Mais dois ou três. Desta vez, porém, éramos cinco mais um. Cinco amigos de escola, de liceu, das motos. O núcleo duro, digamos. Conhecemo-nos nos anos 60, mas a maioria nos anos 70. Passámos muito tempo juntos, sobretudo em viagem,  a viajar de moto. Há mais, mas duas dessas viagens são relativamente recentes no blog. Uma delas, está aqui . http://cordeirus.blogspot.pt/2011/11/cb-750-tour-mediterraneo-ii-1983.html. A outra, aqui http://cordeirus.blogspot.pt/2012/10/cb-750-tour-mediterraneo-i-1981.html

O "um", do "cinco mais um", é um estrangeiro, amigo das motos, já dos anos 80. Nunca viajamos juntos, mas já fizemos muitos quilómetros por cá e por lá. Por isso, ele tem cá uma moto. É nosso amigo de longa data. Uma estória a contar. 
Aproveitamos um dia de Verão, céu azul, calor quanto baste, para andarmos de moto. Só os rapazes. Deixamos as mulheres em casa, mas prometemos regressar a tempo de jantarmos todos juntos. Porquê ir? Sobretudo para partilhar as mesmices que nos juntaram primeiramente e continuarão a juntar. 
A rapaziada da escola é como a noite ou o dia, a chuva ou o calor. Podem não estar sempre presentes, mas são para sempre. Quando estamos juntos, abrimos constantemente álbuns de recordações, como se esses ficheiros de memória fossem o GPS da nossa existência. Repisamos cenas, elegemos ocasiões, puxamos pelas mais notórias,  insistimos nas mais recônditas quando falha algum detalhe. Juntamo-nos recentemente mais organizados. Temos agenda, marcamos datas e horas, e aparecemos todos. E somos responáveis à vez. Parecemos profissionais. Ganhamos ordem mas desperdiçamos alguma voluntariedade. Como se fosse preciso…
O jeito português é não estar a horas. Porque há sempre algo no processo que falha, porque “fica bem” ou porque há sempre alguma coisa para fazer. Estando a tempo, parece que não temos mais nada que fazer. Ou pode ainda ninguém ter chegado. Embora tenhamos chegado mais tarde – o “outro” (que já sabe como os portugueses funcionam) também precisou de fazer algo em cima da hora – tínhamos margem para cumprir o resto do programa. A ideia inicial era ir beber um copo a Alcácer – tarefa que ficou de parte – para saciar o apetite. Só depois rumaríamos à “Escola”. Sairíamos por Troia, de barco.
Imprescindível era ir de moto. Além da amizade que nos une desde o tempo de escola/liceu, as motos foram um elemento que reforçou essa estima. Mas uma delas não quis trabalhar e a outra há anos que não trabalha. Daí terem aparecido dois penduras para três motos, uma XX (sport), uma STX (touring), uma XRJ (naked). E ainda uma XT (trail), do nosso amigo holandês. As duas primeiras têm mais de 10 anos. A XJR não sei se já tinha quinhentos quilómetros percorridos. A XT é dos anos 80. É caso para dizer ser estranha a diferença que nos une...
Deixámos a A2 na Marateca e entramos no IC1. O piso está bera, mas faz-se. Pouco trânsito, um ou outro carro para ultrapassar, raros camiões, escassas motos. Chegámos a Alcácer com o sol a iluminar o castelo e as voltas do Sado, já perto da uma da tarde. Metemos rumo à Comporta e a meio caminho virámos para a “Escola”. Tínhamos feito cerca de 120 quilómetros. Os últimos já envolvidos pelo aroma fresco dos pinheiros.
Vamos à “Escola” há anos, há mais de trinta. Mas também fazemos intervalos valentes. Passávamos por lá quando vínhamos do Algarve ou ficávamos alojados em Troia. Há anos, não era preciso reservar. Agora é necessário, sobretudo no Verão e ao fim de semana. A fila à entrada é um alerta importante. Por duas ou três vezes, fomos obrigados s recorrer a Alcácer ou a Troia, ou mesmo a casa, para almoçar ou jantar. Desta vez, estava tudo previsto. Até o atraso à partida, que resultou num achegada à tabela.
O restaurante está na mesma... o ambiente e a ementa não têm mudado. http://restauranteaescola.pai.pt/. Malta nova - muitos deles da nossa idade J – famílias, habitués. O proprietário que também orienta a cozinha e algumas empregadas são os mesmos. O parque de estacionamento também não mudou. Aliás, tudo está na mesma, sobretudo os sabores que continuam a surpreender. Ah, o vinho branco da casa, mudou. Para melhor. Partilhámos, pelo menos, enguias, coelho bravo e salvo erro chocos.

Ainda lá está o quadro em ardósia, as janelas continuam a abrir o “recreio”, as pequenas casas de banho cumprem a sua função. Registamos a ocasião à porta e à mesa. À porta, nota-se que o único vestido para a ocasião foi o Ivo que não prescindiu dos calções. À mesa, a conversa não deixou melhor ângulo, mas ainda possibilitou conhecermos os vizinhos, da mesa contígua, um arquitecto que já havia estagiado em Breda – próximo da morada do nosso amigo holandês em Maastricht – casado com uma italiana e em cuja mesa estava uma iraniana. Um pote de nacionalidades, uma mistura de culturas. E, nisso, como bem dizia o arquitecto, nós exageramos.
Saímos com a sensação do dever cumprido. Percorremos os 50 metros de terra batida até ao asfalto e seguimos para a Comporta. Continuava um tempo quente a estimular um mergulho. Por isso, o parque de estacionamento da praia da Comporta estava a romper pelas costuras. A estrada para Troia não tinha muita gente e só havia alguns carros parados nas bermas onde a praia está perto. Daí a pouco entrávamos no (já não novo) cais com acesso logo a seguir à urbanização Sol Troia.
Esperámos cerca de dez minutos pelo barco, entrámos e arrumamos de lado, junto de mais duas ou três motos. A travessia é rápida e a saída do barco também. Depois, foi optar pela auto-estrada rumo à ponte sobre o Tejo. Andámos sempre em velocidades de passeio e nunca ultrapassámos os 120 km/h, quer para podermos apreciar o sossego da paisagem, quer para não puxar pela XT nem seduzir a neófita XJR. À vista de Lisboa, a ponte já levava muita gente. Não era tarde e neste domingo a fila estava quase na subida para a portagem. Ao entrar na ponte, percebe-se de imediato que Lisboa dava o rosto ao sol como é habitual. E, como é costume, nós seguimos o sol. Aliás, "nous sommes du soleil"!


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