sexta-feira, 22 de junho de 2018

Buddha Eden, Areia Branca e Ericeira.


 


Último dia de Maio. Nesta Primavera sinusoidal, há que aproveitar o (melhor) tempo para andar. Para passear de moto. Aliamos o passeio de moto à arte esculpida, esta à arte gastronómica, esta ao passeio pedestre. A cada intervalo, andamos de moto. E temos o sábado preenchido, recheado de muito do que mais gostamos.


O Buddha Eden é um parque temático com conteúdos asiáticos, sobretudo relacionados com o budismo e o hinduísmo, iniciativa de Joe Berardo, que alia o espaço agrícola onde produz vinho, ao espaço de passeio e contemplação. Embora o tenhamos visitado há pouco tempo com o Clube Paneuropean, desta feita, fomos com amigos mais antigos.




















O espaço de estacionamento continua com aquela gravilha rala que, chovendo empapa, estando seco se empoeira. Embora ameaçasse chover, só à saída caiu um pequeno aguaceiro, que nem sequer nos molhou. Durante a visita o céu esteve sempre cinzento.


O EXÉRCITO DO IMPERADOR



Entramos nos cerca de 40 hectares do intitulado maior jardim oriental da Europa. Logo após a bilheteira o acesso principal ao jardim faz-se através da reprodução do pórtico de um templo chinês. É também o caminho mais próximo do lago dos pagodes. Das margens do lago, percebem-se imediatamente na colina uma longa fila de estátuas de soldados. Representam os exércitos do primeiro imperador da China, Qin Shi Huang. 


As estátuas originais foram enterradas junto do túmulo do imperador, com o objectivo de o proteger na sua vida após a morte. Estes soldados, agora pintados de um azul fortíssimo, é parte do exército do jardim. Mais abaixo, depois da escadaria dos budas, numa plataforma inferior, estão formados mais umas centenas de soldados deste exército póstumo. Curiosamente, na mesma altura, cerca de 200 a.C., no Egipto, já não vigoravam tais ideias, cujos faraós chegaram a cultivar concepções semelhantes.


JARDIM DOS BUDAS







São os budas dourados que dominam a colina central do jardim. O Buddha deitado, com cerca de 15 metros de comprimento, está a meia-encosta, e é a mais evidente estátua de todo o jardim. Diz-se que estão no recinto 6 mil toneladas de estátuas. 700 pertencem ao exército  do imperador. A grande escadaria central está “guardada” por um conjunto de Budas, que partilham uma expressão simpática e um sorriso enigmático, parecendo amáveis anfitriões da colina. Uns estão enterrados e só a cabeça se lhes vê. Outros, de tão plácidos ares, não se lhes descobre nada, além daquele semblante de aparente contemplação. 










Mesmo as estátuas erectas da divindade, conservam um ar tranquilo, auxiliando os visitantes a ultrapassar o desconforto da escadaria. Talvez estejam ali, com aquela expressão carinhosa e motivadora, mesmo para ajudar os visitantes a subir. Embora exista um pequeno comboio que percorre as ruas principais do jardim, muitos querem subir a colina a caminho do topo. De lá, a vista alcança meio-jardim, incluindo o lado do pagode e a zona das esculturas.










O périplo de comboio dá uma boa ideia da dimensão do parque, da diversidade da orografia, da multiplicidade de jardins, da variedade de espécies vegetais, da quantidade de esculturas e estátuas, bem como das diversas perspectiva face ao lago ou às variadas colinas.

SOB O SIGNO DA ESCULTURA

Perto da entrada, a parte nova, dá relevo à(s) escultura(s). Há obras de Joana Vasconcelos, Alexander Calder, Breuer-Veil ou Fernando Botero. São mais de 200 esculturas, substituídas pontualmente, envolvidas por um milhar de palmeiras.
 
Tal como outros jardins, onde a estatuária está em evidência – Jardins Gulbenkian (Lisboa), Serralves (Porto), Parque dos Poetas (Oeiras) ou, até mesmo, Parque salgueiro Maia (Massamá) – o espaço parece uma galeria de esculturas a céu aberto.

Os materiais vão da pedra ao metal, passando pela madeira. A maioria das esculturas contempla a figura humana ou os animais. Mas é possível admirar esculturas produzidas com peças de engrenagens industriais, como fossem duas cadeiras, colocadas em posição estratégica numa das colinas. 


Apesar do sobe-e-desce, que o deambular pelas colinas obriga, o piso é adequado ao andar. O ambiente arbóreo empresta alguma frescura ao espaço e alguns bancos permitem uma paragem para descanso, meditação e/ou observação.


Nesta altura, pareceu-me que o mais número de esculturas da zona nova, seria o de arte africana ou, pelo menos, os respectivos temas. O que contrasta com os temas asiáticos e, talvez por isso, ocupem espaços diferentes.


Ainda não descobri se existe algum sentido e/ou configuração filosófica, sobretudo na aparência da parte asiática do jardim. Fosse japonês, tê-lo-ia certamente, dispostas na maneira como as pedras estivessem dispostas ou a terra fosse distribuída.


AREIA BRANCA





Aquela chuvinha molha-tolos acompanhou-nos, desde a saída do Buddha Eden, até perto de Peniche, curiosamente, o único lugar iluminado pelo sol, em toda a extensão do horizonte. A verdade é que, em redor, o céu estava ameaçadoramente negro de chuva.


Mas, quando chegámos ao estacionamento da Praia da Areia Branca, a estrada já secara. Parámos junto à praia, agora também iluminada pelo sol. À uma da tarde, estavamos sentado no restaurante Foz, previa e felizmente reservado.


Ficamos numa mesa redonda, com vista de mar e excelente para trocarmos ideias e fazermos escolhas. Por tal, passamos em revista anseios e propostas de outros passeios e viagens. O próximo ficou desde logo marcado para o fim de Junho, no Algarve.


Sugeriram-nos uma mariscada de polvo. Anuímos em boa hora. A qualidade e tempero superaram as nossas expectativas. Optámos por vinho branco da casa, da região, e sangria, que se foram acompanhando a maciez do polvo e o sabor apurado dos camarões.  


Fora, o sol havia-se imposto definitivamente. O céu mostrava agora aquele azul Atlântico e um contraste entusiasmante com as nuvens mais escuras que ainda não se haviam esfumado. Foi assim ao longo da costa, até à Ericeira.


ONDE O MAR É MAIS AZUL



Tal como o céu, também o mar estava tranquilo. O tempo pactuara connosco e a estrada saloia levou-nos à Ericeira em bom piso e com pouco trânsito. Embora houvesse bastante gente no centro da vila, muitos não devem ter acreditado que o tempo melhoraria para a tarde.


Deixámos as motos no estacionamento próximo da Capela de S. Sebastião e fizemos um passeio pedestre pela marginal, passamos pela praia dos Pescadores e ficámos pela Praça da República, à procura de “ouriços”, um bolo tradicional da terra.


Diz-se mesmo que o nome ancestral da Ericeira seria Ouriceira. Não decorrente da existência do bolo, mas sim por ser terra de ouriços, de ouriços-do-mar. Ainda hoje, o ouriço-do-mar, confecionado de diversas maneiras, é prato típico da gastronomia da Ericeira.


Deambulamos entre as antigas casas de pescadores, hoje quase todas recuperadas, muitas delas já “alojamentos locais”. Cerca de um quilómetro separa a Capela da Praça. Anda-se por cima de desconfortáveis paralelepípedos mas, em 15 minutos, fazemos meia Ericeira.


Com o fim de tarde a aproximar-se, despedimo-nos no parque de estacionamento, ainda paramos para um reabastecimento tardio e optámos pela auto-estrada para o regresso a casa. Faltam menos de um mês para voltarmos às “nacionais”, para passear de moto.




quarta-feira, 13 de junho de 2018

Blankenberge 2018, Aikido no Mar do Norte



 
Não foi uma estreia em terras belgas.
Porém, nunca havia estado em Bruxelas nem em Blankenberge.
Desta feita, na primeira, não fui além do aeroporto.
Na segunda, todavia, passei três dias.
Móbil: participar num estágio internacional de Aikido, o primeiro fora de Portugal.

E descobrir o sítio onde a realeza europeia já foi feliz.


Indo de carro, Blankenberge fica a cerca de 2 mil quilómetros e 18 horas de minha casa. É longe.
De avião são pouco mais de 2 horas de caminho. Parece perto. Quando não há atrasos. 
Porque, nesta oportunidade, somaram uma boa meia hora na ida. 
E mais de uma hora no regresso.
Atrasos, porém, sobretudo por sermos portugueses, dir-se-ia estarem na nossa natureza. 
Já não estranhamos. 
É um detalhe que manipulamos com facilidade. 
A demora mói mas não morde. 
O fito é a viagem. E o estágio. 
Ambos valeram tal pena.
Acordar às 4, sair meia hora depois, para estar no aeroporto às 5. 
Descolaríamos às 7 e meia da manhã. 
Por volta das 11 locais, estávamos em Bruxelas. 
No entanto, a entrega da carrinha alugada demorou mais de uma hora. 
Um problema numa roda/pneu, disseram.

Almoçámos lá, num restaurante de comida rápida. 
Saímos finalmente para a auto-estrada, que liga a capital belga a Blankenberg, 
com alguns troços em obras. 
Quando chegámos ao local de estágio, os participantes belgas já rumavam ao pavilhão.

AIKIDO KEIKO

Entrámos no dojo já com a saudação tradicional inicial cumprida. 
Porém, rapidamente adquirimos o ritmo no tapete.
 Depois, entrosamo-nos no ambiente de prática. 
Logo após, estávamos prontos para iniciar o keiko (treino) específico.
Como habitualmente, neste tipo de estágios
 ministrados pelo nosso mentor técnico internacional,
 são os princípios do Aikido, os preceitos básicos, que são relevados. 
Por tal, o protagonismo foi para os movimentos e os posicionamentos elementares, 
suficientes e capazes de anular e/ou aproveitar a
 energia do ataque dos adversários. 
Neste capítulo, privilegiaram-se os ‘irimi’ e os ‘tenkan’.
 Depois, evoluímos para técnicas de ‘ikio’, ‘nikio’ e
 ‘kokiu’, terminando em ‘nage’, projecção. 
A julgar por este e pelos treinos seguintes, 
deve ter sido um dos estágios com maior frequência de projecções.
Após o (primeiro) treino, tomámos melhor contacto com as instalações. 
O Sport Vlaanderen é um centro de estágio plurimodal,
 capaz de alojar mais de uma centena de atletas simultaneamente, 
com fornecimento de refeições e roupa de cama. 
O pavilhão desportivo dispõe de mais de 100m2 de ‘tatamis’ 
e balneários suficientes simultaneamente para uma centena de praticantes.

O estágio contemplou 3 dias de treino, num total de 8 horas, 
ministradas por Antoine Vermeullen Shihan, 7º Dan, Aikikai de Tóquio 
- director técnico internacional da Associação Cultural Portuguesa de Aikido, ACPA
 - que, nesta ocasião, comemorou o seu Cinquentenário enquanto praticante de Aikido.

O evento, denominado “50 Years on the Tatami”,

teve lugar no fim-de-semana de Pentecostes, 

no Sport Vlaandereem, de Balnkenberge, e juntou uma

 delegação portuguesa da ACPA, 

que envolveu 11 praticantes.





Neste aniversário especial do Sensei Antoine Vermeullen, 
estiveram presentes oitenta e cinco aikidocas de várias
 Federações e países. 
Foi a experiência de 50 anos de aprendizagem no tatami, 
que o Sensei passou a todos os seus alunos que pretendem enriquecer o seu Aikido.


MARGINAL DO MAR DO NORTE


O primeiro contacto com a zona histórica de Blankenberge aconteceu logo após o jantar. 
Mas, rapidamente, escolhemos a marginal como espaço de passeio 

ao longo da extensa praia banhada pelo Mar do Norte. 
A brisa marítima sente-se perto da praia, mas não há olfacto que registe alguma maresia.

Embora não houvesse muita gente na rua,
 percebemos no dia seguinte que os restaurantes estavam cheios.
Os belgas parecem estar sempre em festa, a avaliar pelos cartazes 
– Festa no Cais de 10 a 13, feriado de Pentecostes  na segunda-feira seguinte -, 
pelas trupes de palhaços -– pelo menos, vimos duas 
e, mais longe, a música de outra -,  e, ainda, pelo fogo-de-artifício.

Juntam-nos no Belgium Pier, um conjunto de bar, restaurante,
miradouro, sala de reuniões e auditório.
 Trata-se de um edifício redondo, erigido no final de um pontão
com cerca de 100 metros de comprimento, 
implantado sobre estacas em pleno Mar do Norte.
Dali, a vista alcança praticamente toda a marginal,
 sendo fácil perceber que está repleta de prédios altos,
 restaurantes e lojas, como é habitual nesta zonas de veraneio. 
Fazia lembrar, remotamente, uma espécie de Praia da Rocha, 
mais baixa, mais fria e mais escura.
Do Pier, vê-se igualmente toda a extensão de areia,
 nem muito clara nem muita parda, os bares de praia,
 as barracas de madeira e algumas esplanadas. 
É possível, também, verificar que, aqui, 
a orientação das cadeiras de praia 
não é em função da vista de mar, 
mas sim em função do sol.
E foi da areia que, já noite, brotou um tímido foguete
 que, afinal, abriria uma sessão de fogo-de-artifício
 que durou cerca de 15minutos. 
O céu belga ficou rapidamente pleno de explosões, brilho e cor. 
Recostados nas cadeiras do Pier e com um copo de cerveja belga na mão, 
percebe-se ainda melhor a riqueza do cenário.

CENTRO HISTÓRICO

Aproveitamos a manhã seguinte para conhecer melhor a zona central e histórica da urbe. 
Saímos a pé do complexo desportivo, passámos pelo bairro de moradias, 
muitas de cor escura com paredes revestidas a tijolo. 
Numa delas, surpreendemos um cenário decorativo que envovia 
uma linha de comboio, algumas colinas e uma ponte.
Entramos na igreja de Sint-Rochus, de finais do século XIX, 
neo-romana, com fachada em tijolo vermelho. 
Entre outros detalhes, dispunha da lista de pastores residentes,
desde a última década do século XIX, 
e de um conjunto de objectos porventura relacionados com uma patrona da igreja.

Durante o percurso no centro histórico, 
percebe-se que a arquitectura dos prédios 
é semelhante à dos edifícios da zona histórica de Amesterdão. 
São estreitos, com 2 ou 3 andares, e muitos detalhes decorativos,
 a lembrar a Arte Deco dos Anos 20 (do século passado).
Talvez por isso, apelidem a zona como Belle Epoque.
 Aliás, um dos museus mais divulgados tem exactamente esse nome 
e mostra mobiliário, arquitectura, elementos decorativos 
e objectos, que vão desde finais do século XIX até aos Anos 20.
Fora do centro histórico, ainda há muitas casas antigas,
 ou que foram reconstruídas com a traça original. 
Uma delas, tinha ainda um telhado em colmo,
 reconstruído de acordo com preceitos antigos. 
Mais à frente, era um número de telefone 
ainda com 5 dígitos que testemunhava tal anciania.
Percebe-se que o sítio foi – e deve continuar a ser – privilegiado por pessoas economicamente relevantes.
 Antes da Primeira Guerra, era local escolhido para férias da nobreza e mesmo de monarcas. 
Hoje, há muitos cartazes a anunciar alugueres, 
quer de espaços comerciais – lojas ou bares -, quer apartamentos de férias.
Sendo domingo 
– dia em que, pelo menos por cá, muitos saem à rua – 
as ruas principais do centro estavam repletas de pessoas. 
Para tal enchente, devem contribuir muitas das ruas de tráfego exclusivo a peões 
terem as respectivas lojas de portas abertas. 
A zona da marginal também se mostrava farta de passeantes ou pessoas a fazer jogging.

Passámos pela Majutte Huisje, Casa de Majutte, 
uma das poucas casas históricas de pescadores que permaneceu na cidade. 
A casa tem cerca de 200 anos e nos anos 70 do século passado foi comprada
para se tornar numa loja de antiguidades, café e restaurante. 
Os proprietários mais recentes transformaram-na num museu.

Lá perto, e ainda numa rua sem trânsito automóvel, 
descobrimos o Hotel Restaurant José, com acento e tudo, 
de duas estrelas, o que diz da diáspora lusitana por terras do TinTin. 
Antes, havíamos surpreendido um jogo de boules ou petanca. 
Mais à frente, uma Harley-Davidson em frente de uma joalharia. 
Por todo o lado, matrículas luxemburguesas.
 Cosmopolita, esta Blankenberge.

No meio de tudo isto, uma sensação estranha. 
Na marginal, o mar está ou parece estar praticamente aos nossos pés. 
Da marginal para sul, desce-se, por escada ou por rampa. 
No fim da descida, a sensação é de que estamos abaixo do nível do mar.
Não estamos, mas quase! 
O Sport Vlaanderen está apenas um metro acima do nível do mar. 
Passear é fácil, tal como andar de bicicleta. 
Os pisos, quer do passeio, quer da rua, estão em bom estado. 
As únicas subidas têm desníveis de 5 metros para e da marginal. 
Tudo o resto é plano.

E VOLTA


Deixamos Blankenberge após o almoço de segunda-feira. 
O trânsito previa-se e verificou-se intenso, quer por ser feriado, 
quer devido às obras em diversos, locais do percurso. 
Chegamos ao aeroporto com uma margem de tempo suficiente 
para comprar alguns produtos típicos no free shop respectivo 
e, ainda, estender a conversa para assuntos da nossa prática de Aikido, 
acompanhados ao piano por jovens músicos que tinham um à disposição 
no salão de espera junto aos bares.

O avião que devia sair cerca das 20:25, partiu já perto das 10 da noite. 
Justificaram o atraso com as condições atmosféricas.
 Quando há trovoada sobre o aeroporto as operações aéreas cessam, referiu o comandante. 
Depois de um voo algo sui generis, com muito humor, mas também algum mau odor, 
estávamos de regresso a casa por volta da uma da manhã.

Estava cumprido o primeiro estágio de Aikido no estrangeiro. 
Este fim-de-semana de prática ficará na memória, 
com um conjunto de ensinamentos preciosos, com bons “ukes” belgas e algum “relax” atento, 
o suficiente para nos mantermos no Caminho do Budo,
 através da contínua prática de Aikido.

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