Agosto 2012
"Os jardins são lindíssimos. Mas o palácio deve ser extraordinário...!". Era o que dizíamos todos os anos, sempre que lá íamos. Mas, inexoravelmente, ano após ano, saíamos muitas vezes sem sequer vislumbrarmos a extensão do corredor nem a dimensão das salas. Ora as janelas estavam tapadas com papeis, ora o espaço interior estava ocupado com andaimes. Depois, até os jardins perderam muito do encanto (e da conservação). Jardim e palácio pareciam condenados ao degredo.
Sintra continua a ser um sítio diferente. A vila e a serra são propícios ao ócio, mas também motivadoras de outros labores. São capazes de atrair quem gosta de visitar monumentos, passear na floresta, sentir a frescura da sombra das árvores ou escutar o fluir da água dos ribeiros, elementos de lazer e satisfação para os quais hoje parece não haver tempo ou paciência. Mas também são capazes de cevar paixões, estimular a invenção, despertar a imaginação, motivar a criação.
Monserrate, especialmente o palácio de Monserrate, é um desses sítios em que foi preciso paciência e tempo para o ver arranjado, recuperado, restaurado. Mas, sobretudo, aberto ao público. Há quem escreva que esteve fechado durante meio século.
É preciso tempo para visitar aquele espaço.
Monserrate é plural: jardins, palácio, caminhos, cascatas, lagos. E espaço, sobretudo muito espaço, num sobe e desce de trilhos, ora com veredas estreitas ora com superfícies amplas. Agora, com mais caminhos construídos, mais espaço arrebatado ao mato, é preciso mais tempo para os descobrir e percorrer. E, para quem não seja munícipe, também tem de ter a paciência de pagar a entrada, a sete euros por adulto.
Monserrate é plural: jardins, palácio, caminhos, cascatas, lagos. E espaço, sobretudo muito espaço, num sobe e desce de trilhos, ora com veredas estreitas ora com superfícies amplas. Agora, com mais caminhos construídos, mais espaço arrebatado ao mato, é preciso mais tempo para os descobrir e percorrer. E, para quem não seja munícipe, também tem de ter a paciência de pagar a entrada, a sete euros por adulto.
Estar em Sintra, é deparar com romantismo em cada canto. Monserrate partilha inevitavelmente desse ambiente lírico, especialmente dedicado ao sonho e à fantasia, que os caminhos estreitos, sombrios, escapados; os declives abruptos; os calhaus semeados nas escapas; a vegetação luxuriante; os lagos ocultos; as mansões assombradas ou esotéricas, instigam. É essa esfera inspiradora que atrai à simples observação da natureza, ou à leitura, ou ao estudo. Mas também à arte, ao raciocínio, à criação.
JARDIM
Devaneio, amores, filosofias, dramas ou utopias à parte, seja qual for a visão individual do mundo e da vida, a estética do lugar não deixa de impressionar, por muitos jardins e palácios que existam ali perto. Estes, de Monserrate, são diferentes. Pela concepção e pelas espécies naturais do jardim, e ainda pelo estilo arquitectónico do palácio.
A estética do jardim aproveita sobretudo o declive e o microclima do lugar. Os caminhos enovelam-se desde os pontos mais altos - entrada e palácio – até aos pontos mais baixos – lagos. Beneficia também dos cursos de água para criar duas cascatas e os lagos no “vale”. Ainda ficaram muitos dos trilhos tradicionais, com piso em velhos paralelepípedos.
Agora as veredas multiplicaram-se, sendo em piso misto de terra/areia batida mais fáceis ao pisar e provavelmente mais permeáveis às raízes. Apesar de ficar situado na encosta noroeste da serra, menos exposta ao sol, a temperatura chega a parecer tropical, e o vento, tão presente na vertente sul, está ausente.
Conceberam-se agora zonas novas: o jardim do México e o Vale dos Fetos. Um reúne um conjunto floral típico daquela região e o outro reúne numa das vertentes uma capa de fetos que vai quase até aos lagos. No primeiro, sente-se muito a humidade (própria de florestas tropicais), no segundo, a frescura proporcionada pela sombra dos fetos mais altos. Uma e outra, tem os seus lugares de água – riachos, pequenas cascatas, lagos.
Mas também é possível perder o olhar em redor, simplesmente. Ou então, estar, descansar os ouvidos sem ruídos de maior que não sejam o da passagem dos turistas. Ou, ainda, cheirar, sentir o odor ambiental, a mistura de perfumes das flores e das fragrâncias das plantas que tudo envolvem.
Muitas continuam a cercar e a enlear, por exemplo, o destroço da ermida que fica a meia-encosta, uma espécie de ruína de Gondor destruída por Orcs ("O Senhor dos Anéis"), onde as raízes e os troncos das árvores e gavinhas das trepadeiras abraçam janelas e portas, e deslizam pelo telhado ausente. Fazem-no há anos, há décadas, e as paredes ainda resistem. É um sítio estranho, intimidante, mas simultaneamente sedutor.
Talvez seja daqueles lugares que alguns apelidam mágicos. Afinal estamos no Monte da Lua, um lugar misterioso mas fascinante, de ascendência celta e descendência romântica. Aliás, a serra está prenhe de exemplos de culto esotérico, que contempla praticamente todas as edificações mais notáveis, como sejam o Castelo dos Mouros, o Palácio da Pena, o Palácio da Vila, a Quinta da Regaleira.
Exclusiva é também a diversidade de espécies de plantas que o parque possui. Essa variedade contempla vegetação oriunda de todo o mundo, desde as espécies nacionais, passando pelos fetos australianos, pelas palmeiras mexicanas, pelos bambus do Japão, um conjunto ímpar de riqueza botânica.
Outro espaço singular é o da cascata de Beckford, em cujo pequeno lago pousam nenúfares que o cobrem em grande parte. Associado está o arco de Vathek, pouco antes da cascata que continua a emprestar aquele lugar uma aura de mistério, aliando aquela zona mais húmida, sombria e íngreme, à beleza da queda de água, das espécies vegetais envolventes, do lago e da pequena ponte de pedras.
Exclusiva é também a diversidade de espécies de plantas que o parque possui. Essa variedade contempla vegetação oriunda de todo o mundo, desde as espécies nacionais, passando pelos fetos australianos, pelas palmeiras mexicanas, pelos bambus do Japão, um conjunto ímpar de riqueza botânica.
Outro espaço singular é o da cascata de Beckford, em cujo pequeno lago pousam nenúfares que o cobrem em grande parte. Associado está o arco de Vathek, pouco antes da cascata que continua a emprestar aquele lugar uma aura de mistério, aliando aquela zona mais húmida, sombria e íngreme, à beleza da queda de água, das espécies vegetais envolventes, do lago e da pequena ponte de pedras.
Estivéssemos na Quinta da Regaleira e certamente alguém alertaria para um caminho iniciático… que não é difícil de presumir entre a cascata/arco, o falso cromeleque, o arco indiano, a ermida, e o próprio palácio, não excluindo um ou outro riacho nem os lagos do vale…
Música: Carlos Santana, Caravanserai
PALÁCIO
O responsável principal por este pictórico conjunto, foi o milionário inglês Francis Cook que, no final do século XIX mandou construir o palácio e os jardins. Ao longe, o palácio pode parecer como um pavilhão abobadado de inspiração árabe. Mais perto, embora alguns elementos árabes lá estejam, notam-se outros clássicos, góticos e indianos.
É o feliz conjunto destes estilos que faz do palácio ex-libris do espaço. As três cúpulas de inspiração indiana, as janelas góticas, um alpendre com arcos e azulejos de estilo mudéjar, além dos estuques de influência árabe e dos bustos clássicos no interior, fundiram-se numa linguagem estética tão singular e que tanto fascina.
A mim, além da singularidade das cúpulas, cativou-me sobretudo a noção de perspectiva criada com o vazamento provocado pela profusão sucessiva de pequenas colunas, para além do rendilhado dos arcos e de alguns dos elementos decorativos dos gessos. A sala da música é muito acolhedora, a biblioteca atraente, os átrios também são simpáticos e os espelhos em duas salas dão uma ideia do que seria a decoração interior.
O mobiliário original já lá não está - provavelmente é na biblioteca que está a maior parte - sendo recente o pouco existente na sala da música e em uma ou outra dependência. No piso superior, onde seriam provavelmente os quartos, não há qualquer peça de mobiliário. Todavia, vale a pena descer à cozinha e perceber como funcionava aquele gigantesco fogão.
Fio condutor ou elemento comum ao palácio e ao jardim, é o toque artístico, o cenário romântico, o ambiente quimérico que conjugam. Um e outro contemplam-se, um dominando a colina, o outro ocupando o solo como um prado. Um e outro completam-se, conjugando o talhado dos elementos decorativos do palácio e o recortado dos troncos, ramos, flores e folhas do bosque.
Música: Carlos Santana, Caravanserai