Há muita luz no Funchal, vista cá de cima, antes da aterragem, às tantas da noite. Já passou da hora de jantar, o táxi apareceu tarde e já há pouca gente à espera de transporte desde o aeroporto. Na cidade, o destino é a Quinta Mãe dos Homens.
Daqui, a vista é uma das quais pela qual o Funchal é famoso: uma baía aos pés do alcantilado das edificações. Parece uma Sesimbra em ponto grande, mais íngreme, mais verde, mais alta. E, ao largo, um mar calmo, azul, a ilumnar a cidade.
Daqui ao “centro”, digamos até ao Mercado dos Lavradores, a descer, é num instante. Para cima, é ao contrário, um cansaço. Mas vale a pena descer lentamente as ruas estreitas e desfrutar de um panorama ímpar. Depois, é apanhar a Ribeira João Gomes e descer até à Zona Velha. Mas, hoje, vamos dar um passeio mais alargado. Começamos no Cristo Rei, no Caniço, junto da Reserva Natural Parcial do Garajau. O miradouro, dominado pela estátua semelhante à do Cristo Rei de Almada, está lá desde 1927, ou seja, quase a fazer um século de existência.
A vista para o mar e para a falésia, uma ravina valente com praia em baixo, é suficientemente paisagística para motivar a paragem. E quase tocamos o Funchal com os olhos. Há nuvens, o mar está sereno e a vegetação luxoriante como habitualmente. Estamos prontos para continuar até ao Miradouro do Caniçal. Apanhamos a via rápida que nos voltamos a passar no aeroporto e, depois, na concha do Machico, sempre ao longo de pequenas zonas urbanas sobretudo com moradias dispostas nos socalcos.
Daí a pouco, já se vê ao longe a Ponta de São Lourenço. Passamos à vista da do Vulcão Penha de Águia e paramos entre os miradouros de Ponta do Rosto e do Caniçal. A vista para as falésias e para o mar é deslumbrante. Ao longe, a ilha de Porto Santo recorta-se no horizonte.
Estamos praticamente no ponto mais oriental da ilha da Madeira. Daqui, além do Porto Santo, vê-se meia ilha, descobrindo-se o formato pontiagudo do que parece quase estarmos num istmo. Não há refúgios e a vegetação é escassa. O vento sente-se à vontade para nos abanar de alto a baixo.
O chão é estranho. A cor das rochas vai do encarniçado ao beije, passando por algumas quase negras. O solo é árido, de pedra clara mas, por vezes, também mais escura. Há uma zona repleta de “bacias” lisas, com pequenas pedras em redor.
Estes sítios paracem ter sido “bombardeados” por pequenos meteoritos. O que parece é que, ali, certas rochas são muito ductéis, enquanto outras são duríssimas. A verdade é que o conjunto cria formas curiosas. Mas também parece que ninguém liga nenhuma aquilo.
E saímos para Porto da Cruz. Aqui, são os Engenhos do Norte que dominam. Estão lá desde 1927 e são um marco significativo na produção de açucar na ilha. Dispõe de um núcleo museológico, parte ainda era da Revolução Industrial.
É ainda possível assistir à produção de aguardentes de cana-de-açucar e fazer provas de rum no interior e na esplanada da loja. Cá fora, também há engenhos, e valentes. Lá dentro, entre tonéis e passadiços, uma das marcas destaca-se, a 970. Numa loja onde até há rum em spray!
Próximo da loja, a praia da Alagoa, ladeada por um enorme penhasco, e apesar de ser em calhau rolado, tem uma grande freguesia de surfistas. Curiosamente, é numa das extremidades da praia, já fora de pé, que surge uma pequena língua de areia clara.
Continuamos entre montes, onde a paisagem se robustece com o verde da vegetação e o cinzento das rochas. Paramos no miradouro da Senhora dos Bons Momentos e debruçamo-nos sobre o panorama da praia do Faial. O recorte da costa é tão atractivo como perigoso.
E chegamos a Santana. Aqui, são as casas que se salientam do espaço florido, as famosas casas com telhado de colmo, em bico, e fachadas com janelas coloridas. O interior, de 2 andares, sendo o superior diminuto, tem expostos produtos regionais e lembranças. Lá dentro, cabem 4 fregueses simultanemente..
Há muito que deixámos as estradas largas da marginal a sul. Agora, as estradas são estreitas, mas têm bom piso, ladeadas por vezes com hortências - não tantas como nos Açores. Como o trânsito não é muito, é possível ir parando em pequenos miradouros, por estreitos que sejam.
Próxima paragem numa loja de artesanato perdida na floresta. Afinal, não estava assim tão perdida. Há mesmo muita gente a deambular por ali. Muitos, entram e saem, mas com uma poncha na mão. E parecem contentes. Foi a melhor poncha da viagem. Outros, muitos, parecem ter um destino determinado. Vão a caminho de uma “levada”, um canal de irrigação que entra pela floresta. Em redor, é o verde que esmaga. E o fresquinho que refresca. Acompanhamos a “levada” até que o caminho estreita.
Estamos na Levada dos Balcões. O trilho mistura-se com a Levada da Serra do Faial e culmina num miradouro excelente. O troço não tem dificuldade de maior, é constantemente acompanhado pelo estreito canal de água (levada) e sempre à sombra da densa vegetação arbórea.
Como está fresquinho, vamos manter essa aragem trepando ao Pico do Areeiro, o segundo local mais alto da ilha e o quarto de Portugal, com 1818 metros de altitude.
É a trepar, realmente, mas acda vez está mais enevoado. Até que, lá em cima, vê-se 100 metros á frente dos narizes. O Observatório ainda se vê. Porém, o Curral da Freiras está sob uma névoa que teima em cercar o cume do monte.
O ambiente até está mais quente mas, em redor, a vista sobreas falésias é cada vez mais reduzida. É melhor descer e voltar ao Funchal.
Vamos passear na cidade. Hoje, preferimos o centro. Dos Paços do Concelho ao vizinho Museu de Arte Sacra, da Catedral do Funchal ao Mercado dos Lavradores.
E ainda houve tempo - aqui o tempo parece estender-se não sei para onde - para deambular pela rua de Santa Maria e por algumas obras do “Projecto Arte Portas Abertas”.