sábado, 10 de julho de 2010

A Arte das Mansardas

É na mansarda que a terra acaba, lá em cima, no reino das nuvens próximo do firmamento. É no cimo da terra que a mansarda se estira para o céu, espicaça as nuvens, a caminho das estrelas. Estende-se como uma ponte, projecta-se como açoteia, liga-se como elo.
Para lá chegar, há que, habitualmente, galgar degraus, abordar uma subida íngreme, um sublime esforço para alcançar o último piso. O caminho estreita, o espaço confrange-se, a luz mingua. Ao ascender ao sótão, escala-se à quietude, ao isolamento, à meditação.
Lugar excelente para explorar os sonhos, recuperar memórias, reaver objectos de outras eras. Fica íntimo, criativo, poético. Dali, observa-se ou reflecte-se, espreita-se ou fantasia-se. Há muito para descortinar, mais para descobrir.
A mansarda é normalmente esconsa, apertada, coactiva, porém, harmoniosa, equilibrada, protectora. Alarga-se na medida da exiguidade dos segredos que esconde. Acanha-se conforme os silêncios que vulgariza. Fecha-se aos outros: recua nos telhados, esconde-se entre vegetação, oculta-se ao olhar diferente.

De lá, mira-se habitualmente de frente, através de janelas redondas, quadradas, rectangulares, amplas, mas esguias e acanhadas na maioria dos casos. O horizonte apertado afaz-se ao olhar exíguo, porém, dedicado e preciso.
Do cume, o querer tem mais arrimo, sente-se protegido e poderoso na procura do secreto. É a intimidade da mansarda que abriga, a dimensão que aconchega. É nas mansardas que termina a terra e se chega mais perto do céu, para apresar as estrelas.

Musica: The Lord Of The Rings, Many Meetings
Howard Shore e Suzana Peric

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