domingo, 24 de novembro de 2024

Berlim. Da Liberdade e do Muro

Depois da I GG, o fascismo surgiu em Itália através de movimentos paramilitares, os fasci. No início dos anos 20, na Alemanha, o mundo assistiu à madrugada do nacional socialismo, No final do anos 30, fascismo e nacional socialismo estavam de mãos dadas.


Em 1939, dá-se o início da II GG. No desfecho deste conflito, 6 anos depois, as quatro potências vencedoras, dividiram a Alemanha em duas partes, o leste dominado pela União Soviética, e o oeste pela Alemanha.

Em 1961, a cidade de Berlim, também dividida entre a União Soviética e os Aliados, viu crescer um muro, decisão da Alemanha Oriental e da União Soviética para isolar Berlim Ocidental. Nascia o Muro de Berlim, também conhecido como Muro da Vergonha.

A cidade, que tinha sido devastada pelo esforço dos Aliados e da União Soviética, testemunhava agora o antogonismo dos dois blocos, traduzido na construção do Muro que, durante 28 anos o muro dividiu a Alemanha e a Europa e foi símbolo da chamada Guerra Fria.

Em 1989, no processo de desintegração da União Soviética, o Muro caiu. As famílias puderam voltar a reunir-se, a Alemanha reunificou-se e a cidade tornou-se numa das mais cosmopolitas da Europa. A queda do Muro foi o princípio do fim da Guerra Fria e de uma nova era para a Europa e para o mundo.

Talvez tenha sido o aspecto cosmopolita, a História e algumas sugestões de amigos e familiares a motivar a visita à cidade. Por tal, fomos espreitar Berlim na segunda década do século XXI, 35 anos depois da queda do Muro. Tínhamos dois objectivos essenciais.

Um, passava pela visita dos museus clássicos berlinenses. Uma vez que o Museu Pergamon, para nós o prioritário, estava fechado, pelo menos, até 2025, optaríamos pelo Altes e pelo Neues, situados na famosa Ilha dos Museus, cuja narrativa fica para outra ocasião.

Por outro lado, íamos à procura de alguns testemunhos da passagem da II Grande Guerra pela cidade. Entre outros locais, tínhamos como visitável o próprio Muro (ou o que dele sobra), bem como o pequeno museu que lhe foi dedicado, queríamos passar pela antiga “fronteira” entre os dois lados e, ainda, visitar um bunker que chegou a abrigar milhares de pessoas.

Comecemos, então, pelo MURO DE BERLIM, DIE BERLINER MAUER

 

Ainda lá estão pedaços. Por um lado, a presença do Muro, ainda testemunha esse período de separação e de morte. Por outro, a opção arquitectónica e artística que hoje contempla quer o muro quer o espaço, foi uma mais valia.

 

Com efeito, foram convidados vários artistas mundiais para preencherem os diversos trechos do Muro. Os temas são tão diversos como a nacionalidade, o estilo e a mensagem dos diversos artistas que ornamentaram o que serviu de bloqueio durante décadas e transformou o Muro da Vergonha num Muro de Arte.

A alameda, onde está situado um extenso pedaço do Muro, recebeu mesmo o nome de East Side Gallery. Trata-se de uma galeria de arte urbana a céu aberto, com mais de 1300 metros de comprimento, que levam ao Museu do Muro, situado muito próximo da Oberbaumbrücke, uma excelente ponte de pedra de sete arcos, de finais do século XIX.


São obras de 118 artistas, de 21 países, com abordagens baseadas nas mudanças políticas ocorridas na data da Queda do Muro. Um dos temas mais presente é o da liberdade. Nota-se que algumas pinturas parecem recentes, mas tal deve-se ao facto de todas terem sido sistematicamente restauradas.

 

Andámos ao longo de cerca de 500 metros, entre pombas e personagens de animação, entre Trabatans e palavras de ordem, entre Marx e o Monte Fuji.  Esperança, paz, amor e liberdade, são as mensagens mais numerosas. Mas também há imagens mais violentas, entre futurismos e desapontamentos.

Mais à frente, praticamente junto da Oberbaumbrücke, "a fechar" o muro, juntaram-se vários testemunho desta barreira. Não tem ainda uma década, documenta a história e algumas das estórias do Muro, percorre o período desde o iníco da Guerra até à Queda do Muro. 

É aí que se ergue o MUSEU DO MURO

Mostra um conjunto de aspectos datados, como sejam, uma sala de estar típica de um apartamento do lado oriental, particularidades da construção do muro. Até lá está uma betoneira utilizada na construção), manequins com soldados e polícias do lado oriental, equipamentos de comunicações, etç.

Na verdade, o muro de Berlim era composto por duas paredes paralelas, ainda pereceptíveis no terreno, com um espaço no meio conhecido como “faixa da morte”. Esta zona estava fortemente vigiada com torres de vigia, armadilhas, cães de guarda, holofotes, arame farpado, etç.

No final as salas são dedicadas. sobretudo através de audiovisuais, à Queda do Muro. Desde a festa de travesia da fronteira, até ao abate do muro, passando pelas declarações dos políticos, até ao concerto da liberdade dos Pink Floyd, a festa da libertação é o tema dominante.


Com a Oberbaumbrücke a dois passos, ponte datada de fibnais do século XIX e que chegou a ter um trecho destruído pelos alemães, quando os soviéticos invadiram Berlim é, também,  uma ponte para a  tradição, palco de uma batalha vegetal entre os dois distritos adjacentes, Friedrichshainer e Kreuzberger, uma vez por ano.

Passo seguinte: CHECK POINT CHARLIE

Entrámos na Friedrichstrasse para percorrer o último quarteirão. Ao fundo, antes do cruzamento, vê-se uma réplica da guarita branca do Check Point Charlie. Trata-se de um dos símbolos da Guerra Fria, tendo sido o ponto de passagem mais famoso entre os dois lados de Berlim.

Foi testemunha de vários momentos críticos durante a Crise de Berlim, em 1961, sobretudo quando se enfrentaram os carros de combate americanos e soviéticos, bem como na morte trágica do jovem Peter Fechter, morto pelos guardas do lado oriental da fronteira quando tentava fugir para o lado ocidental.

Hoje, apenas lá está a casa da guarda americana e uma parede de cimento a imitar os sacos de areia que a protegiam, além de dois cartazes com os retratos de um soldado americano, e de um soldado da Alemanha Oriental, assim como a frase “You Are Leaving The American Sector” traduzido em 3 línguas.

 

Próximo, estão o Museu do Muro, a Casa do Check Point Charlie e algumas lojas de recordações. Num dos vértices do cruzamento, uma exposição ao ar livre passava em revista os aspectos mais significativos daquele lugar, desde o dia crítico de 61, passando pelos controlos e pelas diversas fugas para o lado ocidental.

Saímos pela avenida onde o Trabant, um dos carros mais célebres da Alemanha Oriental, é vedeta. E, apesar de poder ter sido mais um tema giro para explorar, o próximo objectivo ia ser de visita morosa e, ainda queríamos ir à Praça de Postsdamer.

Como todo este trajecto estava planeado para ser feito a pé - pouco mais de 2 kms -, o melhor foi descansar num banco próximo da antiga estação ferroviária de Anhalter. A fachada está lá. Porém, depois de reparar que lhe faltavam uns pedaços, vimos que era mesmo só a fachada que estava em pé.

Praticamente todo o telhado ficaria reduzido a escombros, depois dos bombardeamentos aliados. Aliás, por uma fotografia de época, até parece impossível que a fachada e as paredes da estação não tenham caído. O que também não caiu, foi o bunker que hoje é o

BERLIM STORY BUNKER

e que chegou a abrigar 10 mil pessoas, nos últimos dias de guerra. O bunker estava destinado a proteger habitualmente os passageiros da estação, quando havia alarmes de bombardeamentos.

Hoje, o bunker tem como função abrigar sobretudo a história de Berlim da época, ao longo de mais de trinta salas de exposição. Em cada uma delas está a narrativa audiovisual dos momentos mais significativos da vida da cidade naquela altura.

Trata-se de uma das melhores exposições que via até hoje, dada a organização, preciosismo e representatividade dos materiais expostos, também eles de uma forma cronológica, didática e detalhada.

Estivemos ali quase uma hora. O único “senão” foi mesmo estarmos “fechados” em salas sem janelas, apenas rodeados de paredes de betão. Por outro lado, tivemos a sensação do que será estar encerrado durante algum tempo num bunker.

Todavia, ao lermos à entrada, sobre uma bomba americana, com meia tonelada de explosivos que se abateu sobre o bunker… mas que “apenas” criou uma cratera com 1,5m em 3,8m do tecto de  betão, ficámos mais sossegados quanto à solidez do bunker…

Pena foi não ser permitido fotografar no interior. 

terça-feira, 12 de novembro de 2024

SAKURA MATSURI


Há gente com sorte. Com a sorte de poder ir ao Japão, de visitar Tóquio, de estar lá em pleno Festival das Cerejeiras, de passar pelo Parque Ueno no dia em que milhares de famílias japonesas, colegas de trabalho e amigos se reunem para fazerem um imenso piquenique.

Ainda com a sorte de ver as cerejeiras em flor, ao longo dos canais, nos parques, junto de edifícios icónicos, de monumentos notáveis, em redor dos lagos, de dia e de noite. Mas não apenas em Tóquio. O Festival das Cerejeiras, Sakura Matsuri, é um dos festivais mais famosos do Japão.

Estamos no início de Abril, a melhor época para visitar o país, sobretudo no intuito de lá estar para o Festival. Fazê-lo nos parques ajardinados japoneses é uma mais valia. Mas os jardins japoneses são mais do que a época de florescimento das cerejeiras.


 

Os japoneses têm particularidades na apropriação e ordenação do espaço. Sabem usar sabiamente o espaço e torná-lo meticulosamente organizado. Tudo parece estar no lugar certo. Tudo parece ter sido feito com um propósito. E foi.

O que parece por vezes alietório, tem a mão da cultura. Até o que parece puramente natural tem intervenção humana. E vice-versa: a natureza é, também, uma formatadora. É desse “oportunidade” que a cultura se apropria.

A interacção entre a natureza e a cultura está sempre patente na concepção dos jardins japoneses. Em variadíssimos aspectos. Nas repentinas mudanças de trajectos e/ou na dimensão do caminho, bem como nos enquadramentos que consideram o horizonte como parte do espaço.

Os japoneses conseguem dimensionar o espaço de modo a que as ilusões de proximidade ou afastamento, de limitação ou extensão, se acerquem da realidade. Mas não é só a dimensão que cria sensações. Os elementos naturais também têm um papel importante no maneio do espaço

 

A água é um dos elementos que está frequentemente presente nos parques. Não apenas a água parada dos lagos, ou a que proporciona superfícies que espelham a proximidade, por exemplo, mas também o fluxo da água que cria movimento e som.

 

As pedras, as árvores, as rochas, a areia, as flores, aliados a elementos decorativos trabalhados/estilizados, fundem-se harmonicamente para criar um todo: as pequenas pedras organizadas ou os veios na areia, associam-se a lanternas de pedra, ou a um tapete de folhas secas pinta o chão.

Há lagoas ou pequenos cursos de água cortadas por pequenas pontes e decoradas por lanternas de pedra e, sobre as pontes, pendem ramos de cerejeiras. No solo, há verdes que contratastam com os cinzas das pedras.

 

Há paisagens pensadas como miniaturas, depois ampliadas para ambientes tão abstractos como místicos. É aqui que se articulam os princípios espirituais e estéticos. Aqui, há vínculos entre a natureza e a cultura.

A fomatação das árvores, por exemplo, bonsai, é (mais) um elemento decorativo altera o espaço, que molda o palco onde a natureza se expressa sistematicamente e a cultura lhe vai moldando a elegância e harmonia.

Essa fusão acontece um pouco por todos os jardins. O Parque Ueno, em Tóquio, é disso exemplo. É também aqui que o Festival das Cerejeiras tem lugar significativo, onde as flores se transformam num extenso manto cor-de-rosa.  

O parque é extenso. Alberga museus, um zoológico, templos, lagos, pontes, telheiros, pequenos cursos de água. Besta altura, anda-se literalmente sob flores de cerejeira. E, por vezes, o manto passa para baixo,

Outras vezes, o vento fustiga os ramos e as flores flutuam como flocos de neve. E o chão fica esbranquiçado. As flores brancas estão sobre tudo, a decorar cenários, a encantar horizontes, a recortar um lago ou a matizar um edifício.

Os jardins e os respectivos conteúdos todos seduzem. São dos lugares mais escolhidos para fotografar, quer espaço, quer pessoas. São cenários cativantes. Ás vezes, basta uma cerejeira em flor. É bom estar lá, onde as pessoas são felizes.