Diz-se que quando dois homens se encontram ou negoceiam ou guerreiam. A guerra é feita nos campos de batalha e os negócios nos terreiros das feiras. A da Ladra, desde há mais de cem anos que acontece no Campo de Santa Clara, próximo da igreja de São Vicente de Fora, a dois passos do castelo de São Jorge, célebre terreno de batalha.
É verdade que já havia guerra quando a Feira de Ladra surgiu. Mas uma feira que remonta ao século XIII é mais do um testemunho do passado, é hoje também um património cultural, um evento que faz parte da identidade de Lisboa. A Feira da Ladra é Lisboa.
A Feira revê-se no todo que é Lisboa, um todo diverso mas integrado, harmonioso e controverso. Da diversidade das coisas e das pessoas à combinação entre estas e o espaço, a Feira organiza-se numa confusão ordenada, entre gritos e pregões, entre tendas, chapéus de sol, lençóis e toalhas esticadas no chão, no meio de carros estacionados, ao longo dos passeios,
sobre os quais se estendem peças de origem comprovada ou duvidosa, antigas e recentes, velhas, estragadas ou novas, num 'bric-à-brac' luminoso, alegre, atractivo, animado. Chega a ser festiva.
Independentemente do que é negociado, talvez seja a sua característica de mercado de levante aberto a todos que a torna tão popular e atractiva. Tal como a diversidade e a disposição dos objectos, as tipologias e as condições de conservação.São fundamentalmente as velharias - ou seja, artigos velhos, usados, estragados - e as antiguidades - objectos antigos e/ou artísticos - que preenchem as bancas da feira. Mas também há uma panóplia de coisas novas e usadas, como roupa, discos, artesanato, livros, ferragens, candeeiros, móveis.
A zona é rica em património religioso. A Feira estende-se entre duas igrejas, a de São Vicente de Fora, de construção iniciada na década de 80 do século XVI, e a igreja de Santa Engrácia, essa a das obras intermináveis, conhecida como Panteão Nacional.
Está ali a dois passos do Castelo, entre a Graça e Alfama. Tem ainda uma aura medieval e anima-se como uma praça El Fna de Marraquexe, ou uma El Hedim em Meknes ou, aqui mais perto, o Rastro de Madrid. Não tem tantos produtos naturais como as congéneres marroquinas, nem a rectilinearidade da feira da capital espanhola, mas é semelhante na disposição caótica das magrebinas e na variedade de produtos da madrilena.
Música: Jess Cook, Bagdad
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