quarta-feira, 27 de maio de 2009

Festival Islâmico de Mértola 2009


Maio, 2009
Ler com alguma paciência, que eu já perdi para dar ordem ao texto
A proposta era ir (mais uma vez) invadir uma réplica do ambiente islâmico, uma espécie de reminiscência de um passado cada vez mais longínquo mas porventura cada mais inevitável.
Para Mértola, o caminho é fácil, plano, vasto, talvez ermo. O relêvo aparece lá próximo, quando a vegetação também surge diferente. Ali há mais colinas, masi verde, mais arbustos, e a estrada tem mais curvas.


O tempo ameaçava chuva, que apareceu sob a forma de trovoadas. Duas ou três cargas de água escoltaram-nos até Corvos, onde almoçámos. Lá, ainda asistimos a alguns relâmagos irados. Mesmo assim, foi de moto que empreendemos a jornada.
Se bem que o estacionamento estivesse garantido, como habitualmente está em qualquer espaço onde caibam dois pneus e um motor, a verdade é que o tempo abafado, o piso irregular e íngreme das vielas, a par da multidão que encheu a cidade alentejana, não ajudaram a jornada de trepar por meandros pré-medievais.

Era essa alegria que eu procurava, e mais, muito mais da cultura árabe. Quem já assistiu ao bulício da praça El Fna e à agitação das vielas contíguas da medida de Marraquexe, fica na expectativa de poder (re)ver esse alvoroço.
E não é apenas o movimento, o banzé, a cor das roupas ou os traços da arquitectura. São os produtos diferentes – as sementes, as especiarias, as roupas emblemáticas – depois os artistas – os ginastas, os contadores de histórias, os encantadores de serpentes, os tocadores berberes ou africanos – depois os restaurantes típicos, com regateio de ementas e preços, depois os artesãos a produzir ao vivo. Valeu também pelo passeio, por um almoço excelente, pela companhia perfeita. E talvez pelo estímulo de, daqui a dois anos, recuperar o que desta vez só procurei.

O texto e o filme têm imagens cedidas pelos meus companheiros de viagem.

Música: Sahid Ghilani Priere, Alhambra, Oliver Shanti And Friends

Era mais cultura na rua que procurava, mais traços típicos, mais alteridade. Há quatros anos, havia marionetas a contar estórias, mais artesãos, mais arruada, e menos visitantes. Ficou a azáfama dos forasteiros, uma ou outra abordagem mais precisa aos enigmas das heranças árabes, uma negociação com base na quantidade, um chá frescote, e algumas gotas de água a escaparem-se por entre os telhados de cana que tapavam as ruas de Mértola.
No entanto, há sempre algo mais que se reconhece: os cheiros dos curtumes e das frutas secas, a indumentária diferente das djalabas, os olhares profundos dos magrebinos, os tecidos coloridos nas bancas e típicos nos mercadores, os meandros do trajecto urbano, uma ou outra esquina, um ou outro beco. E o rio no fundo do alcantilado.

domingo, 3 de maio de 2009

Todo o Monsanto

Foi um convite do Fernando Brioso, homem habituado a caminhadas mais longas e difíceis, em Portugal e no estrangeiro. Esta era fácil, previa-se bom tempo e, em Monsanto, não tínhamos ido além de um par de quilómetros à volta do Parque da Serafina e do Centro de Interpretação. Era uma estreia. Estavamos no final de Março.

Partimos do parque de estacionamento da Faculdade de Veterinária. Acompanhamos mais de meia centena de pessoas, com idades compreendidas entre os 10 e os 70 anos, mais mulheres do que homens, alguns mais iniciados outros mais experientes, preparados para uma caminhada que terminaria a meio da tarde.

Após algumas indicações logísticas que a extensão do grupo exigia, partimos a subir, a caminho do local da primeira paragem para concentração e descanso. Fizemo-lo próximo do anfiteatro, junto ao moinho que escolta os campos de basquetebol. Embora alto e desafogado, a vista desde este sítio não ia além dos telhados da zona ribeirinha. O dia enevoara-se.

Experimentaram-se ritmos diferentes, próprios da diversidade dos participantes. O grupo esticava-se à medida que penetrava na floresta, mas voltava a aglomerar-se nas zonas em que era preciso atravessar faixas de rodagem ou o declive aconselhava passada comedida.

Uma das áreas de passagem obrigava a atravessar uma espécie de túnel aberto numa sebe de cactos, suficientemente largo para que todos pudessem passar sem problemas. Do outro lado, abria-se uma clareira enorme correspondente a uma antiga pedreira, agora com a base e as vertentes repletas de vegetação.

De ali, ao antigo espelho de água de Monsanto - hoje Restaurante Chimarrão – foi um instante. O jardim e o lago mantêm a mesma aparência de há meio século. A leste, um miradouro voltava-se para a serra de Sintra envolta em nuvens.
O sossego só voltou a ser quebrado próximo das pistas de radiomodelismo. De aí, andamos pela berma da estrada junto da rotunda da Cruz das Oliveira, e continuámos para as antenas de teledifusão. Embora andássemos protegidos pelas ramas da vegetação, o ar aquecia-nos e muitos foram arrumando os casacos nas mochilas.
A vegetação tornou-se mais cerrada e os trilhos mais largos, sensivelmente até à zona dos desportos radicais, onde os declives aparecem mais abruptos e as veredas se confundem. Foi no parque de merendas anexo que comemos a refeição ligeira que levávamos.
Meia hora depois, estavamos a caminho da Serafina, que espreitámos desde um dos respiradouros mais notórios do aqueduto das Águas Livres. Daquele ponto, descobre-se o panorama da cidade desde Benfica, passando por Sete Rios, até Alcântara.
Continuámos pelos respiradouros do aqueduto – agora subterrâneo – através da Mata de Benfica, até desembocarmos na zona de Pina Manique. Voltámos a passar pela zona do radiomodelismo, para descermos junto do parque de campismo, atravessarmos a auto-estrada por um túnel e subirmos de novo a caminho da antiga pedreira.
Aqui e ali, o odor do pinhal misturava-se com o das ervas rasteiras. A vegetação separava-se ou adensava-se de acordo com a menor ou maior presença humana. Os trilhos, percorridos por caminhantes, corredores ou ciclistas, variam entre terra batida lisa e com algumas pedras soltas. Há equipamentos dispersos pelo parque para a prática de skate, basquetebol, escalada e ginástica. Estavam todos ocupados.
Não é difícil percorrer o Parque de Monsanto em toda a sua extensão. O piso e o declive não são excessivos e a maioria das subidas estão acessíveis a todos sem grande esforço. Talvez por isso, no final do passeio tenha circulado a informação de que havíamos percorrido dezoito quilómetros.

Música: Kitaro - Matsuri