"Uma máscara não é, principalmente, aquilo que representa, mas aquilo que transforma, isto é: que escolhe não representar."
Claude Levy-Strauss, A Via das Máscaras, Presença, 1979
Nas máscaras há religiosidade implícita, utilidade de mudança, símbolo de poder. Em muitas sociedades, as máscaras estão omnipresentes e são determinantes em ocasiões cerimoniais. Mesmo quando se trata de eventos ficcionais ou lúdicos, a máscara estigma a sua presença.
Esquimós, índios americanos, sociedades insulares, etnias africanas, comunidades asiáticas, todos detêm um rico património de máscaras. Estas, ora identificam excelentes panteões de deuses, ora invocam demónios do caos, ora reificam o mundo natural. A máscara é transversal à geografia.
Espólio mitológico, molde iniciático, imagem telúrica, símbolo ritual, laivo mágico ou sobrenatural, qualquer que seja o contexto, a máscara dissimula protagonistas perante pares, vizinhos ou rivais. Vela uma identidade, mas revela outra. Sabe-se fantasiosa, mas reconhece-se significativa. Anuncia-se monstruosa, mas destaca-se simbólica.
A máscara reifica ou endeusa o ritual. Esse, o ritual, comemora, entre outros, os ciclos das estações/produção, em que as máscaras surgem como catalizadoras das preces/intuitos, ou os ciclos de vida (adolescência/adulto), como reconhecimento de mudança de estatuto, ou os ciclos do poder político/ religioso, como símbolos hierárquicos.
Da austera primitividade das dos caretos, à marcialidade das dos samurais, passando pela mestiçagem das dos deuses asiáticos ou o traço fino das africanas, as máscaras distinguem, simbolizam, identificam. Diferenciam, ao separar uns dos outros e o eu de si próprio. A distinção faz-se do mascarado para os outros, mas também de si sem máscara, para si mascarado. É-se outro entre outros, mas também um outro eu.
Simbolizam, por que representam uma entidade mítica, demiurga ou animal, com um carácter, com um propósito, esses já de ordem cosmológica ou social. Identificam, por que nomeiam, baptizam uma personagem, e simultaneamente qualificam os intentos do protagonista, quer no seu estatuto social quer na sua qualidade de indivíduo.
Significativo, e talvez determinante, a transcendência que assume o mascarado, uma grandeza da ordem do simbólico, mas com repercussões no quotidiano.
Tal como o préstimo da máscara, que valoriza o protagonista, também a sua utilização está intimamente ligada à economia do grupo (o grupo dos chefes, o dos sacerdotes, o dos adolescentes, o dos agricultores, o dos guerreiros, etc).
Disfarce, distinção, ocultação, representação ou interacção, algumas das “utilidades” da máscara, são sempre modificações, mudanças. É a transfiguração que altera, sendo essa a principal razão de uso da máscara. (Mesmo a reprodução do ritual é feita com intuitos de renovação).
É nessa tranformação, nessa alteridade que surge a morte. A máscará é, também, uma face de morte, uma representação simbólica da morte. Inexpressivas, sobretudo as de madeira nonocolor, dão essa imagem árida, inerte, ao mesmo tempo ameaçadora, terrível. Também ela exorcisa a morte, também ela marca a diferença entre a vida e a morte.
A assunção de uma máscara, é a avocação de uma transferência, de uma mudança, de uma diferença. De adolescente a adulto, de actor a personagem, de leigo a especialista, de participante a celebrante, de crente a Deus, a máscara aproxima os primeiros dos segundos, ajuda a intenção a chegar ao objectivo, transfigura para assumir.
Os vídeos mostram dois aspectos das máscaras. O aproveitamento dinâmico, lúdico e quase publicitário das máscaras, por ocasião de um desfile da “Máscara Ibérica” na Baixa Lisboeta, e uma exposição de máscaras asiáticas, patente no Museu do Oriente, recentemente inaugurado na capital.
Algumas imagens fixas foram copiadas do catálogo "Máscara Ibérica", um apublicação do Museu Ibérico da Máscara, em Bragança http://www.mascaraiberica.com/accesible/POR_actuaciones.htm
As imagens animadas foram capturadas quando do Desfile da Máscara Ibérica, em Lisboa, em 3 e 4 de Maio de 2008
Outras imagens foram tiradas do espólio patente no recém inaugurado Museu do Oriente.
Músico: Craig Chaquico
Música: From the Redwoods to the Rockies
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