quinta-feira, 25 de abril de 2024

Pedalar em Quarentena


Por vezes, perguntamos: o que fazer quando não se pode fazer nada? A resposta costuma ser positiva, ou seja, há sempre qualquer coisa que se pode fazer, para além de não fazer nada. Porém, quando as limitações se adensam e nos isolam, há que investir ainda mais na descoberta de, o quê, por onde, quando, com o quê, fazer qualquer coisa.

Em Quarentena, as limitações aumentam. Porém, foi possível fazer outras actividades. Estar fechado num espaço reduzido, por vezes tão exíguo que se torna asfixiante, pode motivar à saída, ao passeio, à caminhada, à corrida, à pedalada. Pedalar, é saudável. Para quem o pudesse fazer no exterior, juntava a extensão do horizonte ao exercício físico num percurso.

 

É montar e partir, como diria Ricardo Lugris ,https://www.amazon.com.br/Montar-Partir-Ricardo-Lugris/dp/6558841975. viver e insistir em aventuras, novidades, abraçar outros “mundos” que passam sob as duas rodas. Mas, também, sentir a liberdade de poder, até, dar umas pedaladas nos passeios largos, encostar a bicicleta a uma árvore ou deixá-la no chão, passar sobre estreitas pontes de madeira e observar as águas da ribeira a passar.

Com as pistas cicláveis, nessa altura em maior número, estava aberta uma excelente oportunidade para pedalar. E, assim, aproveitar os diversos itinerários para conhecer mais um bocado do ambiente que nos rodeia e que rara ou nunca percorremos. E poder fazê-lo de uma forma tranquila, sem grande esforço, usufruindo da segurança das ciclovias. Fora delas, porém, o panorama muda…

 

As ciclovias puderam ser um caminho seguro para todos aqueles que, apenas a andar, a correr ou a pedalar, conseguiram juntar o útil ao agradável. Como não me convém correr em pista dura, aproveitei o facto dos amigos e colegas do Aikido também terem optado por se exercitarem nestes trajectos. E acompanhei-os de bicicleta em diversas ocasiões.


Horizontes e percursos foram-se diversificando e multiplicando, entre o urbano e o suburbano. Até por sítios improváveis, raramente percorridos. Outros, que reagiam à memória de décadas. Outros, ainda, de plena descoberta, quer paisagística, quer edificada. Outros, também, quer longe, quer perto, quer com bom tempo, quer com mau tempo, quer parques, quer ciclovias, quer ruas, quer estradas.

 

Foi assim em Queluz, na Amadora, em Belas, no Cacém, em Tercena. Do parque Felicío Loureiro ao “Bairro”, do palácio de Queluz à Floresta da Quinta Nova; do antigo Pigalle à ponte Filipina de Carenque, na Amadora; até aos Fofos de Belas, até ao Reservatório de Água de Tercena (junto à CREL), até à casa onde habitou um colega de liceu, até à estação ferroviária do Cacém, até ao Miradouro do Alto de Colaride.

 

Nestes périplos, várias surpresas, na maioria boas ou bizarras e locais incontornáveis. Bizarras: uma torre no meio da rua; todos os bancos de jardim vedados. Boas: o novo centro de Saúde de Tercena (um bom aproveitamento de um solar local);  o novo azul nobre do palácio de Queluz. Novidades: o estaleiro de construção do Continente de Queluz; passagem pedestre sobre o rio Jamor no Alto dos Moinhos. Incontornáveis: os Arcos Reais ou a Ponte Filipina de Carenque.

Independentemente do sítio e da proximidade, é possível pedalar de uma forma tranquila, à velocidade da respiração e do olhar. Para não cansar e usufruir da paisagem. Sozinho ou acompanhado. E, se não for para longe, é sempre possível dar uma volta pela  pela vizinhança. E até é possível dar um trambolhão, de vez em quando...




 

 

 

 

domingo, 14 de abril de 2024

Coches em Museu


Passámos por lá muitas vezes, algumas pelo jardim de Belém, outras pelo passeio junto da fachada. Mas, ou havia fila ou aparecia sempre outro motivo para não entrar. Cerca de 2011, conseguimos. Ainda o antigo museu alocava a mais famosa “frota” nacional de coches. Entrámos, visitámos, gostámos e testemunhámos. 

https://cordeirus.blogspot.com/2011/11/coches-em-exposicao.html


Cerca de 2 anos depois, aproveitámos o Lisboa Open House para espreitar um novo espaço edificado, a “dois passos” do antigo Picadeiro Real. Ainda nu de peças, o espaço prometia. Ouvimos, deambulámos, voltámos a evidenciar. Estávamos em 2013, no futuro Museu dos Coches.

https://cordeirus.blogspot.com/2013/11/novo-espaco-dos-coches.html


O museu actual, tal como o anterior, não é apenas um espaço de exposição. Aliás, diferente do anterior, não privilegiou envolvências de época ou decorações alusivas. Antes salientou as peças com o alvo das paredes, as dimensões das salas e as perspectivas que se conseguem desde o varandim acima do exposto.

Embora pareça fechado para o exterior, a vizinhança também foi alvo de atenção arquitectónica. Há janelas rasgadas em vários espaços que oferecem horizontes distintos, quer para a zona arborizada do jardim, quer para as margens do Tejo, quer para o Museu da Electricidade. Não ficamos restringidos ao interior, há panoramas exteriores que medeiam o exposto..


A opção pela grande dimensão dos dois salões principais coloca um grande número de peças em cada um deles. A cor branca das paredes, realça os dourados de muitas das peças em exposição.  Tal permite, por um lado, oferecer uma visão global do conteúdo e, por outro, mostrar a diversidade e a quantidade exposta.

Vamos à procura de coches. Estão lá, muitos e belos, além de, berlindas, carruagens, charabãs, carros de caça, liteiras, carrinhos de criança, landaus, cadeirinhas, seges. Sobretudo, arte sobre rodas. E, há mais peças sobre rodas, algumas só com uma. Há, até, botas, pistolas e guitarras. E, ainda, reis, peças de xadrez, miniaturas.

 

Mas são os coches que dominam. Estão lá os dos reis: o de Pedro II, João V, o de José I,  incluindo o de Filipe II. Mas também lá estão: o do Papa Clemente XI, o da Coroação, o dos Oceanos, o do Embaixador. E, ainda os landaus de D. Pedro V e do Regicídio (rei Carlos I), bem como as berlindas da Casa Real, de Maria I, dos Leões e a dos Patriarcas.

 


Os coches mais antigos são do século XVI e XVII, os de Filipe II, Pedro II, Maria Francisca de Sabóia e Maria Ana de Áustria. Os restantes coches são dos séculos XVIII e XIX, bem como as cadeirinhas, os segres, as carruagens e os demais meios de transporte, incluindo os Phaeton, os  Milord, os Clarence e os carros de caça.


Também lá estão, as carruagens de correio (Mala Posta), a do Conde das Galveias e a de Porto Covo, para  além da Carruagem de Gala, da  Berlinda Processional, do  Coche de Carlota Joaquina e do Coche dos Condes da Ericeira. Um conjunto de seges, o Quatro Rodas, o dos Óculos ou o das Plumas, juntam-se à diversidade.



Agora, há mais coches e objectos conexos em exposição, assim como o espaço que lhes é dedicado está mais generoso do que o anterior. Mas, não só. Há mais liteiras, o charabã, mais carrinhos de criança. Pelo menos. O landau do regicídio já estava no espaço antigo, bem como alguns dos coches mais famosos, como seja o coche do Papa.


 

Mas, nem só de coches e afins vive o museu. Nesta altura, também lá estavam duas exposições temáticas. Uma relacionada com os reis e rainhas portugueses, da autoria de Norberto Nunes, um antigo animador e ilustrador de livros infantis, depois empresário de produção cinematográfica, desde 1998 dedicado exclusivamente à pintura.


 

Mas não só. A(s) arte(s) de Norberto Nunes passam pela cerâmica, pela escultura e ainda pela interpretação literária. Daí, a outra exposição temática, esta mais relacionada com os Lusíadas, de Camões, intitulada “E Vós Tágides Minhas..”, onde os brilhos, as articulações entre cores e formas, bem como os temas fantasiados, se combinam num enredo alegre, colorido, divertido e icónico


O painel gigantesco, o enorme jogo de xadrez, as guitarras matizadas, as representações pictóricas da história dos descobrimentos baseadas no’s Lusíadas, os quadros com os diversos monarcas estilizados das diversas dinastias, são algumas das obras do artista que preenchem grande parte do varandim de um dos salões.


 

A restante mostra, identificada como, “E Vós Tágides Minhas..”, está disposta numa das salas contíguas á exposição permanente do museu. Além disso, uma outra sala, mostrava ainda o primeiro automóvel a circular em Portugal, um Panhard e Levassor, de 1895, propriedade de Jorge Feio, Conde de Avilez, uma máquina com tantos cavalos como velocidades, três.

 


Ainda espaço para outra máquina, esta pós-apocalíptica, uma Quadriga de Svamp, denominada Atland Monowheel, da autoria da Companhia Teatral, Custom Circus. Trata-se de duas peças, uma moto e uma espécie de atrelado. A parte moto deriva de uma Harley Davidson de 1986 e o atrelado foi concebido com peças de automóveis vintage americanos. Dizem que se trata de uma máquina do século XXIII, quem sabe, um coche futurista.




quarta-feira, 3 de abril de 2024

Casa-Museu Dr. Anastácio Gonçalves


Vamos a casa de um médico que era coleccionador. É sobretudo essa vertente de coleccionismo e de museologia, bem como, ainda, a arquitectura do edifício, que nos interessa. Estamos a um “passo do Saldanha”, num projecto do arquitecto Norte Júnior.

A Casa-Museu Dr. Anastácio Gonçalves, também conhecida como, “Casa-Malhoa”, mandada construir pelo pintor, foi logo a primeira casa de artista a ser galardoada com o Prémio Valmor, que premeia a qualidade arquitetónica dos edifícios lisboetas. Este galardão é de 1905.

A moradia parece um oásis, quer arquectónico, quer paisagístico, no meio de um ambiente de díspares estruturas e texturas. A dimensão, talvez por diminuta, face aos edifícios envolventes, ou passa despercebida ou, sendo notada, realça-se.

É sobretudo uma enorme janela que se destaca na fachada, denunciando o gigantesco pé-direito que o interior encerra. Lá, percebe-se essa dimensão, ao identificar um varandim ao longo de metade do salão principal. É aí que estão expostas muitas das pinturas do coleccionador Anastácio Gonçalves.

A casa encerra cerca de 3 mil obras de arte, sobretudo pintura, porcelana e mobiliário. Mas também possui mais de uma dezena de núcleos temáticos, contendo peças de, entre outros, ourivesaria, escultura, desenhos, documentos, medalhística ou relojoaria.

Adquirida em 32, a casa esteve na posse do médico oftalmologista, até que, quando da sua morte e por sua vontade, foi criado o museu, inaugurado apenas em 1980, após trabalhos de adaptação, ampliação e beneficiação. O projecto juntou também uma outra moradia contígua, obra do mesmo arquitecto.


A configuração actual data do final de 1997. O ambiente continua a ser de uma elegância que não passa de moda. Costuma dizer-se que quando a harmonia se instala, não há “choques”. Neste caso, o primor rima com o gosto, parecendo que todas as peças se articulam no tempo e no espaço.  

Embora não fosse uma visita guiada, de vez em quando, havia alguém - julgo que o especialista desta casa-museu - a dar informações dedicadas, consoante a melhor atenção que dávamos a um ou outro detalhe, a uma ou outra peça, os porquê, os como, os onde.

Um fogão a lenha, uma braseira, escrivaninhas, presépios, vitrais, quadros de pintores de nomeada, muitas miniaturas cerâmicas, uma colecção de relógios de bolso, contadores e, até, um sistema sanitário clássico, são alguns dos objectos de colecção que aqui se podem observar.