domingo, 11 de novembro de 2018

Um quarto de século de Clube Paneuropean




A ideia era gira: escolher um sítio com bom ambiente onde todos pudessem dele usufruir e aí celebrar um quarto de século do CPEP. Tróia já tinha sido eleita e parecia reunir essas condições. Estimava-se que não fosse difícil concretizar tal projecto. Porém, a realidade, por vezes, ficciona-se.

E, depois, ficamos envolvidos numa trama que temos de ir descortinando para tentar que o final do filme seja uma boa comédia e não uma tragédia. Este também passou pela aventura, sobretudo pelo risco de ficarmos em dívida para com todos. Para com os participantes e para com as entidades fornecedoras de serviços.


Aliás, a aventura ainda não acabou. Os 384 emails que o Mariano diz ter recebido sobre o programa deste Passeio de Aniversário, não chegaram, nem de perto, nem de longe, aos milhentos que trocamos com quase todas as entidades envolvidas neste evento.

Nos dias anteriores, ainda se discutiam diferenças de valores. Desde alertas de última hora para o serviço de autocarro até pedidos de correcção de pagamentos, passando por acertos de horários, reavaliação de espaços, contabilização de vagas, etc, etc. Isto, antes do evento. Depois, é outro filme.

O PRINCÍPIO DA AVENTURA




O fim de época em Tróia limita-se a si próprio, sem resposta, há anos, para este problema sazonal. Mas, nem por isso, os preços baixam, sobretudo os da restauração. Os serviços atenuam-se ou desaparecem. Ou deixam de ter a qualidade que os preços exigem. Com a proximidade do frio e da chuva, Tróia não consegue sobreviver sem grupos. Por isso, os fins de semana de congressos tentam compensar os dias de semana de aridez. Realmente, quase não vê vivalma durante a semana. Foi isso que constactamos quando fizemos o reconhecimento do percurso. Verificamos também que, entre o dia de semana e o fim de semana, o trânsito se mantém diminuto nesta altura. A chuvada antes de Melides no reconhecimento, contrastou com a ventania do evento.



Durante a semana há vagas para tudo, isto é, para o pouco que está disponível. O El Cristo é o único restaurante aberto na marina, aparentemente durante a semana, bem como ao fim de semana, exceptuando os restaurantes das unidades hoteleiras. Os horários dos ferries distendem-se desde o Verão. O espaçamento entre horários de saída pode obrigar a estar uma hora à espera do próximo barco. Na proximidade, os serviços também deixam de estar disponíveis. A maioria das lojas encerram.



Durante a semana só está um café aberto na Praia de Melides. Em Alcácer do Sal, dos dois restaurantes recomendados e com boa vista para a parte antiga, incluindo a colina do castelo, um estava fechado e o outro não tinha lugares para todos. Um autocarro tem de atravessar o rio para nos levar de Tróia às ruínas. As luzes no acesso ao restaurante da praia são da autarquia, as apagadas, e do Troia Resort, as acesas. A ViaVerde na bilheteira tem problemas. O bolo de aniversário tem de ser feito na Comporta. E, mesmo assim, não há velas que cheguem!


(QUASE NÃO) HOUVE ESTRELAS NO CÉU


Na sexta-feira, a temperatura começou a descer. O El Cristo serviu o jantar aos muitos que estiveram presentes e aqueceram o ambiente. Previa-se que, no dia seguinte, houvesse muitas Pans a cumprir o programa. Mas, hoje, havia Noite de Estrelas. Para assistir ao "espectáculo" fomos de autocarro.




O céu estava nublado e, à vista desarmada, era difícil encontrar as estrelas no fim do ponteiro laser do astrónomo que nos acompanhou a observação do céu, enquanto duas historiadoras nos iam embalando o olhar com lendas estelares. Felizmente, houve algumas constelações que se quiseram destacar naquele céu de sexta-feira.  



Sentados em bancos mais dedicados a juvenis, espreitamos pelas lentes de dois telescópios, apontados a um Marte pequenito e, para a Lua, essa a mostrar a sua habitual face esburacada luminosa. A Cassiopeia percebia-se bem, tal como a Estrela Polar. As restantes estrelas empalideceram sob a névoa.




Não deixamos de achar estranho o facto e estarmos sentados em cima das ruínas. Provavelmente, muitos romanos andaram por lá antes de nós e foram dando uso ao sítio. Nessa altura, porém, não eram ruínas arqueológicas. Há dois anos,quando assistimos pela primeira vez ao evento, distribuíram almofadas... mas para nos sentarmos no chão.



Acabámos a noite no bar do Casino, como se a hora mudasse naquela sexta-feira, com a tranquilidade que os astros e os mitos nos devem ter cedido. No dia seguinte, sim, daríamos início ao passeio conjunto de moto, com uma comitiva de 22 motos. 

AO LONGO DA COSTA VICENTINA





O dia acordou luminoso. Da varanda do quarto a Arrábida continuava a ser acompanhada por um Sado aparentemente sossegado e um mar apenas assoreado por uma língua  de areia apostada em engolir a boiá de sinalização que indica o caminho para o rio. Deixamos Tróia a caminho de Melides, passavam quinze minutos das dez da amanhã. O frio acompanhou-nos durante o caminho, ao longo de uma planície onde nem sempre o piso era tão mau como o da zona de Pinheiro da Cruz.



Aliás, são cerca de uma dezena de quilómetros onde as raízesdos pinheiros parecem querer sobreviver aso alcatrão. Na praia de Melides vento e frio mantiveram-se unidos não aconselhando grandes aventuras quer no areal quer fora do “Vapor”, restaurante onde parámos para beber um café, dar dois de conversa e voltar à estrada de modo a recuperar o tempo perdido.




Não fosse aquele azul forte do mar no horizonte, algum odor de maresia que ainda chega a terra e o céu a descobrir-se continuamente e a jornada não teria mais do que as raízes dos pinheiros a misturar-se com a incisiva brisa que nos havia perseguido nos últimos 50 quilómetros. Largamos a praia, atravessamos Melides e apanhamos o IP8, agora também assinalado como A26… a caminho da rotunda que dá acesso ao IC1 que, quase até Alcácer do Sal, possui um dos piores pisos d região há já mais de uma década.


MILHARES DE ANOS NA CRIPTA MUSEOLÓGICA




Desde a Pré-História que a zona é habitada. Depois, chegaram os suspeitos do costume, Fenícios, Romanos, Visigodos, Árabes e, de novo Visigodos agora menos bárbaros do que antes. Até que o nosso Borgonhês mais famoso quis investir mais a sul.


Com pouco jeito para o diálogo e alguma teimosia acerca de modelos edificados, ele e os seus descendentes deram cabo do quase tudo o que os Árabes haviam construído, um pouco por todo o lado. Em Alcácer do Sal, salvaram-se um par de torres, algumas candeias e pouco mais.



Mesmo assim, na Cripta Arqueológica do castelo, uma espécie de subterrâneo multicultural, o nome de Alcácer - pequena vila fortificada, composta por casas, armazéns e outras estruturas colectivas – ganha sentido quando se descobrem estruturas milenares na colina do castelo.

E, na verdade, o que encontramos na Cripta são vestígios da Idade do Ferro que remontam ao século VII a.C., bem como estruturas do período romano e da ocupação islâmica, além de muros medievais da época cristã pós-reconquista. Julgo que todos gostamos das explicações, sucintas e essenciais da visita guiada.

São os romanos que conseguem deixar os alicerces mais robustos na Península. Aqui, tal é notório nos arruamentos mais evidentes, nas valas de esgotos, bem como no santuário, para além das paredes de edifícios urbanos. Tudo isto, mediado por estruturas que estendem por 27 séculos. É obra!


SABOR A MARROCOS



Mas não foram apenas os vestígios históricos que nos levaram para o ambiente, mas sobretudo para a memória de países árabes por onde já andamos. Foi um Moscatel de Setúbal, servido a preceito e acompanhado por aperitivos tão simpáticos quanto a nossa atracção por aquele cenário, que nos entreteve entre visitas.

Por iniciativa e investimento do nosso organizador, José Menau, produção de Isabel Menau, apresentação e serviço de Mónica Menau e amiga, os participantes puderam usufruir de um aperitivo antes de almoço, que muito fez lembrar um outro, servido pela irmã do Zé, no nosso segundo passeio a Marrocos, em El Jadida.



Depois de aguentarmos tantos séculos de cultura, o Moscatel libertou-nos daquela herança e convidou-nos a entrar na Pousada do Castelo de Alcácer do Sal, a visitar a igreja do antigo convento, cujo “pé direito” impressiona, e ainda a percorrer o claustro junto do qual iríamos almoçar.



A logística assim havia aconselhado: local de visita e de almoço deviam ser os mesmos. E assim foi, Cripta e restaurante praticamente contíguos. Embora o espaço do restaurante seja luminoso, amplo e com vista quer para as muralhas, quer para o claustro, algumas das “bochechas” foram servidas frias…


CAIS PALAFÍTICO SOB TORMENTA




Vinte e cinco quilómetros depois, invadimos o areal do Cais Palafítico da Carrasqueira. O vento preveniu-nos imediatamente de que andar por cima daquelas travessas de madeira pode ser assustador. Sobretudo quando a maré trepa rapidamente. Não é caso único em Portugal. Mas é capaz de ser o mais conhecido.



Não há disto na Europa. A grande dificuldade dos pescadores da Carrasqueira em alcançar águas navegáveis imediatamente a partir de terra firme, ditou a construção daquelas estruturas que facilitam o acesso ao rio sobre o lodo que fica visível na maré baixa.Aquela espécie de marina de arquitectura popular tem cerca de sessenta anos a servir de ancoradouro aos pescadores locais.


Em conduções normais - afinal estamos numa das margens do rio Sado - o Cais é sinónimo de tranquilidade, quer pelo sossego das águas, quer pela ausência de vento. Desta vez, porém, as ondas quase passavam sobre os passadiços e a ventania parecia não querer deixar-nos andar direitos ao longo dos diversos cais onde, junto destes, os barcos balouçavam como varas ao vento. Não nos demoramos muito.

POUCO SOLTRÓIA



Quando deixamos o Cais, o vento instalara-se para ficar. Mesmo no estacionamento de Soltróia o tempo estava desagradável. Perto da praia, pior ainda, soprava forte. Parecia estar a dizer-nos para nos despacharmos e rumarmos ao hotel para a Assembleia Geral do Clube.

 

A praia que, no Verão, os golfinhos visitam, onde é possível estar com o cenário da Arrábida em frente dos olhos, e onde a água do mar de temperatura logo após o primeiro mergulho, estava deserta. Também não nos demoramos muito ao abrigo do bar da praia.


AG NO CENTRO DE CONFERÊNCIAS




Não foram apenas as farmacêuticas a reunir ao fim da tarde. Por volta das sete, o CPEP estava em peso na sala Guadiana do Centro de Conferências do Design Hotel, em Tróia. Sem grande pompa, mas muita circunstância, sentamo-nos em redor da sala, fisicamente longe, mas solidariamente perto uns dos outros.

A (re)eleição do novo presidente do Clube recaiu sobre o anterior, que já leva uns aninhos de experiência no cargo. Serão mais dois, de acordo com a maioria dos votos expressos. A discussão sobre o futuro do Clube passou também e sobretudo pelas diversas hipóteses avançadas para gerir a cada vez maior escassez de Pans.


JANTAR NA PRAIA




Por volta das oito da noite, o frio mantinha-se. Ainda assim, a meia dúzia de minutos que nos separavam do bar da praia não foram suficientes para nos enregelar. E lá fomos, em fila indiana, sobre o passadiço que nos entregou no Beach Bar / Steak House do Troia Resort.


Um pavilhão em madeira, mesas corridas, ambiente aquecido, muitas janelas, vista de mar e serra e muitas lâmpadas daquelas que dão cabo das fotografias. Bifes gostosos e tenrinhos, vinho saboroso, sobremesa aceitável, serviço sem pechas. Até ao abrir das garrafas de champagne e corte do bolo.



Entretanto, a cerimónia de comemoração dos 25 anos do Clube Paneuropean de Portugal passariam pelo reconhecimento do empenho do Arlindo Matos, que todos os anos organiza um Passeio na sua zona, talvez o evento mais antigo organizado por um sócio.



Depois, um agradecimento aos sócios organizadores deste evento, seguido do habitual brinde e do apagar das velas. Velas, que se ficaram por 7, 2 correspondentes aos 20 anos e mais 5 para compor o ramalhete. Não foi apenas a escassez de serviços, mas também a penúria de produtos a caracterizar o evento.

Pior foi o serviço de abertura e distribuição de champagne, aberto na cozinha longe dos presentes, colocado em lugares onde não estava ninguém, deixando apenas uma garrafa na mesa do bolo. Talvez tenha sido a marca, Moet & Chandon, a criar algum desassossego… logo quando a iniciativa e o custo da oferta, quer do bolo, quer do champagne, partiram do empenho do sócio José Menau.


Porém, a festa de aniversário superou o episódio, sobretudo quando, todos os sócios presentes foram chamados a receber uma lembrança desta efeméride, uma placa alusiva ao 25º aniversário do Clube Paneuropean de Portugal. E que será posteriormente distribuída pelos restantes sócios que não puderam estar presentes.


Mágoas houvesse, teriam ficado saldadas na continuação da comemoração que, naquela noite gélida, encontrou de novo no espaço do Casino, mais uns bons momentos de convívio, ao som de música ao vivo de um grupo de jazz/blues.


ESPREITAR TRÓIA E SETÚBAL DESDE SÃO FILIPE





A manhã de domingo não afastou frio nem vento. Depois de uma luta infrutífera com uma ViaVerde avariada na bilheteira do cais do ferry, rumamos a Setúbal. O rio estava mais calmo do que o esperado, as motos não abanaram tanto como na estrada e o ventinho gélido ainda nos obrigou a estar protegidos pela amurada.





Destino, fortaleza de São Fiipe, situada a meia encosta, no início da Arrábida. Não mais que dúzia de minutos. Saímos do ferry, percorremos praticamente toda a avenida Tody e trepamos a colina, percebendo aqui e ali que o panorama do cimo seria agradável.

Estacionamos próximo da entrada, ao abrigo das muralhas e fomos subindo o túnel que leva ao pátio exterior. Dali, a vista sobre Setúbal e Tróia é esplêndida, quer da esplanada, quer do pátio que ocupa o topo de parte do telhado da fortaleza.


Visitamos a parte interior do edifício, já recuperada, que compreende várias salas de estar, pequenas mas decoradas com gosto. Consta que as restantes instalações estão a ser renovadas para voltarem a acolher pessoas na antiga Pousada.

Às tantas, saímos e voltamos a entrar. Faltava a foto de grupo agendada para o pátio mas que entretanto havia sido preterida face aos milhentos pontos de interesse do lugar. Acotovelamo-nos no túnel, escada acima, escada abaixo, e conseguimos sobreviver a duas ou três posses de grupo.


Voltamos à caravana a caminho do Vela Branca, um restaurante recente com espaço contado, resvés com a respectiva lotação. O sítio é agradável, tem vista sobre a zona nova de Setúbal junto ao rio e sobre a península de Tróia e parte da Arrábida. Espreitando para sul por entre os pinheiros, da esplanada e mesmo do interior do restaurante, é facilmente reconhecível o Hotel Design que havíamos deixado um par de horas antes.

A esplanada teria sido o local ideal  para almoço, mas o frio obrigou-nos a almoçar dentro de paredes. Entretanto, ao longo do almoço em muitas outras coisas, fomos delineando algumas perspectivas sobre o próximo ano do CPEP, sobretudo  no que respeita ao Passeio Internacional, ainda sem destino ou datas definitivas, mas já com algumas ideias em desenvolvimento.


Por volta das três da tarde, começamos a despedir-nos e a deixar o restaurante. Primeiro os que vinham de mais longe, depois os de mais próximo. Para o ano há mais, com mais ou menos Pans, mas com os habituais suspeitos destas andanças que o Clube vai apadrinhando!



Música
Chieli Minucci, Daybreak Live




terça-feira, 7 de agosto de 2018

Instantes de Tóquio: Cultura Popular



Há pouco tempo, trouxe aqui o tema do "outro mundo".
A cultura japonesa insere-se nesse contexto. 
A representação de personagens, o modo de vestir ou a realização de rituais, são elementos culturais comuns à humanidade. 
Porém, cada sociedade molda os seus. 

COSPLAY / ASSUMIR UMA PERSONAGEM




Um dos temas mais atraentes da cultura humana é o das representações, das representações colectivas, das experiências colectivas, da assumpção de desempenhos onde o 'eu' dá lugar ao 'outro'.  
A relevância vai para os papéis que cada um (re)presenta nos diversos palcos/colectivos da vida.
Todos nós, de alguma maneira, somos actores / desempenhamos um papel na vida, no mundo, no grupo. 
Também na escola, na empresa, na equipa, em casa, entre os amigos. 
Esse papel pode contemplar, também, para além de expressar comportamentos e carácteres, uma representação visual.


O Cosplay é um caso desses. 
Enquanto representação de uma figura, transfere para o sujeito ou empresta ao sujeito, uma personalidade. 
Disfarce ou fantasia, cópia ou original de uma personagem, tanto faz. 
Realidade e/ou ficção misturam-se nesta actividade lúdica que tem uma grande componente visual.
Como muitas das manualidades japonesas, o Cosplay tem uma componente artística significativa. 
Uma arte que transforma, que cria ou sobretudo reproduz personagens. 
 proximidade com o ou a personagem define o ou a artista.


Tal assumpção, revela-o individualmente e no seio do grupo. 
Ao assumir o papel de uma figura/personagem – mesmo que adaptada e/ou inventada – o protagonista, o Cosplayer, adopta esse papel / essa personagem, como sua, como sua máscara.
A motivação está nos livros de manga, num jogo ou num filme. 
De um deles, sairá o/a personagem cujo aspecto e personalidade será copiada fielmente. 
Depois, no espaço público, valem a exposição, exibição ou mesmo a competição.


A exposição é aproveitada comercialmente, por exemplo, para publicitar um aloja ou um produto, divulgar uma prática ou simplesmente “chamar a atenção” qualquer outra coisa ou qualquer lugar, com seja, um restaurante. 
A exposição, tão controlada, regrada, evitada no Japão, tem lugares precisos para acontecer com mais frequência e com menos pressão social. 
São os casos das grandes avenidas ou ruas/zonas comerciais, Takeshita ou Shybuya, ou em zonas mais alternativas, como seja, Harajuku.


Assumindo a regra de que, “em Tóquio, sê japonês” -, e fotografar pessoas não é das actividades mais bem-vindas por parte dos locais -,
associado à aversão a fotografar desconhecidos, 
as imagens de cosplayers aqui reproduzidas são mais informativas do que estéticas.

Talvez menos polémico e, possivelmente mais sugestiva, as imagens de pessoas envergando trajes tradicionais,
não chegam a contrastar com os cosplayers, já que também estes são, hoje, raros de ver. 
Sobretudo, em ambientes públicos exclusivamente urbanos.  

QUIMONO / VESTUÁRIO TRADICIONAL


Kiru (vestir), Mono (coisa), “coisa de vestir” em linguagem ocidental, dito Quimono, é um dos trajes tradicionais do Japão. 
Pelo menos, omnipresente até meados do século XIX, quando o Japão enfrentou nova pressão ocidental com a concorrência de modas estrangeiras.


Para nós, o quimono tornou-se num símbolo nipónico e, como tal, também uma forma de os ocidentais, experimentarem/encaixarem a/na cultura japonesa. 
Talvez por isso, se vejam muitos ocidentais vestidos com quimonos a tirarem fotografias nos parques da cidade.


Mesmo assim, alugando, para além da habilidade, ou necessidade de pedir a alguém que saiba para vestir um quimono e obi (cinto), estimo que tal empresa não seja barata. 
O custo dos quimonos, especialmente os de seda, é muito elevado.


Hoje, mesmo no Japão, o uso do quimono está confinado a cerimónias artísticas tradicionais – festivais, cerimónia do chá, - em cerimónias protocolares ou em ritos de passagem, como sejam formaturas, casamentos ou funerais.

SAKURA MATSURI / FESTA DA PRIMAVERA


O cuidado, o gosto e a (quase) veneração que os japoneses dedicam ao mundo vegetal, sobretudo às flores, estão enraizados na cultura há milhares de anos. 
E, não estão apenas relacionados com as referências mais importantes, 
crisântemos ou cerejeiras, por exemplo.


A proliferação de parques, mas especialmente o preenchimento dos mais recônditos espaços com flores é prática comum. 
Apesar da escassez de espaço, os passeios alinham vasos ou canteiros de flores, que se estendem às portas das lojas.


Porém, a época de floração da cerejeira é ímpar. 
A flor da cerejeira é um símbolo nacional japonês, uma espécie de esfera armilar ou cinco quinas para os portugueses. 
O Festival das Cerejeiras ou Festa da Primavera é um dos pontos altos das celebrações colectivas do Japão.


Conhecida como Sakura, a flor de cerejeira, considerada como flor nacional do Japão, tem uma floração muito curta, mais ou menos duas semanas. 
Essa particularidade efémera ligou-a, pelo menos de forma existencial, à precaridade da vida, à fragilidade da existência humana.


Essa associação à vida fugaz sem medo, mas também ao aproveitamento intenso da existência, 
estabeleceu-se ferinamente na vida dos samurais, 
através do seu severo mas lúcido código, Bushido, o caminho do guerreiro.


Tal como a Primavera, que dá rapidamente acesso ao Verão, também a floração da cerejeira é rápida e curta. 
Em pouco tempo, as flores cairão e serão levadas pelo vento. 
Por isso, enquanto perdura, há que apreciar cada momento da sua existência. 
Daí, também, a sua popularidade, o seu elogio, a sua simbologia. 
Dai o Festival.


As fotografias mostram um cenário belo e deixam uma ideia sublime. 
O manto e a suavidade da cor dominam a paisagem. 
A luz que o branco rosado empresta ao ambiente é algo que se percebe rapidamente nas fotografias das sakuras.


Porém, entre a realidade, o estar lá, e a representação do que lá está, a fotografia, vai uma distância significativa. 
Em dimensão, cor, aroma, composição, enquadramento. 
Como em tantos outros aspectos e situações, estar lá, além de regalia, 
é aferidor e garantia de que, “ao vivo”, o quadro estético é uma obra-prima.


Essa beleza alastra ao longo dos rios e dos canais. 
Perto do apartamento, em Sumida, um dos canais adjacentes, estava marginado por irrepreensíveis alinhamentos de cerejeiras. 
De tal forma compactas que, também ali, dava a impressão de as árvores estarem cobertas por tapetes de flores rosadas.


O tapete de sakuras estende-se ao longo de ruas e preenche muitos espaços nos parques. 
Junto dos templos ou em redor dos lagos, muitas parecem ter sido esculpidas,
 para se harmonizarem com o ambiente, sobretudo com o relevo e com outras árvores.


No interior do Palácio Imperial – assim como no Goyen Park ou mesmo no Ueno Park - parecia haver árvores especialmente tratadas, 
para que os respectivos ramos se estendessem de forma estilizada na paisagem. 
E não é apenas essa condição que se revela, 
talvez seja mesmo a omnipresença dos ramos floridos que domina todo o espaço.


É um privilégio pode estar dentro daquele cenário, fazer parte daquela realidade, num período tão breve. 
Estar no meio de milhares de cerejeiras floridas é realmente um evento, um espectáculo, um momento, uma sensação inolvidável, 
mas sobretudo uma ocasião para (re)ver/fruir a nossa relação com a natureza.


O vento completa o cenário, animando-o. 
Com a aragem, as flores executam pequenos voos ou caem em conjunto originando “chuvas de pétalas”. 
O manto que antes se estendia pelos ramos das árvores, passa a cobrir o chão como tapete.


Toda aquela beleza, espectáculo, tranquilidade, também parece ter uma função relacionada, mais uma vez, com a harmonia, com o equilíbrio dos contrastes. 
Em redor dos parques, em redor das cerejeiras, o que prolifera são os prédios, 
alguns enormes, outros demasiado “cinzentos” e, por tal, antíteses daquela beleza.

 

Não serão apenas as cerejeiras, nomeadamente na sua fase de floração, a contrabalançar esse contraste entre o urbano construído e a área vegetal.
 A existência de tantos, de muitos parques, alguns de pequena dimensão no extremo dos bairros, é só por si compensadora da “selva de construções”.


Os japoneses, que tanto tempo passam nessa área “cinzenta”, entregam-se de corpo e alma ao festival. 
O Parque Ueno estava pleno de grupos de famílias, de amigos, de colegas de trabalho, a fazer piqueniques sob as frondosas cerejeiras.
Mesmo considerando alguma falta de comodidades implicadas num piquenique, como seja, sentar em cima de oleados, o tempo estar fresco, encontrarem-se sob o olhar de milhares de turistas, o número de convivas era impressionante.


Música: Kitaro, Matsuri