quarta-feira, 4 de maio de 2016

Algarve, Marafado de Bom





Não era preciso inventar outro. Este título calhava como ginjas. Furtei-o à Zeza. Aliás, para além do bom tempo, bom mar, bom céu, boa praia, bom ar, o que é que se espera do Algarve? Se a isso juntarmos meia dúzia de amigos que já se conhecem desde os tempos do liceu, o Algarve converte-se realmente em marafado de bom.
Por alguma razão a Zeza o escolheu para mote das mensagens que todos fomos trocando acerca de um encontro em faro. Eram mensagens que diziam da vontade, da expectativa e do programa do fim-de-semana. Daquela mensagens convincentes, sem política nem propaganda. Vale a pena, não vale?
Tal como esta data emblemática em matéria de mudança, também nós a aproveitamos para ir ao “sul da Europa”, como diz habitualmente o Rui. Também por lá a mudança aconteceu, no tempo, no ar, no céu, no mar e na praia mas, sobretudo, no nosso estar. Um dilema, “estar lá e escrever aqui”, como diria um tipo que tive de ler na faculdade, Clifford Gertz? Ou um prazer? Vou por este último.

PASSEIO EM CABANAS

Saímos à boleia dos ‘Pepes’. Chovia, em especial no Alentejo mas, à medida que íamos ‘descendo’, o temporal ia mirrando. Na Via do Infante já pouco pingava e quando chegámos a Cabanas o céu já estava azul, não tanto como os frisos decorativos que circundam habitualmente as janelas e as portas algarvias.
Almoçamos no Sabores da Ria. Peixe, infalivelmente. Foi barato. E estava bom, assim como o espelho azulado da ria que já indiciava um fim-de-semana catita. Simpática é também a plataforma pedonal que margina Cabanas junto à ria, uma espécie de açoteia para passear sobre a água. Fomos por lá, antes e depois de almoço. Até as compras’ estavam abertas!

POUSADA EM FARO

Sabíamos que era perto da zona histórica, mas não sabíamos que tinha história. Parámos próximo de um muro comum e da fachada de uma moradia antiga, ambos luminosos de branco. Lá dentro, porém, traços modernos, espaços amplos, linhas direitas, contrastes, harmonias, superlativos para nos sentirmos bem.
Estávamos em casa da Zeza, quase paredes-meias com o Centro Interpretativo de Faro. Fomos para lá, espreitar a memória da cidade, desde a época romana até hoje, que passava especialmente pelo terramoto de 1755 e também afectou a cidade e a região.

CENTRO HISTÓRICO

Escadas acima e estávamos e estávamos quase de mãos dadas com uma comunidade de cegonhas que guarda o relógio da torre. Nunca tinha visto um ninho de tao perto, o que permitiu verificar que a respectiva arquitectura é complicada. E estes tinham, pelo menos, duas ou três assoalhadas.
A comunidade de cegonhas tem aqui um "peso" significativo. Depois de reivindicar os telhados, conseguiu também um lugar privilegiado junto do relógio da torre. Preparar-se-à para exigir que aqueles bicos tão salientes no telhado não lhes façam concorrência.
Das açoteias vislumbra-se um misto de telhados com telhas de barro e açoteias da zona histórica, notando-se também a irregularidade do traçado das ruas. O sol realçava as cores claras e estas contrastavam mesmo assim com o azul de um céu quase limpo, a prometer um fim-de-semana de estalo.
Passamos ainda pelo bar Castelo, na zona antiga em frente à antiga fábrica de cerveja, e sentamo-nos para o primeiro de muitos brindes da jornada. A paisagem desde a esplanada é deliciosa. As imagens do pôr-do-sol não precisam de talento fotográfico.
Aliás, em ambientes em que impera a proximidade com outros que conhecemos bem, a paisagem passa a ser acessória, motivo de, ou melhor, inspiração para recuperar mais uma memória ou accionar uma actualização.

PARABÉNS!


Um dos motes, se não o principal da jornada, foi o aniversário do Quim. No jantar de aniversário, voltamos aos brindes e à boa conversa entre os aperitivos e o arroz. O fim-de-semana, que já era uma data especial - contemplava o “25 de Abril” – trouxe além do aniversário outras pessoas ao nosso convívio.
Já não éramos os “suspeitos do costume”. Para além dos “9 da ordem”, contávamos com mais dois elementos do antigo Liceu Nacional de Queluz, a Nice e o Tó Campos, com quem fomos partilhando as novidades de anos – também ouvi, séculos – de distância.

ILHA DO FAROL


Juntámo-nos em Olhão, já estava quentinho e havia fila para comprar bilhetes. Partimos num barco repleto de aficionados da praia e do bom tempo - e não se notava grande diferença face ao ambiente de Agosto (estava mens gente...) - sendo que muitos eram turistas estrangeiros e outros parecia não me verem há décadas...
Chegamos ao cais da ilha pouco menos de meia hora depois, seguidos por um canoísta em boa forma e cujo remar aproveitou a boleia do barco. Foi uma estreia. Eu nunca tinha ido à ilha do Farol. O canoísta, esse, deve ir e vir todos os dias e chamar-lhe casa.
Entre conversas cruzadas e a ilha da Culatra – que antecede a do Farol. O farol vê-se bem ao longe, como é conveniente. É o edifício mais alto da ilha, contrastando com as casas térreas e as dunas baixas. Nota-se a sua magreza espetada como um alfinete nas areias da ilha.
Contende também com os edifícios mais altos da parte nova, poente, de Olhão. A praia da ilha, essa, é a “perder de vista”, já tinha fregueses e a água tentava ao mergulho. Hoje, porém, nem sequer a avaliamos. Entretanto, o tempo aquecera ainda mais tal como estava previsto.
Depois das caipirinhas no bar da praia, o que cotámos e bem, foi o arroz de lingueirão que estava especialmente bem feito. Almoçamos num restaurante de praia que estava previamente reservado. No Verão, é impossível ter aquele serviço e provavelmente o esmero gastronómico.

OLHÃO HISTÓRICO


Saímos do barco direitos à esplanada para fazermos um pleno de águas. Depois, avançamos para os meandros da zona histórica, acompanhando o percurso das lendas assinalado por esculturas representativas de cada história. Começamos pela “tradicional” lenda da moura…
O menino dos olhos grandes - tal como a moura anterior que qual sereia levava os marinheiros a afogarem-se também perdia os homens - possuía um a espécie de encantamento cujo choro levava as pessoas a pegarem-lhe para depois aumentar de peso até não ser possível levá-lo. Sendo cromado, percebe-se que não era leve…
Passamos por muitas habitações renovadas há pouco tempo, por entre ruas estreitas, sombras apetecíveis, fachadas alvas, açoteias, que fazem lembrar Marrocos. Aliás, os passeantes também já começavam a parecer marroquinos. O bronze, porém, só se notou melhor no dia seguinte.

Podíamos ter zarpado para outras paragens. Porém, parece que temos a curiosidade ainda com poucos quilómetros e fomos ao sabor das vielas tentando descobrir mais lendas, outros espaços, melhores impressões. 
Esta zona está muito agradável. Reconhece-se um esforço de melhoria e a manutenção da traça. Por vezes, surpreendem-se açoteias que fazem imaginar espaços exóticos, seguramente excitantes de quentes no Verão. E nem faltou um gato com uma serenidade adequada à vetustez dos azulejos e da janela. 


JANTAR DE GALA

Não há encontro que não tenha um jantar de gala. É pretexto, evidentemente, mas dá aquele ar institucional (que não n diz nada…). Desta feita, aconteceu no último piso do Hotel Faro. Jantámos com a marina e a “baixa” as nossos pés, embalados pela magia dos brilhos que se percebiam numa noite límpida.

E do jantar, não fotografias!?

Jantamos um tornedó de atum honesto entremeado com as retrospectivas da manhã e da tarde e ainda com as expectativas do dia seguinte. Tivemos tempo de sobra para ainda experimentarmos a temperatura fina que envolvia a varanda do último piso e meter o dedo na cálida água da piscina.

E do jantar, não fotografias!?

Faro não tem edifícios muito altos no centro. Daí ser apelativo estar alto e olhar para fora sem o incómodo de estar a ver outras janelas no horizonte próximo. Mais, permite ver o ambiente em redor, por exemplo, a feira de produtos típicos que se estendia em pleno jardim Manuel Bivar.
A noite não acabou ali. Ainda voltamos ao bar do Castelo para pôr a escrita em dia. Relegados para a esplanada – o interior estava pleno de concorrentes de um trivia challenge – pudemos constatar que a temperatura da noite não estava muito diferente da diurna.

PASSEIO NA RIA FORMOSA


A manhã esperou por nós até garantir que a temperatura estava perfeita. De ténis calçados, abrimos por um trilho que sai pouco depois da rotunda que leva ao aeroporto de Faro. A entrada no caminho fica praticamente no enfiamento do corredor de aterragem. Dizia-se que dali é possível ver a cor dos olhos ao piloto.
Mas não foi preciso. Pese embora o ruído, o ambiente cativa imediatamente os sentidos. Luz, espaço, cor, não faltam. Em linha recta, vai-se até à Quinta do Lago. Ao longe, sobre a esquerda, veem-se ao longe as casas da ilha de Faro, minúsculas a preencher a linha do horizonte. Do lado da Quinta, mal se veem os telhados.

Em redor do trilho, anda a água a tentar escapulir por onde pode, entre tufos em meandros à volta de pequenas ilhas. O verde e o azul conjugam-se com a cor da terra seca, parecendo que se formam pequenos lagos desde o trilho até à ilha.
Com o calor a aumentar e o sol a sentir-se cada vez mais agressivo na pela, sobrou uma ligeira brisa que conseguiu apaziguar o passeio de regresso. Este iria terminar junto de uma fila imensa de veículos que, enquanto durarem as obras na estrada, vai provocar alguma morosidade no acesso à ilha.

ILHA DE FARO


Nada porém que nos impedisse de ir espreitar a praia e sentir a temperatura da água nest 25 de Abril. Não foi precisa qualquer senha revolucionária para reconhecer que ainda não chegado o Dia do Trabalhador, já não apetece fazer nada, se não dar uns valentes mergulhos naquela água tão tépida e aprazível.
Daí a pouco estávamos no restaurante Elementos, numa esplanada virada para Faro, coberta por um céu azul, límpido, sentir uma ligeira brisa refrescante e envolvidos por uma luz única. Desta vez, para além do tempo de Verão, o destaque da refeição foi para as pontellitas e para o polvo.

Deixámos os nossos anfitriões com garantias de que havíamos de voltar. Agora, que o Verão parece ter chegado – neste 25 de Abril a temperatura chegou aos 25º - começa a contagem decrescente para as apelidadas férias grandes.
Ou que se querem grandes, como foram estes três dias, durante os quais voltamos às mesmices que nos asseguram aquele gozo que nos permite continuar a partilhar o tempo de que dispomos, e que, com amigos tem dias marafados de bons.
A tarde manteve o brio e o bom tempo estendeu-se até Lisboa. Vale a pena repetir. Para breve, como habitualmente. O título da música que acompanha o vídeo está por acaso. Como habitualmente.

Música - Area, Gerontocrazia