* "de monte em monte", em basco
O alvo era agora Siguenza, um burgo medieval situado a cerca de duzentos quilómetros de Saragoça. Chegámos ao fim do dia, após percorrermos uma "municipal" cálida e inóspita. Quando o alaranjado do ocaso iluminou as muralhas egrégias do castelo, erigido sobre uma colina que domina o casario da pequena encosta, pensei que descobrir Shangrila ou El Dorado devia ser semelhante. Aproveitámos um preço promocional da pernoita no Parador, mas declinámos o orçamento do pequeno-almoço. Lá dentro, encontrámos uma placa que relacionava Urraca, tia de Afonso Henriques, com o foral da vila e com o castelo. Desvendámos também um ambiente apropriado ao lugar, onde a pedra invadia as paredes, a madeira enfeitava os tectos e as dimensões das salas subjugavam. O passado ainda existia ali.
Do pátio, a vista apossa-se das muralhas em toda a volta, das pequenas janelas dos quartos, do poço central e de algumas varandas que prolongaram os aposentos mais atractivos. Fora, percebe-se imediatamente uma pequena barbacã que antecede a porta principal. Foi essa que nos defendeu a Pan durante a noite, adormecida aos pés de um dos torreões. O castelo estava em ruínas quando foi transformado em Parador. Salas, átrios e muralhas foram recuperadas e favorecidas; as paredes preenchidas com tapeçarias, quadros e espelhos; os tectos com ripados de madeira e candeeiros de ferro. Estivesse a pedra mais tosca e a sensação de outrora seria ainda mais notória.
Banho, roupa decente, observações ligeiras, e novo périplo pelos corredores do segundo piso. Descobrimos um átrio envolvido por quartos. Devia ser uma das torres que fechava dois panos de muralhas. Depois, descemos uma escadaria larga, passamos por duas armaduras que guardavam o salão e desembocámos na recepção. Foi lá que entregámos a chave da fortaleza. Rua abaixo, deixamos as ameias a argentar com o fim do dia. As casas são invariavelmente em pedra. Algumas têm datas remotas esculpidas por cima das portas, muitas ainda com arcos de volta perfeita. A igreja das Clarissas mostra-se com um pórtico particularmente interessante. A Calle Mayor leva à Plaza Mayor. Dessa centralidade, abarca-se a catedral, o palácio do Ayuntamiento, o museu Diocesano. A loja de artesanato, na imagem acima, é uma delícia de novidade cerâmica e de gosto nas peças expostas.
Julho 2009
Lisboa ficou para trás, tal como em outras tantas ocasiões que vão para mais de trinta anos. A ponte 25 de Abril voltou a ser, além de uma “passagem para a outra margem”, uma ponte para a viagem. Quando atravessámos o Tejo ainda estava fresco e o trânsito fluido, mas o sol já nos indicava a leste que a jornada seria soalheira. Até à fronteira, não havia programa. Era cumprir a solidão da A6 até Badajoz. Aí sim, podia haver compromisso: visitar o Ricardo, um antigo mecânico que trabalhara com o Armando Borges, e que hoje possui uma oficina na cidade espanhola. Não estava. A opção foi beber um café na Venta de Don Jose, na saída de Badajoz para Madrid, e reconhecer que até o Paulo Futre lá parava, pelo menos para ficar na fotografia com o dono.
Depois, quisemos nutrir ainda mais a nostalgia. Durante anos a fio percorremos de moto a “nacional” que levava a Madrid, quer fosse para assistir às provas no circuito de Jarama, quer para ir além Pirenéus. Próximo da ponte que atravessava o Tejo na região de Almaraz, era costume parar para reabastecer, após concluir umas quantas curvas valentes, algumas delas autênticos ganchos. A esse troço, chamávamos-lhe “serra” e terminava aqui junto do lago que o Tejo formava. Hoje, o restaurante está em ruínas e o posto de abastecimento já não existe. Se alguma saudade existia, pareceu melancólico lá passar. Madrid, atravessámo-la pela habitual M40. Estava quente, mas o trânsito corria suavemente, adensando-se à saída da capital sensivelmente até Guadalajara. Parámos para descansar e repor líquidos junto à Calle Mayor. O calor mantinha-se acima dos trinta e cinco e, surpreendentemente, os blusões já pingavam (!), uma estreia em matéria de viagens de moto.
Depois, quisemos nutrir ainda mais a nostalgia. Durante anos a fio percorremos de moto a “nacional” que levava a Madrid, quer fosse para assistir às provas no circuito de Jarama, quer para ir além Pirenéus. Próximo da ponte que atravessava o Tejo na região de Almaraz, era costume parar para reabastecer, após concluir umas quantas curvas valentes, algumas delas autênticos ganchos. A esse troço, chamávamos-lhe “serra” e terminava aqui junto do lago que o Tejo formava. Hoje, o restaurante está em ruínas e o posto de abastecimento já não existe. Se alguma saudade existia, pareceu melancólico lá passar. Madrid, atravessámo-la pela habitual M40. Estava quente, mas o trânsito corria suavemente, adensando-se à saída da capital sensivelmente até Guadalajara. Parámos para descansar e repor líquidos junto à Calle Mayor. O calor mantinha-se acima dos trinta e cinco e, surpreendentemente, os blusões já pingavam (!), uma estreia em matéria de viagens de moto.
Do pátio, a vista apossa-se das muralhas em toda a volta, das pequenas janelas dos quartos, do poço central e de algumas varandas que prolongaram os aposentos mais atractivos. Fora, percebe-se imediatamente uma pequena barbacã que antecede a porta principal. Foi essa que nos defendeu a Pan durante a noite, adormecida aos pés de um dos torreões. O castelo estava em ruínas quando foi transformado em Parador. Salas, átrios e muralhas foram recuperadas e favorecidas; as paredes preenchidas com tapeçarias, quadros e espelhos; os tectos com ripados de madeira e candeeiros de ferro. Estivesse a pedra mais tosca e a sensação de outrora seria ainda mais notória.
Banho, roupa decente, observações ligeiras, e novo périplo pelos corredores do segundo piso. Descobrimos um átrio envolvido por quartos. Devia ser uma das torres que fechava dois panos de muralhas. Depois, descemos uma escadaria larga, passamos por duas armaduras que guardavam o salão e desembocámos na recepção. Foi lá que entregámos a chave da fortaleza. Rua abaixo, deixamos as ameias a argentar com o fim do dia. As casas são invariavelmente em pedra. Algumas têm datas remotas esculpidas por cima das portas, muitas ainda com arcos de volta perfeita. A igreja das Clarissas mostra-se com um pórtico particularmente interessante. A Calle Mayor leva à Plaza Mayor. Dessa centralidade, abarca-se a catedral, o palácio do Ayuntamiento, o museu Diocesano. A loja de artesanato, na imagem acima, é uma delícia de novidade cerâmica e de gosto nas peças expostas.
Na vila ainda se reconhecem várias "portas" que davam acesso ao interior do burgo medieval.
É por uma que verificamos apenas deixar espaço à passagem de um carro. As ruas são estreitas e o chão é em paralelos ou laje. Há muitas habitações em recuperação. Uma torre que liga dois panos de muralhas ainda mostra a grande dimensão da zona urbana medieva.
Mais tarde, foi procurar restaurante, espreitar uma possível entrada na catedral pelos "fundos", devorar meia dúzia de tapas, e deambular pelas ruas iluminadas sob o ocre das luzes baixas. É por uma que verificamos apenas deixar espaço à passagem de um carro. As ruas são estreitas e o chão é em paralelos ou laje. Há muitas habitações em recuperação. Uma torre que liga dois panos de muralhas ainda mostra a grande dimensão da zona urbana medieva.
O dia acabava com um ar cálido, com os vizinhos a conversar na rua, e as muralhas do castelo a reflectirem prata.
De manhã, tomámos o pequeno-almoço (ensurdcedor) ao som dos sinos da catedral.
Saímos depois das dez da manhã para percorrer a campina castelhana e passar para os enrolamentos de Navarra. Com efeito, para norte de Siguenza, o relevo transforma-se. Há planícies com salinas ou culturas cerealíferas, interrompidas com pequenos montes, alguns com uma cobertura escura que parecia xisto. Aliás, o cenário daquelas encostas repetiu-se até à zona do Parque Nacional de Bardenas Reales.
Uma vez que já conhecíamos Olite e o seu castelo apalaçado, optámos por descobrir Ujue, a cerca de uma dúzia de quilómetros, e visitar o seu conjunto monumental. É um sítio pequeno, hasteado numa colina a mais oitocentos metros de altitude. É a igreja-fortaleza de arquitectura gótica que rivaliza com a estética de "O Nome da Rosa", de Eco.
O conjunto é esguio, assimétrico, pétreo, com portais delgados, e duas torres ameadas. Exceptuando o caminho de ronda, as ruas são estreitas e curtas, as casas estão muito próximas umas das outras, a estrutura é caótica e pretendia ter funções defensivas, há varandas e telheiros de onde se vislumbram os vales em redor. É um típico burgo medieval. Nesta altura, continuava a sofrer intervenções de restauro e o núcleo mais interessante estava fechado. Embora ainda situada no planalto, sente-se um ambiente serrano que se estende aos sabores da carne estufada.
Com a montanha ali próximo, não era provável que Pamplona estivesse tão quente. Enganámo-nos! Durante uma paragem num dos semáforos, vimos que o termómetro marcava 38 graus. Esclarecemos a direcção a seguir após termos falhado uma saída, e partimos a caminho dos Pirenéus. Subimos até ao Alto do Erro, com a temperatura a manter-se quente. Lá no cimo, parámos numa espécie de miradouro situado a 800 metros de altitude, onde bebemos água fresca, exactamente quando os blusões voltaram a pingar. Logo após, começámos a descer, serpenteando até Roncesvalles, agora acompanhados por bosques que não davam sinal de precisar de água.
Assim foi, até à famosa localidade que ainda faz parte do célebre Caminho de Santiago.
Trata-se de uma terra pequeníssima com alguns alojamentos, um complexo de edifícios religiosos, lojas de artesanato e recordações, um parque de merendas, lugar de paragem mais que não seja para recuperar alguma energia e arremeter para Santiago ou pela montanha.Esta começa a trepar um pouco mais à frente, exactamente de onde o céu de cinza troava. A estrada enrolou-se e estreitou, o bosque adensou-se e a frescura apareceu finalmente. Sem sabermos onde, passámos da Navarra espanhola para o País Basco francês. Subimos alguns quilómetros, mas foi na descida que as curvas começaram a dobrar-se cada vez mais, por vezes ao longo de um rio que corria silencioso alguns metros abaixo. Não tardou a termos companhia de três motos francesas que, porém, rapidamente nos deixaram, entretidas em aproveitar o bom piso e as curvas do declive.Chegámos a Saint Jean Pied de Port com a tarde a fechar-se. A cerca de dez quilómetros ficava o nosso destino dos próximos dias, Saint Martin D'Arrossa. Concluíamos com quase 1200 quilómetros percorridos desde casa. Parecia estar quase a chover quando deixámos a recepção do hotel, rumo ao quarto que nos estava destinado no anexo. Naquela região, a hotelaria não tem muitas camas, pelo que é difícil alojar um grupo grande no mesmo edifício.
A proposta do Bernard contemplava um périplo por montes e vales nos Pirenéus Atlânticos, onde a paisagem seria o leit motiv para a alma. Para tanto convidou o Clube Paneuropean de Portugal, e o SyHayQueIrSeVa de Espanha, dos "nosso" catalão Jaime Palau-Ribes, e dos "nossos" galegos Ana e Antonio.
Abordar-se-iam as verdejantes encostas pirenaicas, visitar-se-iam queijarias e lagares, proceder-se-ia a provas de enchidos, queijos e vinhos. Para tal, juntaram-se 25 motos, 14 espanholas, 8 portuguesas, 3 francesas. Corria uma certa aragem na manhã do dia seguinte. Quando saímos da primeira prova de enchidos, começou a chover. Embora o céu estivesse plúmbeo, o ambiente coloria-se pelo vermelho das portadas e das malaguetas deixadas a secar nas varandas de madeira pintada. Perto, o rio que atravessava a localidade levava até uma casa apalaçada de torres redondas e telhados cónicos, típica dos espaços rurais franceses.
A incursão inicial pelas encostas aconteceu debaixo de chuva. A temperatura não ia agora além dos 15 graus. Mais á frente, foi a vez de visitarmos uma cooperativa de fabricação de queijos de recente formação. Além de produzirem ainda com algumas técnicas artesanais, as ovelhas que ordenham são de uma raça autóctone ainda levada pelos pastores para os viçosos pastos pirenaicos.
Foi esse ambiente frondejante que percorremos durante a tarde, ao longo da harmonia dos prados e da homogeneidade das fachadas das casas. O sol manteve-se e a caravana envolveu-se tranquilamente por aquele arvoredo ponteado de vinhas e árvores de frutos.
Ao almoço, a surpresa surgiu com a sobremesa, uma fatia de bolo basco servida após ter ardido em álcool. Enchemos a sala de refeições de outro pequeno hotel. Omnipresentes, os queijos e, desenquadrado do nosso padrão, o facto de servirem salada no fim da refeição. Já às tantas, voltámos ao verde, às curvas, às vacas, à floresta, às ovelhas. Pouco depois, regressámos ao hotel. O jantar foi, como no dia anterior, leve. Deitámo-nos cedo acompanhados pelo bucolismo do ambiente. Mas a chuva só nos deixaria no dia seguinte.
A primeira visita da manhã levou-nos a um lagar da região, onde são fabricados os tintos, os ubíquos rosés, e alguns vinhos brancos. Não fizeram grandes adeptos entre os portugueses. Detalhe curioso, o facto de cortarem as parras das videiras para melhor deixarem penetrar o sol nas uvas.
Daí a pouco, estávamos em Saint Jean Pied de Port, vila que pertence ao Caminho de Santiago, Património da Humanidade. O castelo, a rua principal e a ponte são de visita obrigatória. Talvez por isso estes locais enxameassem de turistas.
Muitos dos forasteiros eram peregrinos (não faltam símbolos nem ícones ligados ao Caminho de Santiago), outros jovens em campos de férias (devemos ter enganado um, na resposta a um questionário), outros vizinhos espanhóis (que estão perto), outros emigrantes portugueses (que se surpreenderam ao ouvir falar a língua materna). Seja qual for a origem ou o intuito dos visitantes, a verdade é que daquela meia dúzias de ruas ainda parecem chegar os ecos medievais.
O almoço voltou a surpreender pela quantidade e qualidade, mais uma vez servido num pequeno hotel. O tempo descobriu-se e sol iluminou-nos de novo, afastando a sensação de humidade que nos havia acompanhado a manhã. Quais lagartos pirenaicos, saímos do restaurante para a exposição às lentes das máquinas fotográficas, numa sessão cálida que apanhou ...
... em baixo, da esquerda para a direita, António Zamith, Carlos Cordeiro, Quim Soares, António (vizinho português do Bernard), José e Lena Marques, Pinto dos Santos, António Carvalho, Julieta Libório e António Branco.Mais tarde, voltámos à estrada. Apesar de ser Verão, o verde continuava a dominar o horizonte. A digestão fez-se ao longo de curvas que agora trepavam mais fechadas, onde as Goldwings eram obrigadas a apontar correctamente para as cumprirem de uma vez. Os ganchos sucederam-se cada vez mais pronunciados e sem visibilidade, contudo a circularmos num ritmo calmo e em ambiente muito agradável.
Quanto mais alto estávamos, menos vegetação alta nos acompanhava. A partir de determinado ponto, os penedos sobrevieram tal como se estivessemos nas Beiras. Ao longe, via-se gado, sobretudo ovelhas e vacas e, no ponto mais alto que atingimos, eram cavalos que também por lá se passeavam. Pouco antes, havíamos observado alguns predadores alados (nestes locais são habitualmente águias) que evoluiam praticamente à mesma altitude em que circulávamos.No cimo, paisagem e animais surpreendiam. As serras em redor tanto se elevavam acima de nós, como espremiam inexoravelmente os vales glaciares contíguos. Perto de nós, passeavam cavalos de longas crinas entre o pasto e o bebedouro. Embora a temperatura fosse baixando, sentia-se diferença na respiração e o ambiente mais tranquilo.
Ao descermos, voltámos a rodear os montes à beira de declives valentes. Mais abaixo, voltámos aos ganchos que se se iam imiscuindo na floresta. Ainda passámos por Saint Jean para comprarmos recordações, bebermos uma cerveja basca e repetirmos algumas das fotos da manhã. O final da tarde parecia antever um novo dia com bom tempo.
À noite, a cidra foi rainha. A bordo de um autocarro rumámos a uma cidraria que distava cerca de dez quilómetros do hotel, já nos arredores de Saint Jean. Propriedade de um motociclista francês, a cidraria dispunha de dois tonéis embutidos na parede, de onde jorrava, através de pequenas torneiras, a célebre bebida de maçã. Uma boa ideia do Bernard.
Divertida, foi a maneira de escaçar a cidra: um abria a torneira, a cidra esguichava e sucessivamente quem estava previamente em fila esticava o copo, que enchia até meio, dando depois a vez ao seguinte. Foi um ritual que durou até perto da meia-noite.
No final do jantar, o Bernard fez a habitual distribuição de recordações do passeio. A nós, calhou-nos uma garrafa de cidra, e um 'cooler' em barro mercê de termos sido os que haviam viajado de mais longe. A outros, a sorte cobriu-os com véus...Ficou combinado que seríamos os primeiros portugueses a sair no domingo e que viajaríamos sós, tal como sucedera para lá. Mais de mil quilómetros se perfilavam para serem consumidos durante o dia. Os restantes membros do CPEP, por morarem em ou acima de Coimbra, sairiam mais tarde e em grupo. Parece que o conseguiram durante os primeiros cem quilómetros.
À partida, estava fresco, o céu nublado e o trânsito diminuto na "nacional". Num instante, estávamos na A63, perto de Biarritz. Conforme íamos descendo a caminho de Espanha, o céu foi ficando cada vez mais escuro e ameaçador. Próximo de San Sebastian já chovia. O regresso estragava-se.
No entanto, até Vitoria, o tempo arranjou-se. O sol fugiu das nuvens (que se recolheram para norte), e o vento afastou a chuva. Quando parámos para comer qualquer coisa mais à frente, a área de serviço agitava-se com milhentos turistas magrebinos, invariavelmente carregados com mobílias francesas. A azáfama era tanta que já se mudavam fraldas em cima de um lavatório...A ausência de vento e o claro do céu anunciavam que o tempo iria aquecer. Nos arredores de Palência, já se sentia o calor do sol a malhar nos blusões. Aproveitámos para almoçar e sentir a frescura de uma área de serviço.
Aí, passava nos televisores o GP da Alemanha, quando Rossi e Stoner seguiam juntos na frente.
"Ganhámos o dia" quando, já na moto, uma das empregadas nos entregou a máquina fotográfica, esquecida nas costas de uma cadeira.
Há muito que a temperatura já havia ultrapassado a trintena de graus. Foi assim até Vilar Formoso. Depois, nem uma aragem e, perto da Guarda, o calor já era impressionante.Quando parámos próximo de Castelo Branco, onde nos deixou uma BMW GT que nos acompanhava há meia centena de quilómetros, nada mexia. Os blusões voltaram a ficar molhados e foi preciso baixar o índice térmico recorrendo a um par de bebidas geladas.
Em sentido contrário, seguiam os que regressavam da Concentração de Faro. Só voltámos a parar para reabastecer perto de Santarém, onde já se sentia uma aragem fresca. Ao chegarmos a casa, porém, a brisa lembrou o ambiente dos vales pirenaicos.
A incursão inicial pelas encostas aconteceu debaixo de chuva. A temperatura não ia agora além dos 15 graus. Mais á frente, foi a vez de visitarmos uma cooperativa de fabricação de queijos de recente formação. Além de produzirem ainda com algumas técnicas artesanais, as ovelhas que ordenham são de uma raça autóctone ainda levada pelos pastores para os viçosos pastos pirenaicos.
Foi esse ambiente frondejante que percorremos durante a tarde, ao longo da harmonia dos prados e da homogeneidade das fachadas das casas. O sol manteve-se e a caravana envolveu-se tranquilamente por aquele arvoredo ponteado de vinhas e árvores de frutos.
Ao almoço, a surpresa surgiu com a sobremesa, uma fatia de bolo basco servida após ter ardido em álcool. Enchemos a sala de refeições de outro pequeno hotel. Omnipresentes, os queijos e, desenquadrado do nosso padrão, o facto de servirem salada no fim da refeição. Já às tantas, voltámos ao verde, às curvas, às vacas, à floresta, às ovelhas. Pouco depois, regressámos ao hotel. O jantar foi, como no dia anterior, leve. Deitámo-nos cedo acompanhados pelo bucolismo do ambiente. Mas a chuva só nos deixaria no dia seguinte.
A primeira visita da manhã levou-nos a um lagar da região, onde são fabricados os tintos, os ubíquos rosés, e alguns vinhos brancos. Não fizeram grandes adeptos entre os portugueses. Detalhe curioso, o facto de cortarem as parras das videiras para melhor deixarem penetrar o sol nas uvas.
Daí a pouco, estávamos em Saint Jean Pied de Port, vila que pertence ao Caminho de Santiago, Património da Humanidade. O castelo, a rua principal e a ponte são de visita obrigatória. Talvez por isso estes locais enxameassem de turistas.
Muitos dos forasteiros eram peregrinos (não faltam símbolos nem ícones ligados ao Caminho de Santiago), outros jovens em campos de férias (devemos ter enganado um, na resposta a um questionário), outros vizinhos espanhóis (que estão perto), outros emigrantes portugueses (que se surpreenderam ao ouvir falar a língua materna). Seja qual for a origem ou o intuito dos visitantes, a verdade é que daquela meia dúzias de ruas ainda parecem chegar os ecos medievais.
O almoço voltou a surpreender pela quantidade e qualidade, mais uma vez servido num pequeno hotel. O tempo descobriu-se e sol iluminou-nos de novo, afastando a sensação de humidade que nos havia acompanhado a manhã. Quais lagartos pirenaicos, saímos do restaurante para a exposição às lentes das máquinas fotográficas, numa sessão cálida que apanhou ...
... em baixo, da esquerda para a direita, António Zamith, Carlos Cordeiro, Quim Soares, António (vizinho português do Bernard), José e Lena Marques, Pinto dos Santos, António Carvalho, Julieta Libório e António Branco.Mais tarde, voltámos à estrada. Apesar de ser Verão, o verde continuava a dominar o horizonte. A digestão fez-se ao longo de curvas que agora trepavam mais fechadas, onde as Goldwings eram obrigadas a apontar correctamente para as cumprirem de uma vez. Os ganchos sucederam-se cada vez mais pronunciados e sem visibilidade, contudo a circularmos num ritmo calmo e em ambiente muito agradável.
Quanto mais alto estávamos, menos vegetação alta nos acompanhava. A partir de determinado ponto, os penedos sobrevieram tal como se estivessemos nas Beiras. Ao longe, via-se gado, sobretudo ovelhas e vacas e, no ponto mais alto que atingimos, eram cavalos que também por lá se passeavam. Pouco antes, havíamos observado alguns predadores alados (nestes locais são habitualmente águias) que evoluiam praticamente à mesma altitude em que circulávamos.No cimo, paisagem e animais surpreendiam. As serras em redor tanto se elevavam acima de nós, como espremiam inexoravelmente os vales glaciares contíguos. Perto de nós, passeavam cavalos de longas crinas entre o pasto e o bebedouro. Embora a temperatura fosse baixando, sentia-se diferença na respiração e o ambiente mais tranquilo.
Ao descermos, voltámos a rodear os montes à beira de declives valentes. Mais abaixo, voltámos aos ganchos que se se iam imiscuindo na floresta. Ainda passámos por Saint Jean para comprarmos recordações, bebermos uma cerveja basca e repetirmos algumas das fotos da manhã. O final da tarde parecia antever um novo dia com bom tempo.
À noite, a cidra foi rainha. A bordo de um autocarro rumámos a uma cidraria que distava cerca de dez quilómetros do hotel, já nos arredores de Saint Jean. Propriedade de um motociclista francês, a cidraria dispunha de dois tonéis embutidos na parede, de onde jorrava, através de pequenas torneiras, a célebre bebida de maçã. Uma boa ideia do Bernard.
Divertida, foi a maneira de escaçar a cidra: um abria a torneira, a cidra esguichava e sucessivamente quem estava previamente em fila esticava o copo, que enchia até meio, dando depois a vez ao seguinte. Foi um ritual que durou até perto da meia-noite.
No final do jantar, o Bernard fez a habitual distribuição de recordações do passeio. A nós, calhou-nos uma garrafa de cidra, e um 'cooler' em barro mercê de termos sido os que haviam viajado de mais longe. A outros, a sorte cobriu-os com véus...Ficou combinado que seríamos os primeiros portugueses a sair no domingo e que viajaríamos sós, tal como sucedera para lá. Mais de mil quilómetros se perfilavam para serem consumidos durante o dia. Os restantes membros do CPEP, por morarem em ou acima de Coimbra, sairiam mais tarde e em grupo. Parece que o conseguiram durante os primeiros cem quilómetros.
À partida, estava fresco, o céu nublado e o trânsito diminuto na "nacional". Num instante, estávamos na A63, perto de Biarritz. Conforme íamos descendo a caminho de Espanha, o céu foi ficando cada vez mais escuro e ameaçador. Próximo de San Sebastian já chovia. O regresso estragava-se.
No entanto, até Vitoria, o tempo arranjou-se. O sol fugiu das nuvens (que se recolheram para norte), e o vento afastou a chuva. Quando parámos para comer qualquer coisa mais à frente, a área de serviço agitava-se com milhentos turistas magrebinos, invariavelmente carregados com mobílias francesas. A azáfama era tanta que já se mudavam fraldas em cima de um lavatório...A ausência de vento e o claro do céu anunciavam que o tempo iria aquecer. Nos arredores de Palência, já se sentia o calor do sol a malhar nos blusões. Aproveitámos para almoçar e sentir a frescura de uma área de serviço.
Aí, passava nos televisores o GP da Alemanha, quando Rossi e Stoner seguiam juntos na frente.
"Ganhámos o dia" quando, já na moto, uma das empregadas nos entregou a máquina fotográfica, esquecida nas costas de uma cadeira.
Há muito que a temperatura já havia ultrapassado a trintena de graus. Foi assim até Vilar Formoso. Depois, nem uma aragem e, perto da Guarda, o calor já era impressionante.Quando parámos próximo de Castelo Branco, onde nos deixou uma BMW GT que nos acompanhava há meia centena de quilómetros, nada mexia. Os blusões voltaram a ficar molhados e foi preciso baixar o índice térmico recorrendo a um par de bebidas geladas.
Em sentido contrário, seguiam os que regressavam da Concentração de Faro. Só voltámos a parar para reabastecer perto de Santarém, onde já se sentia uma aragem fresca. Ao chegarmos a casa, porém, a brisa lembrou o ambiente dos vales pirenaicos.
Música: Fortadelis - Convergence