quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Sintra Via Castelo

"Ficar perto dos homens, meus irmãos, e mais próximo da Lua e das estrelas, minhas amigas, tendo em frente a terra verde e o mar a perder de vista - o mar e a terra que tanto amei." Ferreira de Castro.

O castelo está lá, pétreo, altivo e provocante, porém, brutal, pardo e sinistro. Espia ao longe, abriga-se no bosque, protege-se além das muralhas. A mata cobre penedos e casas, do sopé ao cume da serra. Adiante, bruxuleiam as luzes do palácio, entre os ramos nus da vegetação baixa. Está áureo, resplandece num azul-cobalto enevoado que encena o pináculo do Monte da Lua.

É para lá que vamos! Trepar Sintra vai ser invadir o castelo, mirar o palácio, ascender à Cruz Alta, percorrer S. Pedro. Estimamos fazê-lo em menos de três horas. Dezasseis potenciais trepadores, cinco efectivos à partida e à chegada.

Somos poucos para quanta floresta, tanto calhau, tamanha ladeira. Mas o desafio mantém-se. Não é preciso alvitres peculiares nem rituais para partir. Todos vão engajados da ideia de escalar. Talvez não tanto, é verdade.

Deixámos S. Pedro através de uma viela que serpenteia entre casas antigas cujos muros lhe defendem o decoro. Trepámos ao pátio da igreja, e saímos por degraus minúsculos para a rua que galga o acesso ao castelo.

Entramos pela terceira cintura de muralhas, através de uma porta baixa rotativa. A ascensão parece extremar-se. O declive, em pedra irregular, apesar dos degraus simples e recentes, é terrível. É uma respiração vigorosa que sobrevém ao duelo com aquela escadaria que parece cada vez mais exigente.

Mas é alvoroço que só dura até ao miradouro Ferreira de Castro. É ali que jaz o escritor sob um banco talhado na rocha. De lá, espreita-se a "vila" e o palácio de onde sobressaem as alvas chaminés cónicas. Um banco de pedra serve de repouso, sobretudo aos pulmões que parecem ter dado tudo neste primeiro contacto.

Sentamo-nos por instantes, olhamos uma, duas vezes, arfamos outras tantas, mas não perdemos o ritmo. Não tarda, voltamos a trepar por entre árvores frondosas e calhaus gigantescos. Escurece. Os últimos visitantes abandonam o trajecto em sentido descendente.


A vegetação adensa-se à medida que subimos, pedras e arvoredo vão-se confundindo e é a humidade que passa a dominar. O declive refreia-se já perto da segunda cintura de muralhas. É lá que garantimos junto de um guia que a entrada principal do castelo ainda está aberta. Não precisamos saltar muros…

Ali, além de um túmulo mouro, são as ruínas da igreja cristã, de S. Pedro de Canaferrim (séc. XII), que dominam o acesso à primeira muralha do castelo. Não vamos lá, as admissões há muito que encerraram. Além disso, é preciso assegurar que a porta está mesmo aberta e que não ficamos fechados no castelo. Estava. Deixamo-la com a noite a iluminar o céu. Ofuscante, contudo, estava o palácio da Pena, a luzir de ouro no topo do Monte. Parece um tesouro de piratas a espreitar de um baú.

Agora, é a vez de investir na terra através de degraus feitos em troncos. Descemos à luz das lanternas. Está mais húmido, o piso escorregadio, mas caminhamos ao abrigo do vento. Há por aqui muitos cogumelos, aliás há-os pela serra inteira, de todos os jeitos e feitios.

Na antiga casa dos cantoneiros, é para cima que vamos, a galgar uma ladeira recentemente empedrada, outrora uma vereda onde passeavam salamandras ensopadas e indolentes. É mais uma subida íngreme que desafia a resistência, a caminho de pequenas luzes mortiças e silhuetas imprecisas.É mais à frente que a terra volta, com sulcos valentes e pedras soltas que vão formando um trilho arriscado. Olha-se para a noite à procura de referências. Mas já todos estão à vontade. Há muito que a respiração se moldou ao ritmo e à escarpa. Passamos as "famosas" ruínas das raves, desistimos de outras que lhe servem de tecto, e seguimos ao longo do edifício das "matas nacionais", envolto num ambiente tétrico. Ainda assim, há alguma luz que tranquiliza a progressão.

Mais à frente, deixamos os olhos na Pousada da Juventude também ela envolta num cenário de vampiros, lobisomens e formas caprichosas. É por mais uma antiga vereda, que recebeu recentemente uma capa de cimento, que trepamos. O vento regressa qaundo a protecção arbórea desaparece.

Quase todos já conheciam a Cruz Alta, o miradouro de Santa Eufémia que contempla a planície de Sintra a Lisboa, de Almada a Cascais. É um céu de luz aos pés da serra, uma espécie de firmamento terrestre que cobre quase tudo o que a vista alcança.


O vento trepassa os tecidos. Ali não há abrigo, a não ser um murito baixo que envolve o varandim. De lá, vislumbram-se os contornos da Pena, cada vez mais envolta em brumas de cinza. Valeu pelo cenário do rendilhado luminoso. Vamos começar a descer.


Lá em baixo, também se revela o sossego que a serra sente, mal se penetra na zona urbana. A pedra volta a dominar as habitações, de cores secas, decoradas com azulejos, pequenos tijolos, ferros e perfis pontiagudos. Há minas de água, muitas, perto das casas.


Identificamos algumas moradas e certos protagonistas, mas fomos sobretudo metermo-nos pelos quelhos que desvendam arcos, becos e escadarias, muitas escadarias, na vila de S. Pedro.

Concluímos pouco mais duas horas depois de começarmos a trepar. Como escreveu Ferreira de Castro, estivemos mais perto da lua e das estrelas, mas também mais próximo da natureza e da aventura, junto da sorte que é trepar com amigos.


As fotos nocturnas são na maioria do João Calado http://www.joaocalado.net/

Música: O Senhor do Anéis, Howard Shore

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Margens Altas Do Douro

Agosto 2009

Os sentidos são os primeiros a manifestarem um pasmo festivo quando são convocados para mesclas peculiares de natureza e cultura em sítios que os cativam. O vale do Douro é um desses lugares. Fascina porque a natureza foi pródiga na dimensão com que abraçou o suceder do rio, encanta porque os homens enfeitaram as margens com socalcos luxuriantes e gostosos.

Sobretudo na última década, a paisagem duriense foi surtida pelo aumento vastíssimo da área de cultura da vinha, sobretudo o Douro beirão, e um pouco menos ocupada por amendoais e por olivais. Cor, textura, cheiro, espaço, foram alterados ou ampliados. O ambiente mudou não há muito tempo.
Já não são apenas as vertentes que amparam o rio a mostrarem os socalcos riscados de vinhas. A paisagem para o interior devolve agora um raiado abrangente que acompanha as curvas de nível das encostas. Além disso, a divisão das propriedades (fazendas, no dizer dos durienses com costela beirã) é agora mais visível mormente desde os cumes dos montes.
É a actualidade a manifestar-se em patamares ecológicos, a querer ocupá-los definitiva e extensivamente, aproveitando as qualidades naturais dos terrenos. A aridez daquela terra, que de Verão afogueava e de Inverno gelava, atenuou-se; os declives suavizaram-se; a cor do chão esverdeou-se; a textura das encostas compôs-se.
Não tem sido, porém, apenas o presente a transformar o território. Ainda é notória a presença de vestígios remotos, de testemunhos milenares que, também eles, ao escolherem os “seus socalcos”, demudaram o espaço duriense. A presença do pré-histórico tardio e do romano, além de serem indícios precursores da mudança, são ainda hoje prova de que estes lugares durienses eram outrora sítios de eleição.
Os vestígios de fortalezas da idade do bronze ou as ruínas romanas do Prazo e de Rumansil, são disso exemplo. Localizadas em promontórios esplêndidos, quer logísticos, quer paisagísticos, dizem bem das estratégias que, antes, tal como hoje, foram decisivas na vida das populações. São obras cuja solidez lhes dá ainda um cunho de permanência, uma robustez firmada nos materiais (granitos), uma notoriedade assente no aspecto cultural que representam.
Fortificações, túmulos, habitações, templos, caminhos, objectos de culto, equipamentos sociais, representações de carácter religioso, com mais e com quase vinte séculos, são a face visível das civilizações antecedentes, uma herança que ombrea com a dinâmica da actualidade.
Hoje, a paisagem dos terrenos próximos do rio está prenhe de cultura vinícola. Os antigos muros das fazendas, criados por calhaus de granito há muito que se haviam emboscado na paisagem. Mas, recentemente, o tecido dos solos, penteado agora por linhas contíguas, marca claramente a divisão das quintas, dando ao cenário ares de mancha de retalhos patrimonial.
As margens do rio alteram-se nitidamente quando a sua vizinhança cambia. As vertentes do Douro mostram-se menos permeáveis quando abandona as Beiras e fica entre o Trás-os-Montes português e a congénere espanhola Castela e Leão. Aqui, as encostas não se têm deixado moldar com tanta facilidade, quanto muito autorizam a existência de laranjeiras, amendoeiras, oliveiras e algumas vinhas.
No chamado Douro Internacional as ondas de vinhedos que polvilham os socalcos do rio mais à frente, dão lugar às tramas de lodão, aliás as maiores manchas florestais da Península desta espécie. São milheiros de árvores iguais às que vemos nos passeios urbanos, aqui dispostas numa malha apertada e em declives acentuados.
Enquanto nas Beiras é mais evidente o trabalho do homem, aqui é mais notório o trabalho da natureza. Quando o granito surge destacado e solitário, parece uma composição estraçalhada, tal a desordem das rupturas e dos calhaus no terreno. É a natureza que molda os Caos de Blocos, que emprestam à paisagem ribeirinha um aspecto confuso e intimidante.
Imponentes, revelam-se as cristas quartzíticas, fracturas no declive que moldam perfis verticais, que resistem à erosão. Surgem como monólitos, guardiões das margens, memórias dos conflitos entre os quartzitos e os xistos. Guardam fósseis, definem a paisagem, metem respeito. Também garantem abrigo à biodiversidade que acolhem: aves de rapina - águias, grifos, abutres, falcões – e outras - garças e cegonhas negras, ou ainda, lobos, gatos-bravos, javalis, corços.
A cada curva do rio, o horizonte mostra perfis em “V”, onde imperam sentinelas pétreas altivas e poderosas, cavernas, nichos e plataformas inacessíveis. Após cada enseada, é possível observar a quietude de uma garça alva, ser surpreendido pelo voo de uma rapinante, ou pelo mergulho de um sardão. Mas é o gigantismo que predomina, o rio-espelho que nos conduz, o azul do céu que nos deslumbra. Que pena, o Douro fugir para o mar.

Música: Sonic Mistery


terça-feira, 27 de outubro de 2009

Por Terras de Viriato

Outubro 2009

O genuíno aparece cada vez menos. Talvez a imediaticidade o oculte, talvez não estejamos tão dispostos a observá-lo. Mas, apesar da inevitabilidade do tempo recente e das nossas idiosincrasias, o genuíno continua a encantar-nos. Percebe-se porquê: é raro, original, tem autoria reconhecida e identidade perene. Por terras de Viriato, ainda há coisas genuínas, validadas pela natureza e pelo homem.
Quando a natureza vinca a terra, dobrando-a ou elevando-a sobre si própria, estabelece limites, barreiras ao que fica e aos que ficam de um e do outro lado das montanhas, dos que ficam do lado das montanhas e dos que ficam nos sopés. Essas fronteiras marcam os homens, sobretudo "os de lá", e estes cunham o território que dominam com a sua autenticidade, com as suas práticas, com o quotidiano que, “mais protegido”, se vai reproduzindo à imagem ancestral. Foi essa relíquia que encontrámos nos lugares que vistamos neste fim-de-semana.
Abandonámos a área urbana viseense. Do vale, trepámos a Arada com os olhos na Freita, inicialmente pela floresta, depois entre urzes e carquejas. Num instante, as motos levaram-nos do Paraíso – aldeia no vale – até ao Portal do Inferno – um saliência abrupta quase a tocar o milhar de metros. É caso para dizer que, num ápice, ganhámos o céu!
A montanha continua a dominar um ambiente de que o homem abdica cada vez mais. Apesar da melhoria das estradas e das comunicações, há aldeias que vão sendo abandonadas; Maçagoso, ali próximo, foi uma delas. Fujaco, porém, ainda alicia os seus parcos habitantes, além de atrair forasteiros como nós.
Quem conhece Cain, nos Picos de Europa, pode concluir largas semelhanças no acesso à aldeia de Fujaco: uma plataforma estreita de paralelepípedos roça os outeiros e sobrevém ao regato que corre num vão fundo. Depois, é o xisto que avassala, ao longo de uma via rústica e sinuosa. Até ao cimo da colina, onde pontifica uma ermida, passa-se pelo Rochedo, um café-restaurante encostado a uma parede... rochosa.
Foi ao longo de muitas torceduras, algumas bem tortas, que escalámos até à ermida e abarrotamos o átrio. Daqui, soltamos os olhos à procura da arquitectura e da assimetria das casas, envoltas no verde luxuriante dos castanheiros, oliveiras, pinheiros e sobreiros. Apesar de o xisto claro dominar as habitações, vêem-se muitas telhas vermelhas.
Aqui, há sempre um “bom dia!” para o forasteiro, singelo e imperioso. O contacto não se faz rogado, quer seja pelo que se pode receber dos outros, quer sobretudo por aquilo que lhes é possível entregar. São coisas simples, originais, artesanais, que têm para trocar. É (também) destas permutas que a gente vive. É obra do homem.
Estimava-se que a restante digressão fosse semelhante, na tal singularidade, na tal rareza, no belo que a todos encantou, quando a estrada insistiu na subida e galgou até perto das colossais hélices que aproveitam o vento que sopra forte naqueles cabeços. Aqui, os contrastes iam do gigantismo das pás ao precipício que nos ladeava, da aridez do terreno, à luxúria do horizonte. Estávamos entre o céu e terra.
Na verdade, andávamos mais perto do Inferno, de abismos respeitáveis, das Covas do Rio, das Covas da Serra, e do Portal do Inferno, uma abertura numa parede rochosa, de onde que se vislumbra não o Inferno, mas um panorama abissal, ainda que longínquo, sobre os cumes que rodeiam o lugar. Da plataforma onde se deu uma derrocada de xisto, pode espreitar-se o vale contíguo que desce infinitamente ao longo de encostas abruptas. É certamente uma varanda alcantilada, singular e intimidante. É obra da natureza.
Um pouco mais à frente, descemos para a Aldeia da Pena ao longo de uma estrada estreita, pejada de pedras e de algumas covas não tão fundas, porém, como as do Inferno. Alguma dificuldade para estacionar – não entram veículos a motor na aldeia – mercê da enxurrada da semana anterior que havia dado cabo do espaço exíguo onde se deixavam as viaturas. Foi obra da natureza.


Há algumas passagens com areia, cascalho fino ou pequenas placas de xisto, desalinho criado pela forte chuvada da seman anterior. A estrada não tem bermas nem baias, mas tem um amplo horizonte por limite. Metem respeito, aqueles declives, mas também fascinam pela dimensão, pelo desafio, pelo dever de controlo.
No interior da aldeia, ao abrigo de um alpendre de xisto esperava-nos um aperitivo de queijo, presunto e vinho. Apesar de ser ainda cedo para tal insígnia, ninguém se queixou especialmente do aveludado da pinga. Anexo, ficava um restaurante com mais dúzia de mesas, recheado de cartões-de-visita e pedaços de papel onde os comensais dizem da sua jornada. O "Martelo", mais à frente, também os mostrava.
Fora, percebe-se a limitada dimensão da aldeia e o sossego diz da escassez de pessoas. Disseram-nos que não são mais de dez, sendo que dois estão ausentes. Uma família, por tanto. Isso não impede que, rapidamente, nos ponham ao corrente das últimas novidades da terra, especialmente do que lastimam: a velhice de alguns, o isolamento, a falta de estacionamento para os visitantes, a lonjura das instituições.
Mais concentrada do que a do Fujaco, a aldeia da Pena não mostra telhados vermelhos, antes um xisto mais escuro. Na loja-museu de artesanato são os objectos de madeira que predominam. As ruas são mais estreitas, tem menos habitantes e o acesso é mais penoso do que o da sua congénere do Fujaco. Deixámo-la, entusiasmados com a tal raridade com que nos brinda.
Daí a nada, estávamos no emissor de S. Macário, a invadir a ermida do mesmo nome que, lá no alto, está defendida com espessos muros de granito. Foi ao abrigo das antenas de rádio e de televisão que nos expusemos para registar a foto de grupo. Não aquecemos o lugar.
Descemos em fila indiana assimétrica, como é habitual. Para trás, iam ficando os precipícios que nos haviam acompanhado a manhã. Por aqui, há risco, minimizado porém pela velocidade baixa a que seguíamos. As motos queixaram-se de alguns ganchos mais sérios, da areia que borrifava algumas curvas e de uma ou outra rajada de vento no cume.

Tal como meses antes, quando trepámos os Pirenéus Atlânticos, a peregrinação motociclística serpenteou pelas serras percorrendo diferentes patamares ecológicos. Desde o planalto, onde a irregularidade do relevo ainda é ténue e a vegetação abundante e diversificada, passámos aos outeiros, mais acidentados e com a floresta a alinhar-se densa, para depois subir definitivamente aos cabeços, onde são as fragas e a aridez que subjugam.
Com pouco tempo para dedicar às pessoas, a diferença veio da observação da natureza, sobretudo da estratificação ecológica, onde os patamares ambientais se distribuem em altitude. É típico de regiões acidentadas, tão original como é emblemática a diferença cultural que as gentes de lá experimentam face aos outros, na espiritualidade, na economia, nos rituais.
Com a aproximação da hora de almoço, foi o “Martelo” que nos abriu as portas com um conjunto de deleitosos aperitivos que, ainda assim, não desacreditaram os manjares sequentes. Foi o primeiro sinal de que o fim-de-semana concretizaria um ciclone gastronómico. Houve quem se perdesse a caminho do restaurante mas, uma vez lá, todos encontraram o trilho para o excelente “branco” do Curral da Burra.
Depois, visitámos o velho “Martelo”, uma atarracada divisão em chão de terra batida, que estava pejada de vestígios de grandes farras e expectativas registados em todos os tipos de papéis possíveis. As carnes eram grelhadas na parede de pedra exterior, no espaço de um bloco mais estreito, sem chaminé, a tingir de negro de fumo a parede mais exposta à rua principal. Outra raridade, hoje institucionalmente banida.
Catita, mostrou-se Póvoa Dão, um antigo lugar de casas pétreas recentemente recuperado com objectivos turísticos. Passámo-lo em revista “sem tirar os pés dos pedais”. Resgatado à imagem do passado, segue a traça rústica da região, porém com uma irrepreensibilidade excessiva que copia o desenho antigo mas não reproduz o ambiente remoto.
De novidade em inovação, fomos surpreender a folia ao gelo. Minus 5, no centro comercial viseense, é um lugar que concorre com as temperaturas negativas que se fazem sentir na Concentração dos Pinguins. Trata-se de um bar construído em gelo, em que até os copos têm de ser pegados com luvas. Só vende bebidas frescas e obriga a vestir roupa quente que dispensa num bengaleiro polar.
Com a proximidade da noite, o tempo arrefeceu até perto dos valores sentidos na partida matinal. No entanto, um agasalho ligeiro foi o suficiente para nos abrigar uma curta caminhada até à Mesa da Sé. Foi lá que comemorámos o aniversário do Clube e do nosso companheiro Justino, ao som de aclamações a ambos, entre a diversidade das entradas, a delícia das carnes e a doçura das sobremesas.


Desta vez, tivemos a companhia de alguns amigos espanhóis e do Bernard, do 'Sy Hay Que Ir Se Va'. Também eles se juntaram à festa, o que, para espanhóis, é como estar em casa. Discursos, agradecimentos, votos, apagar de velas, alegria, piadas, tudo acompanhado por espumosos farristas. Estava cumprido o ritual.
De manhã, repetimos o trajecto, agora com destino à Sé e ao museu Grão Vasco. Percorremos os três andares deste último, entre esculturas, pinturas, e na sua maioria objectos sacros, datados desde a antiguidade cristã até à contemporaneidade. Corria a missa na Sé vizinha, pelo que o périplo foi sobretudo à volta do claustro, com os olhos a perderem-se por um extenso painel de azulejos.
Eira da Bica, nos arredores de Vouzela, recebeu o restante da comitiva CPEP, já praticamente com os membros da Trofa, meia dúzia de lisboetas e um portuense. Os espanhóis sairiam em sentido contrário, o Bernard e o António para algures. Para rematar a expedição, o almoço andou entre vitela e borrego celestiais. Mais longe, ficavam as Covas onde os Lusitanos resistiram, o Inferno onde romanos se instalaram, as Ribas onde muitos godos passaram. Nós ficámos sobretudo com Fujaco e Pena na memória, envolvidas naquele ledo e duro ambiente de gigantes, antes defendido por Viriato.


Música: Pat Metheny e Tiesto